Em julho de 1996, a desempregada Rosângela Siqueira bateu às portas do Banco da Mulher, no centro do Rio de Janeiro, com um pedido inusitado. Queria R$ 900 para comprar um burro e uma carroça. Ela montara uma birosca na cozinha de seu barraco numa favela plana de Duque de Caxias, Baixada Fluminense, e queria ampliar os negócios. Tudo o que precisava era de uma condução para buscar produtos mais baratos do que os que comprava de ambulantes para revender. O empréstimo foi concedido e pago em 180 dias, com juros nada generosos de 4,5% ao mês. O negócio prosperou. Rosângela telefonou na semana passada para o banco para contar que subiu na vida. Ligou de seu próprio celular. Ela trocou o barraco de madeira por uma casa de alvenaria e construiu uma mercearia de verdade. O marido, metalúrgico desempregado, trabalha com ela e a ajuda na criação de um casal de filhos. "Se não fosse a carroça, eu não poderia atrair os clientes que conquistei com preços baixos" diz Rosângela.

Multiplicar casos como este é a mais nova missão da juíza aposentada Denise Frossard, recém-eleita presidente do Banco da Mulher, ONG que concede microcréditos de cerca de R$ 1 mil, geralmente para mulheres chefes de família. O maior desafio da juíza que mandou para o xilindró banqueiros do jogo do bicho do Rio é transformar o banco em algo mais do que um lugar de ótimas intenções e recursos insignificantes. O que o Banco da Mulher tem para emprestar hoje em todo o País são cerca de R$ 5 milhões.

Denise só assume de fato o posto em setembro, quando volta de um curso nos Estados Unidos. Até lá, monta o arcabouço doutrinário com que quer reorientar a ONG. Em resumo: estimular iniciativas conjuntas, tipo cooperativas, e inaugurar mais um capítulo da guerra contra o crime ao dar condições às mães para trabalhar em casa, onde podem ficar de olho nos filhos. Denise se aposentou lamentando ter passado a vida toda condenando à prisão basicamente jovens pobres, na maioria negros. "Como juíza, eu tinha obrigação de pôr algemas. Minha missão agora é impedir que essa juventude chegue diante do magistrado", diz ela.

Não é pequena a tarefa. Por intermédio de convênios com ONGs, bancos e entidades governamentais, Denise quer decuplicar, em dois anos, o volume de recursos destinados aos microcréditos, chegando perto de R$ 50 milhões. É um volume ridículo perto dos bilhões de reais que a montadora Ford está arrancando do Poder Público para instalar na Bahia uma fábrica moderna, ou seja, com muita produção e poucos empregados. Os recursos da montadora, que poderiam beneficiar um milhão de famílias, arrancam suspiros da nova banqueira social. "Vixe Maria!", deixa escapar a mineira Denise. Com o BNDES, que emprestará R$ 700 milhões à Ford, o Banco da Mulher já conseguiu R$ 1,1 milhão.