A chacina da Vila Brasilândia, na qual morreram cinco integrantes de uma família de PMs, continua com mais interrogações do que respostas. A polícia civil de São Paulo segue sustentando que o garoto Marcelo Bovo Pesseghini, 13 anos, é o único suspeito dos crimes. As investigações apontam que o adolescente havia formado no colégio um “grupo de assassinos” para o qual teria falado da intenção de matar os pais, mas muitos pontos ainda não estão esclarecidos e a informação de que a cabo Andréia Regina Bovo Pesseghini, 36 anos, teria delatado colegas envolvidos no roubo de caixas eletrônicos abre o leque de possibilidades que colocam em dúvida o que vem sendo sustentado pelo delegado responsável pelo caso. A própria chefe do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP), delegada Elisabete Sato, disse na semana passada que há a possibilidade de crime passional ou vingança. “Ainda na cena do crime, vários PMs que trabalhavam com Andréia vieram me dizer que poderia se tratar de uma ‘treta de polícia’, ou seja, jargão policial que significa vingança de policial corrupto contra o honesto”, disse o deputado estadual Major Olímpio Gomes (PDT) à ISTOÉ. “Um dos comandantes ainda chegou a me dizer que era bem possível que o autor dos crimes estivesse lá, entre nós, fingindo uma cara triste.”

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PLANO
Segundo a polícia, Marcelo Pesseghini, 13 anos (na foto com os pais),
havia formado no colégio um "grupo de assassinos" para
o qual teria falado da intenção de matar os familiares

O comandante do 18º Batalhão da Polícia Militar, tenente-coronel Wagner Dimas, chefe de Andréia, foi o primeiro a levantar essa suspeita, em entrevista à Rádio Bandeirantes horas após o crime. No dia seguinte, para a Corregedoria da PM e para o DHPP, ele voltou atrás e disse ter se confundido. Em nota, o comando da Polícia Militar do Estado de São Paulo informou, na quarta-feira 14, que o tenente-coronel foi afastado para tratamento de saúde no programa de apoio psicológico da corporação. “Estão querendo destruir a carreira dele, chamá-lo de louco, mas eu confirmo que essa denúncia é verdadeira”, afirma o Major Olímpio. O Major disse ainda que, depois da declaração de Dimas, ele mesmo reiterou a denúncia à Corregedoria e acrescentou que Andréia teria sido convidada para fazer parte do esquema no segundo semestre de 2011 e se negado. Ela teria comunicado o fato ao tenente-coronel Fabio Paganotto, seu superior na época, que foi transferido de Batalhão no dia 15 de dezembro, após averiguar as denúncias e sofrer ameaças. “Policiais de várias patentes me confirmaram que existia um calhamaço de provas contra todos os envolvidos. Quero saber onde foi parar esse registro oficial que a Corregedoria diz agora que nunca existiu”, afirma.

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DENÚNCIA
O deputado estadual Major Olímpio foi um dos primeiros a chegar  no
local do crime, onde vários PMs disseram a ele acreditar em vingança
de policiais corruptos. A cabo Andréia havia denunciado colegas

A cena do crime é outro ponto controverso. A delegada Elisabete Sato afirmou na semana passada que o local “não estava idôneo”, ou seja, preservado para a perícia, no momento em que a polícia civil foi atender a ocorrência. Trata-se de uma constatação importante, pois seria impossível alguém dar um tiro na própria cabeça, alterar o cenário do crime e depois morrer. Estima-se que cerca de 200 policiais rondavam a rua e 30 chegaram a entrar na casa. A posição do braço de Marcelo, que teria cometido suicídio, segundo a polícia, causa estranheza. As fotos mostram o corpo do menino sobre o colchão da sala, com o braço esquerdo dobrado na lateral e para baixo e a mão que segurava a arma não estava tesa e fechada. Peritos ouvidos por ISTOÉ afirmam que, por força do impacto da pistola .40, o menino deveria estar com o braço esticado e a mão fechada. Isso pode ser um indicativo de que o adolescente teria, na verdade, sido assassinado e a arma colocada em sua mão.

É estranha também a conduta dos companheiros de batalhão do sargento da Rota Luís Marcelo Pesseghini, 40 anos, pai de Marcelo. Ele estava escalado, na manhã da segunda-feira 5, para participar de uma operação contra a facção criminosa PCC em Presidente Wenceslau. “O sargento deveria se apresentar ao batalhão às 5h para seguir em comboio às 8h e não compareceu. Não entendo como a polícia não foi averiguar o ocorrido. Se tivesse feito isso, o menino poderia estar vivo”, afirma o Major Olímpio, para quem essa falha foi determinante para ampliar a tragédia e semear a confusão nas investigações. “Politicamente e estrategicamente, para o governo do Estado e a Secretaria de Segurança Pública, é conveniente que o menino seja mesmo o autor dessa chacina. Se for confirmada vingança policial, seria a demonstração pública de uma falta de controle da PM por parte do Estado”, afirma ele.

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Também é difícil entender como, em uma cidade tão monitorada como São Paulo, não apareceram imagens de Marcelo dirigindo o carro da mãe até a escola, sozinho ou acompanhado. Ou mesmo por que o par de luvas que a polícia diz ter encontrado no banco de trás do carro só apareceu dois dias depois de o veículo ter sido apreendido para ser periciado. Enquanto isso, pichações dizendo que Marcelinho é inocente e pedindo que a verdade venha à tona estão presentes tanto na casa da família quanto no colégio particular na Freguesia do Ó, onde o adolescente estudava.  


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