Fotografado para ISTOÉ por Joédson Alves

Indiciado como chefe de quadrilha, Roberto Jefferson voltou a cantar. Há 22 meses, quando denunciou o esquema do mensalão, ele iniciava aulas de canto lírico. Depois, cassado por seus pares, passou todo esse tempo em silêncio. Falou um pouco aqui, cantou um pouco acolá –, mas Jefferson vinha se mantendo nas sombras, evitando entrevistas. Agora ele se sente mais seguro, mais afinado. “Já estou quase pronto para gravar meu primeiro disco”, anuncia. Na manhã de quarta-feira 28, Roberto Jefferson, presidente do PTB, acordou às 6 horas da manhã, em Brasília. Treinou uma hora e meia de canto lírico e, na seqüência, conversou por duas horas com ISTOÉ.

“É a primeira vez que analiso o cenário desde que denunciei o mensalão”, afirmou. Mostrou estar bem informado sobre o submundo que ainda serve de cenário para movimentações políticas e ao analisar a base de apoio ao segundo governo de Lula não usa palavras tão melodiosas quanto seu canto. “Pode explodir um novo mensalão”, alerta. Mais experiente, o ex-deputado defende o parlamentarismo em 2010 e não descarta a possibilidade de Lula permanecer no poder.

ISTOÉ – O sr. denunciou o mensalão e agora foi indiciado como chefe de quadrilha no esquema do PTB nos Correios.
Roberto Jefferson
– O indiciamento faz parte da luta. Não tenho compromisso com vitória, mas com a luta. Nunca imaginei que seria diferente, pois desde o começo venho sendo perseguido pelo procurador, que está a serviço do PT. Nunca fiz e nunca autorizei ninguém a fazer nenhum negócio nos Correios. O procurador vai ter que provar.

ISTOÉ – O PTB era o único partido de santos na base do governo?
Jefferson
– Claro que não. Não fomos santos. Reconheço meus erros. Mas não foi pelos Correios que o PTB fez recursos.

ISTOÉ – Por onde foi?
Jefferson
– Deixa isso no passado.

ISTOÉ – O sr. se arrepende de ter denunciado o mensalão?
Jefferson
– Não, eu ajudei o Lula a se libertar do PT. Tirei o Lula daquela gaiola construída em torno dele pelo José Dirceu, pelo Palocci, pelo Delúbio, pelo Gushiken. O Lula era refém desse grupo. Passava a impressão de que não queria governar, que tinha transferido essa tarefa ao primeiro-ministro Dirceu, o governante de fato. Enquanto isso, ele passeava no Aerolula pelo mundo. Isso acabou. Hoje, Lula conversa com todos, é um homem livre e está trabalhando.

ISTOÉ – Mas, outra vez, se ouve falar em novos possíveis esquemas parecidos com o mensalão, distribuição fisiológica de cargos…
Jefferson
– Mas vocês hoje estão com a lupa acesa. A imprensa está em cima. Fica mais difícil. Já pegaram esse negócio dentro do PR.

Joédson Alves

"Os mesmos vícios do passado estão se repetindo agora" Roberto Jefferson

ISTOÉ – O mensalão voltou dentro do PR?
Jefferson
– Os rumores que eu ouvi nesse princípio de governo, nesse crescimento do PR, foram os rumores que eu ouvi no auge do mensalão. Mas agora é só coisa do PR, parece que não está havendo repasse do PT para os partidos da base governista. Eu peço ao presidente Lula, que hoje é senhor pleno do governo, que fique atento. Vai explodir outro mensalão. Vai explodir outra dinamite debaixo da cadeira dele.

ISTOÉ – Mas, mesmo estando atento a novos escândalos, o presidente confirmou Alfredo Nascimento no Ministério dos Transportes.
Jefferson
– É um ministro com prazo marcado. Para não deixar muito mal o Alfredo, o presidente deve ter dito: “Olha, daqui a três meses você pede demissão, fala que vai se candidatar a prefeito, alguma coisa.”

ISTOÉ – O que existe hoje de semelhante ao passado?
Jefferson
– O PTB de ontem não é diferente do PR de hoje. Nós fizemos 22 deputados na eleição de 2002 e chegamos a 55. Como? Com as facilidades que tivemos com José Dirceu na Casa Civil. Com toma-lá-dá-cá. Toma aqui uma estatalzinha, toma aqui um carguinho. Resolve aqui esse interesse. O PTB chegou nisso, chegou a 55 deputados assim. Não foi um crescimento em torno de um projeto. Era o Delúbio pagando conta de campanha. Era Correios, Infraero, DNIT. Foi um erro grave. E deu no que deu. Era esse jogo. Não era um jogo republicano. Esses é que são os vícios que estão sendo repetidos agora. A base de apoio do governo não se construiu em torno de um projeto político para o País.

ISTOÉ – O PTB apóia o governo e seu presidente é de oposição. Seu partido é esquizofrênico?
Jefferson
– Eu não quero conviver com o governo. Mas sei que os parlamentares do meu partido são governistas. Como se resolve? Ora, deixa apoiar. O que eu não quero é esse negócio de cargo. Você está vendo a Infraero. Não está pipocando para cima do PTB? Não quero mais isso. Quem pegar cargo e errar, não vem mais botar a culpa no PTB. Se fizer trapalhada, vou meter o pé no balde.

ISTOÉ – O presidente conseguirá controlar um governo de coalizão com tantos partidos?
Jefferson
– Acho que, por trás disso, há um fator interessante que começa a surgir. Que é um sentimento parlamentarista no País. Uma coisa positiva. No PSDB, no PFL, forte no PTB, no PT. Eu creio que o Brasil será parlamentarista a partir de 2010. E dando ao presidente Lula, para você não romper com o PT, a chance de ele se candidatar à reeleição.

ISTOÉ – Isso não seria um golpe?
Jefferson
– Não é não. Isso é uma saída definitiva para todas as crises. Você deixaria o Lula fazendo aquilo que ele ama fazer, que são relações internacionais, de chefe de Estado, o afastaria dessa contaminação de acordo com partidos. E nós teríamos um governo no Parlamento. Mais ágil. Não tem impeachment. Crise, dissolve o gabinete. Faz outro. Não deu, dissolve o Congresso. Faz nova eleição. O PTB vai levar essa bandeira adiante. O Fernando Collor já até deu entrada a uma emenda que propõe a adoção do parlamentarismo.