Os amantes do home theater – aquela parafernália de equipamentos que começa a competir com o cinema na reprodução caseira de som e imagem – talvez não saibam, mas a invenção da televisão ainda é motivo de uma disputa mais acirrada que a do avião. Americanos, franceses, alemães, russos e britânicos reivindicam até hoje a paternidade do aparelho que revolucionou a cultura de massa numa escala incomparável. A contenda voltou à tona na semana passada na comemoração dos 60 anos da primeira transmissão comercial de tevê, feita durante a Feira Mundial de Nova York de 1939. A efeméride, no entanto, alimenta outra questão, esta sim importante para os bilhões de telespectadores em todo o mundo: será que a introdução agora da interatividade na tevê – através do casamento com a Internet – poderá de alguma forma reverter a tão criticada passividade que essa mídia sempre impôs aos seus usuários?

Para a dúvida de quem inventou a tevê provavelmente nunca se terá uma resposta definitiva. A razão é que no início do século distintos projetos correram paralelos em alguns países, produzindo tecnologias muito semelhantes. A idéia básica, porém, já estava pronta no papel desde os idos de 1884, fruto da genialidade do cientista alemão Paul Nipkow (1860-1940). Ele imaginou um disco com uma espiral de lentes. À medida que esse disco girasse, cada lente captaria uma parte da imagem e a transmitiria para um receptor com o mesmo sistema de disco com orifícios (leia gráfico). A primeira transmissão não comercial de imagem televisionada, a do ditador alemão Adolf Hitler abrindo os Jogos Olímpicos de 1936 em Berlim, ainda usava essa concepção. A câmera filmava as imagens em película, que imediatamente era "escaneada" pelas lentes espiraladas do disco de Nipkow e transmitida eletronicamente para outro local. Alguns cientistas supõem que essa cena hitleriana ainda vaga pelo espaço, depondo negativamente para o conceito que uma provável inteligência alienígena possa vir a fazer dos terráqueos (fato explorado pelo filme Contato, de 1997).

Mas, para a questão da interatividade, a dúvida dá lugar à polêmica. Segundo o belga Jean-Jacques Peters, estudioso do assunto, até hoje a tevê não enriqueceu a civilização como fizeram o livro e as artes plásticas. "A tevê nunca serviu como instrumento de cultura porque justamente não é interativa", diz ele em um trabalho publicado por ocasião do jubileu de ouro da televisão. "Os telespectadores precisam deixar de apenas absorver passivamente tudo o que a tevê reproduz, precisam interferir nesse processo." Bom, dez anos depois, isso já começa a acontecer com os sites das grandes redes de tevê na Internet. A união da Microsoft com a NBC na web foi o primeiro passo, há quase três anos. Hoje, há rumores de que a America Online (o maior provedor de acesso dos EUA) estaria para comprar a rede CBS. Seria o fim da tevê? Bom, com o aumento da velocidade da Internet, não há como negar que em pouco tempo haverá nova revolução na maior das mídias de massa. O telespectador poderá não apenas interagir com a tevê totalmente digital e de alta definição (HDTV) via Internet, mas modificar as imagens a seu bel-prazer. Quem sabe um dia você possa até mesmo tomar o lugar do mocinho (ou da mocinha) e se ver beijando a estrela do filme.

Seis décadas na telinha
De um invento curioso, a televisão passou a ser um produto de massa e um instrumento de poder em todo o mundo

1889 O cientista alemão Paul Nipkow idealiza o primeiro artefato de transmissão de imagem
1928 Pesquisadores britânicos conseguem fazer a primeira gravação de imagem de tevê, de uma artista de teatro
1936 O regime nazista faz a primeira transmissão de imagem de tevê durante os Jogos Olímpicos de Berlim
1939 Na Feira de Nova York surgiu a tevê comercial. Tinha início a indústria de entretenimento que revolucionou a mídia neste século. As maiores atrações sempre foram as séries, como I love Lucy
1950 O Brasil foi o 4º país do mundo a abrir um canal de tevê: às 22h do dia 18 de setembro de 1950
1967 No final dos anos 60 a televisão já era um produto de massa, que projetou ídolos como a gênio da lâmpada
1999 Neste final de século, a tevê passa a interagir com o telespectador graças à Internet