Os problemas da corrupção à brasileira, predatória e escancarada, são deflagrados em primeiro lugar pela recorrente sensação de impunidade dos envolvidos. Em segundo, pelo invariável comportamento das autoridades de encararem como normal, corriqueira e disseminada a prática. E, portanto, inevitável e incorrigível. O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, acuado e cobrado pela longa e extensa folha de malfeitos nos contratos de metrô e trens do Estado – onde ele atua desde 1995, período no qual o esquema de cartel se estabeleceu e ganhou forças –, saiu-se na semana passada com mais uma pérola, distorcida, do pensamento pavloviano de ato repetitivo. Segundo ele, “não houve cartel só em São Paulo. Ocorreram irregularidades em licitações de transporte e energia em diversos outros Estados”. Donde decorre, na linha de raciocínio, que a situação é usual, comum e passível de funcionar às vistas dos responsáveis – e vem trazendo compensações a ambos os lados metidos na tramoia. Atribuindo o escândalo estadual a usos e costumes, Alckmin voltou a repetir Lula. Esse consagrou o mantra do “todo mundo faz” quando se referia ao mensalão petista. Ambos tentaram assim diluir o peso de suas responsabilidades e não trataram devidamente da sujeira no seu quintal. Os dois recorreram, cada um a seu tempo, ao expediente de alegar falta de provas quando elas se avolumavam.

Na disputa política pela paternidade de corrupções menores, ou maiores, quem perde é a sociedade. Para efeito da lei, não existem evidentemente graduações nesse tipo de matéria. Roubo é roubo, passível de condenação e ponto. Seja o praticado por um ladrão de galinhas ou de um cofre de banco. O objeto alvo ou o montante do surrupiado não estão em discussão, muito menos a orientação que o motivou. Certos defensores da tese de uma hierarquia nos escândalos chegam a sugerir que é impossível ao PSDB igualar o arquirrival PT e seus aliados nesse pormenor. Subestimam a capacidade e a criatividade de nossos agentes públicos. Não se trata de um certame, gincana ou peleja entre legendas. Seria lamentável acreditar que assim fosse. Como bem disse o novo ministro do STF, Luis Roberto Barroso (foto), em sua fala na quarta-feira passada na bancada do Tribunal, a corrupção é uma tradição no País, não importando a coloração partidária de quem ocupa o poder. Da mesma forma, Barroso não atribui maior ou menor gravidade a esse ou àquele episódio de corrupção. Tudo é uma questão de caso mais ou menos investigado, diz ele. Eis o novo paradigma que se apresenta sobre o assunto. A improbidade administrativa é um mal em si que deve ser extirpado a qualquer preço, sob pena de minar a credibilidade no sistema. Ainda nas palavras do ministro, o modelo brasileiro produz a criminalização da política e só uma reforma de fundo pode colocar fim ao crônico processo. São sábias palavras!


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