Os assessores da CPI dos Bancos ficaram estarrecidos com a quantidade de evidências a comprovar que o economista Francisco Lopes nunca se desligou, enquanto esteve no Banco Central, da consultoria Macrométrica, criada por ele próprio em 1984. Ao assumir a diretoria de Política Monetária do BC em 1995, Lopes deveria ter se desvinculado da consultoria. Na prática, isso nunca aconteceu, segundo senadores e os procuradores federais que investigam o caso. Eles se baseiam nos indícios encontrados na apreensão de documentos no apartamento do economista:

– Planilhas mostram a partilha de lucros entre dois sócios da Macrométrica, os economistas Estevão Kopschitz e Luiz Fernando de Souza Maia. No verso desse documento, um extrato em nome de Souza Maia indica vários depósitos, nos valores de R$ 800 a R$ 4 mil, nas contas da mulher de Chico Lopes, Araci Pugliese, e sua filha, Stefânia.

– Vários balanços da Macrométrica referentes ao exercício do ano passado eram remetidos em envelopes à casa de Chico Lopes, com a menção de "professor Francisco". Um deles diz "esse é o balanço principal a ser analisado", datado do dia 1º de junho de 1998.

– Um bilhete escrito por Lopes revela que o economista Sérgio Bragança, seu ex-sócio na Macrométrica, seria o responsável por uma conta no Exterior, em que US$ 1,675 milhão pertence ao ex-presidente do BC.

– Esse valor não está declarado em sua prestação de contas ao Fisco. No ano passado, Lopes teria declarado o recebimento de R$ 139 mil – um rendimento aparentemente incompatível com o valor da conta no Exterior.

Debruçados para montar o quebra-cabeça que revelaria o suposto esquema de venda de informações privilegiadas, os senadores acreditam que Chico Lopes orientava o planejamento da Macrométrica. Formalmente, quem respondia pelo escritório era o economista Estevão Kopschitz. Quando deixou a Macrométrica para ir ao governo, Chico afirmou que se teria desligado da empresa, mas os procuradores acharam um documento intitulado "Compromisso Fábio-Ciça", o elo entre a Macrométrica e o ex-presidente do BC. Fábio seria um dos sócios da Macrométrica: Fábio Miguel Lyrio. Ele, aliás, acompanhou a apreensão dos documentos na sede da empresa. Ciça, como se sabe, é o apelido da mulher de Chico Lopes. Por meio desse acordo, datado do dia 21 de dezembro de 1998, 22 dias antes de Lopes assumir o BC, Fábio transferiria participação numa das empresas da Macrométrica a Ciça. A mulher de Chico Lopes estaria obrigada a pagar R$ 650 a Fábio durante 36 meses. O advogado da Macrométrica Manoel Peixinho afirma que se trata de um singelo acordo de empréstimo de R$ 15 mil entre Ciça e Fábio. Mas para os técnicos da CPI, essa seria a forma que Lopes encontrou para manter seu vínculo com a consultoria. "São indícios de que existe um grande envolvimento entre Chico Lopes e a Macrométrica", afirmou o relator da CPI, senador João Alberto (PMDB-MA).

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Samurai deprimido

Francisco Lopes fazia parte do círculo de economistas sempre convocados para montar o plano da vez. Era tratado como uma referência, e gostava disso. Amava sobretudo suas próprias idéias. Mas a vaidade ruiu quando foi colocado no banco dos réus. O ex-presidente do Banco Central rendeu-se à dupla humilhação de depor em um inquérito em Brasília enquanto tinha o apartamento vasculhado no Rio. E mergulhou em uma profunda crise depressiva. A amigos, confidenciou: a publicação de que tem dólares no Exterior e nunca se desligou da empresa de consultoria Macrométrica pode destruir sua biografia. Na segunda-feira 19, hospedado no hotel Kubitschek Plaza de Brasília, Chico Lopes vestiu o terno para ir prestar depoimento na CPI, mas viu-se incapaz de articular idéias. "Só com a minha morte isso se resolve", chegou a repetir, duas vezes a um amigo ao telefone. Por orientação dos advogados, o economista suspendeu as entrevistas e pediu à CPI para adiar o depoimento. Deixou o apartamento em Copacabana e escondeu-se. Sentido-se abandonado pelo governo, não teve contato com ex-colegas da equipe econômica. Um amigo que o visitou na quinta-feira 22 diz que ele está mais magro, evita tomar conhecimento do noticiário e continua deprimido. Agora o temor dos amigos é uma frase que Chico Lopes, adepto da filosofia oriental, divulgou quando assumiu o BC: "O guerreiro, quando desembainha a espada, é para sujá-la. Nem que seja com o próprio sangue."

Sônia Filgueiras


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