Dizem os especialistas que em política não existe vácuo. Ele é logo ocupado por alguém. Por isso, é natural que políticos, principalmente os de oposição, e novos personagens se apresentem como alternativas ao eleitor neste momento em que o governo se mostra pressionado, tentando encontrar saídas para dar respostas efetivas ao clamor das ruas. Foi exatamente o que ocorreu nos últimos dias. Os presidenciáveis Aécio Neves (PSDB-MG), Marina Silva (Rede) e Eduardo Campos (PSB-PE) se apressaram em apresentar propostas para se contrapor às medidas anunciadas pela presidenta Dilma Rousseff. Candidato do coração dos manifestantes, segundo recentes pesquisas, o presidente do STF, Joaquim Barbosa, também se apresentou para o jogo político. Convidado na terça-feira 25 para uma conversa no Palácio do Planalto com a presidenta Dilma Rousseff, Barbosa saiu do encontro e convocou uma entrevista coletiva para falar de política. Respondeu a perguntas de forma afável e revelou sintonia com as ruas ao defender numa possível reforma política a diminuição, não a extinção, do peso dos partidos e propor um “recall” de candidatos – possibilidade de o eleitor voltar às urnas para destituir o político eleito, caso seu mandato não esteja em consonância com os anseios daqueles que o elegeram.

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DISCURSO POLÍTICO
O presidente do STF, Joaquim Barbosa, encontrou-se com Dilma,
deu entrevista coletiva e propôs diminuição do peso dos partidos

Apesar de dizer que não cultiva ambições eleitorais, Barbosa tem se beneficiado da situação de não político e angariado apoio das ruas. Independentemente das posturas questionáveis e irascíveis, Barbosa se tornou um símbolo de combate à corrupção. Exatamente por isso, foi questionado pela presidenta sobre as propostas prioritárias para o País. “O Brasil vive uma crise de legitimidade”, afirmou Barbosa, minutos depois de se dizer lisonjeado por pesquisa, realizada entre os manifestantes, que o colocou em primeiro nas intenções de voto para a Presidência da República em 2014.

Outro nome a figurar entre os primeiros na preferência das ruas, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) também capitalizou politicamente com o momento de fragilidade do governo Dilma Rousseff. Fez um duro discurso de contraponto à postura adotada por Dilma diante dos movimentos que foi elogiado até por integrantes de partidos aliados ao governo. Falando em nome da oposição, Aécio criticou o teor do discurso da presidenta e a acusou de ignorar os problemas postos em debate pelos manifestantes. “Ela oficializou o jeitinho de fazer política no Brasil, que é jogando os problemas para debaixo do tapete”, criticou.

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CERTEIRO
O senador Aécio Neves, do PSDB, reuniu a oposição, lançou manifesto
em contraponto a Dilma Rousseff e foi elogiado até por integrantes do governo

Além de ganhar espaço e fortalecer o discurso da oposição, Aécio Neves também comemora o fato de ter incluído entre as prioridades do Legislativo para responder às pressões populares a proposta de revisão do Pacto Federativo, uma de suas principais bandeiras desde que chegou ao Senado. O pacto prevê mudanças em leis como a que determina os critérios para a divisão da receita dos impostos entre estados, municípios e União e a que trata da unificação das alíquotas do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).

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Hoje, o discurso contra o governo flui com tranqüilidade, mas encontrar o tom adequado da crítica já foi um problema para a oposição. Na campanha de 2010, o tucano José Serra se perdeu ao tentar atacar o governo Lula sem parecer contrário aos programas sociais. Uma dificuldade que hoje parece superada pela avaliação de que o movimento que tomou as ruas é composto por gente que não depende do Bolsa Família e que a classe média gigantesca é capaz de derrubar a popularidade recorde de um presidente.

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Ao longo da semana mais difícil para Dilma desde a posse, aliados do governo interessados em voos independentes também criaram coragem para começar a adotar um discurso mais ácido. É o caso do governador pernambucano, Eduardo Campos (PSB), que ensaia uma mudança de postura. Suas primeiras aparições públicas trataram o governo com uma cautela pouco comum para quem se apresenta como possível adversário. Adotando um discurso de que as coisas poderiam melhorar ainda mais e fazendo considerações genéricas sobre os problemas do governo petista, Campos não despertou grandes preocupações no Planalto e a ameaça de que seria candidato foi tratada como um blefe. Mas, em conversas com correligionários nos últimos dias, Eduardo Campos prometeu elevar o tom contra o governo. Em encontros com representantes dos movimentos sociais que ocupam as ruas do País, o governador tem feito críticas à demora na conclusão de obras federais e às ideias lançadas por Dilma para acalmar os manifestantes. Em um cenário onde os aliados se contam nos dedos, a presidenta Dilma Rousseff telefonou para Eduardo Campos na quarta-feira 26. Queria convidá-lo para participar das reuniões sobre as medidas adotadas para conter a crise. O ex-presidente Lula também telefonou para pedir a opinião do socialista sobre as manifestações. Os dois conversaram sobre a importância da mobilização social. Nas conversas, no entanto, Campos não deu nenhum sinal de que pretende recuar nas críticas ao Planalto.

O cenário pessimista para o governo também fortalece o discurso da ex-senadora Marina Silva, um pouco modificado para se alinhar às pautas propostas pelos manifestantes. Empenhada na criação do partido Rede Sustentabilidade, Marina deu declarações nos últimos dias apoiando a mobilização. Na semana passada, a campanha em defesa da Rede lançou uma agenda estratégica listando as prioridades do novo partido. Em primeiro lugar estava a reforma política, seguida por saúde e educação. As medidas referentes à sustentabilidade, apesar de darem nome à legenda, passaram a ocupar a sétima posição entre as prioridades. “A motivação para os protestos que ocorrem em todo o País é o surgimento de um novo sujeito político no mundo. Os vinte centavos são o símbolo das manifestações, e neles estão incluídos o hospital que não funciona, o problema de segurança e a falta de canais para que se saiba qual é a agenda estratégica do País. Os antigos partidos políticos vão ter que se repensar”, disse. Marina tem criticado políticos que tentam pegar carona na mobilização apartidária, mas se preocupa em falar que coincidentemente a agenda dos manifestantes é a mesma da legenda pela qual pode sair candidata a presidenta em 2014.

Foto: Adriano Machado / Agência istoé; ED FERREIRA/ESTADÃO CONTEÚDO


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