O empresário Fábio Monteiro de Barros Filho, principal responsável pela construção polêmica do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo, é um bom contador de histórias. Não perde a calma quando acuado, aos poucos vai deixando a cerimônia de lado e aumentando o número de palavrões em suas falas. Aos 44 anos, filho de uma família tradicional de São Paulo, que dava, em 1823, o primeiro governador da história de São Paulo: Lucas Antônio Monteiro de Barros. Recém-separado, pai de três filhas, Fábio está vivendo um dos piores momentos de sua vida. Acusado de vários crimes contra os cofres públicos, acaba de sair da prisão da Polícia Federal. Ao lado do juiz Nicolau dos Santos Neto e do ex-senador Luiz Estevão, é acusado de desviar verbas. O empresário nega tudo. Diz-se injustiçado e, de certa maneira, vítima de encontros infelizes. Era o homem errado no lugar errado. É uma versão. Na entrevista a seguir, além de se defender, Fábio Monteiro de Barros ataca com grande poder bélico.

ISTOÉ – O que o sr. acha do juiz Nicolau?
Fábio Monteiro de Barros Filho
– É um homem muito severo, muito autoritário, porém extremamente responsável e exigente. Ele não nos dava a menor liberdade e exigia o máximo o tempo todo. A história dele é uma história de regime autoritário, era um homem ligado às Forças Armadas durante todo o período ditatorial. Pelo que consta, parece que ele era o financeiro do Doi-Codi (organismo do Exército de repressão política criado no tempo da ditadura militar). Tinha o Tuma dentro do Dops e ele era o financeiro do Doi-Codi. O Tuma agora diz que nem conhece ele, mas eu presenciei o juiz Nicolau algumas vezes chamando-o “chefe”. Era assim que ele se dirigia ao Tuma. Eu presenciei duas ou três vezes ele falando no telefone.

ISTOÉ – Pelo que o sr. sabe, ele era amigo de Tuma?
Monteiro de Barros
– Muito amigo, muito amigo. São coisas absolutamente públicas. É só pegar a história dos dois e ver quantas pessoas conhecem isso, todo mundo sabe. É que no Brasil as pessoas têm vergonha de dizer certas coisas.

ISTOÉ – O sr. é amigo dele?
Monteiro de Barros
– Não. Eu tive com ele uma relação, eu diria, intensa. Como ele é autoritário, foi o único presidente do TRT-SP que conseguiu viabilizar e tocou o prédio. O atual presidente pretendeu ocupar esse espaço, dando um tiro no próprio pé. Houve também uma briga no início da polêmica entre o tribunal e o Ministério Público. O tribunal é composto de juízes de segunda instância que não aceitam conversar com o Ministério Público da forma que o Ministério Público quer conversar. Então havia um mal-estar mais antigo por parte do Ministério Público em relação a esses homens. E eu acho que conheciam a biografia do juiz Nicolau e tinham um certo posicionamento contrário a uma outra geração do Ministério Público que sofreu na ditadura de uma outra forma. Então era natural.

ISTOÉ – Por falar em amizades, o sr. é amigo do ex-senador Luiz Estevão?
Monteiro de Barros
– Sou amigo. Minha filha é amiga da filha dele também. Eu falei com eles poucas vezes depois da cassação, mas falei. Considero-o um dos homens mais inteligentes que eu conheço, trabalhador, brilhante, um exemplo de garra inacreditável.

ISTOÉ – Qual foi o resultado da paralisação da obra?
Monteiro de Barros
– Nós perdemos o dinheiro, perdemos as empresas, demitimos mais de 2.200 funcionários. Trabalhávamos em oito Estados, saímos de R$ 150 milhões de faturamento anual para zero. Todos os bens foram bloqueados, contas bancárias, inclusive das pessoas físicas. A caderneta de poupança da minha filha foi bloqueada porque ela tinha o meu CIC, é menor. É um negócio que demole a gente inteiro. Nós vamos recompor isso e, infelizmente, quem vai pagar todo esse prejuízo vai ser o erário.

ISTOÉ – Qual é a sua relação com Eduardo Jorge?
Monteiro de Barros
– Eu conheci o ministro Eduardo Jorge socialmente, como conheço praticamente todas as autoridades, porque a gente frequenta os lugares. Nunca tive nenhum contato mais próximo, nunca tratei com ele do assunto.

ISTOÉ – O próprio juiz Nicolau admitiu na conversa gravada que Eduardo Jorge atuava para liberar recursos atrasados.
Monteiro de Barros
– E daí? Qual o problema? Isso é legítimo.

ISTOÉ – Mas por que o governo não assume se isso é legítimo?
Monteiro de Barros – E eu vou saber? Provavelmente o governo não pode dizer: eu dou dinheiro pra cá, não dou pra lá, dou pra lá, não dou pra cá. Todo mundo pede dinheiro para o governo o tempo inteiro.
ISTOÉ – O que o Eduardo Jorge fez não foi tráfico de influência? Favorece uma pessoa porque ela está ajudando o governo em outra causa. E por que o governo não assume isso se é normal?
Monteiro de Barros
– Sabe por quê? Porque não teve alguém lá brigando para não acabar. Se tivesse alguém lutando para acabar, acabava.

ISTOÉ – A quebra do sigilo telefônico da CPI encontrou 15 ligações suas para o Eduardo Jorge nesse período em que ele era ministro. O que foi tratado?
Monteiro de Barros
– Eu verifiquei as ligações e eram todas de um minuto. Então eram ligações que não existiram. O que pode ter ocorrido nisso? Passar um fax a pedido do tribunal. Algumas vezes o tribunal precisa de elementos, subsídios. É normal.

ISTOÉ – O sr. se encontrou com o presidente FHC?
Monteiro de Barros
– Houve três encontros. No dia em que o Ministério Público entrou com ação contra nós, decretando indisponibilidade de bens, eu estava em Pernambuco recebendo o presidente em duas obras nossas.

ISTOÉ – E aí o sr. falou com ele?
Monteiro de Barros
– Não. Eu nem sabia, vim saber quando cheguei em São Paulo. O terceiro encontro foi em Paris, numa feira imobiliária, a Mipin, quando eu apresentei o presidente FHC ao presidente do grupo Calberson, um dos maiores da área de logística na Europa.

ISTOÉ – E o ministro Martus Tavares, o sr. já conversou com ele?
Monteiro de Barros – Nunca estive com ele. Ele eu não conheço nem de cumprimentar.
ISTOÉ – E o ministro Pedro Parente?
Monteiro de Barros
– Só de cumprimentar.

ISTOÉ – E qual é a sua relação de amizade com o diretor-geral do Tribunal Superior de Trabalho, José Geraldo Lopes Araujo?
Monteiro de Barros
– O TST controla no Brasil inteiro todos os problemas. Então o dr. José Geraldo é um pára-raio do Brasil na Justiça do Trabalho. Não deve ter sido só eu que falei com ele. O Brasil inteiro deve falar. Então eu devo ter tido vários contatos com o dr. José Geraldo, até por ter esgotado as conversas em São Paulo. E o juiz Nicolau era o primeiro a dizer, em momentos críticos, de a gente ter que comprar isso ou aquilo: “O senhor liga para o dr. José Geraldo e verifica se ele tem condição de, no orçamento global, poder atender ou não atender. Checa com ele.” É normal esse processo.

ISTOÉ – O sr. teve em algum momento algum indício ou algo que o levasse a crer que o dinheiro teria saído, mas desviado da finalidade principal?
Monteiro de Barros
– Não existe isso. O TRT fez uma licitação para comprar um prédio a preço fechado. São cerca de 150 bilhões de cruzeiros. Daí para a frente, passaram três moedas, inflação de dez mil por cento etc. Tive que contratar a Fipe, gastar uma fortuna para saber o preço de hoje. Então tem que parar esse chutódromo, cada um diz um valor.

ISTOÉ – Como foi feito?
Monteiro de Barros
– As empresas participantes, pessoas físicas ou jurídicas, eram obrigadas a participar de algumas visitas ao tribunal e às juntas, para conhecer o funcionamento. Isso com lista de presença, todo mundo tinha que ir, ouvir uma aula teórica e depois visitar os prédios das juntas. Durante o processo licitatório, o jornal O Estado de S. Paulo participou de todas as audiências e sessões com um jornalista, que assinou todas as atas, contra a sua vontade, porque o juiz Jamil Zantucci, que presidia a comissão de licitação, exigia. Então o jornal não tem a menor autoridade moral de falar nada disso, porque acompanhou o tempo todo.

 

 

 

ISTOÉ – A imprensa toda falou que a Incal era do Luiz Estevão e mostrou aquele contrato que foi encontrado na sua casa, que seria um contrato de gaveta. A Incal é do Luiz Estevão?
Monteiro de Barros
– Até gostaria que fosse dele porque ele ficava com esse ônus todo. Num processo licitatório é normal os concorrentes ligarem, tentarem se associar. Nós tivemos algumas conversas com o Luiz e eu realmente achei que talvez, por ele morar em Brasília e ser um sujeito extremamente articulado lá, pudesse vir a somar com um lado que eu não tinha, que era esse lado de lá, num projeto desse tamanho. Ele naquela época estava querendo entrar em São Paulo, o grupo dele estava se expandindo muito. Então tinha uma sinergia de interesses. Nós chegamos a conversar e fazer num determinado momento uma associação. O Luiz é um sujeito brilhante mas muito difícil. Não deu certo porque ele emperrou num problema técnico. Ele queria fazer um prédio horizontal e nós, vertical.

ISTOÉ – O TRT de Belo Horizonte não foram vocês que venderam?
Monteiro de Barros – Não. Nós estivemos no TRT de São Paulo e eu fui corretor, intermediando. Eu tinha 23 anos e era muito amigo do Mário Zotti, dono da GTO. O Zotti tinha uns empreendimentos fantásticos, eram três empreendimentos. Ele começou a ter problemas e era muito financiado pela Haspa.
ISTOÉ – A Haspa parece que era do sogro do Luiz Estevão.
Monteiro de Barros
– Não. A Haspa era dos Stockler. Aí ele não conseguiu cumprir e entregou os imóveis para a Haspa, que engoliu a GTO. A Haspa quase quebrou, os Stockler não aguentaram a porrada e saíram atrás de um sócio. Pegaram o Sérgio Chofi, que comprou a Haspa. Nessa época o tribunal de São Paulo queria comprar um prédio. Eu ofereci dois prédios para o tribunal. O tribunal acabou comprando. O Chofi acabou o prédio e entregou para o tribunal. Quando já tinha vendido o prédio, ele teve problemas na Haspa. Aí ele se associou à Colméia, que era do sogro do Luiz, o Cleto Meirelles. Aí rodaram a Haspa e a Colméia juntas. Então eu fiz negócio para o Sérgio Chofi. Seu Cleto Meirelles eu não conhecia nem de binóculo. Eu vim a saber que ele participava depois de muito tempo.

ISTOÉ – E os outros tribunais?
Monteiro de Barros
– No caso do TRT de Brasília algumas empresas me chamaram para dizer: “Como vocês resolveram esse problema em São Paulo?” E é evidente que eu cobrei. Vou trabalhar de graça? Então não é que eu fiz o negócio.

ISTOÉ – O sr. deu uma consultoria.
Monteiro de Barros
– Exato.

ISTOÉ – E Porto Alegre?
Monteiro de Barros
– Eu tinha negócio com a Aplub. O presidente da Aplub, que é o dr. Rolf Zelmanoviz, um dos brasileiros mais brilhantes que eu conheço, tinha conseguido associar a Aplub, que era uma pulga, com o Bank of America, que era o maior banco do mundo, formando o Multibanco, que era atrás do meu escritório na 24 de Maio com D. José de Barros. Então eu conhecia ele porque aquele prédio esteve à venda algumas vezes e a Aplub tinha 51% do Multibanco. O Bank of America tinha 49%. E o dr. Rolf era o presidente. Alguns anos depois, lá em Porto Alegre, a Aplub fez com uma outra empresa, não sei o nome, um negócio com o tribunal de lá e viabilizou o prédio de lá. Ele me chamou algumas vezes: como vocês fizeram isso, como fizeram aquilo? Mas coisas normais. Nunca tive uma reunião em tribunal nenhum.

ISTOÉ – Como funciona o processo de liberação de verbas?
Monteiro de Barros
– O que o governo reparte, o que é? Ele tem, digamos, 20 bilhões para investir no ano. O DNER, Ministério dos Transportes, precisa de 15 bilhões. Não tem jeito, vai parar o País se não tiver 15 bilhões para o DNER. Sobraram cinco. A saúde precisa de três. Sobraram dois. Vão para tais, tais e tais. Então não há mais para fazer o prédio em São Paulo. Corta o orçamento pela metade. Não interessa se contratou ou não.

ISTOÉ – Como ficou a obra do tribunal de Rondônia?
Monteiro de Barros
– Vieram 75 milhões, 50 para a Eleitoral e 25 para a Justiça do Trabalho. Estou dando números grosseiros, 20 para São Paulo e cinco para Rondônia. Nomeia-se o relator e esse projeto de lei que está dentro do Congresso vem para a mesa do Congresso Nacional. Como a comissão de orçamento é mista, composta por deputados e senadores, o presidente do Congresso é que determina o presidente da comissão e o presidente da comissão nomeia o relator. Nomeou o senador Valdeck Ornellas. O senador pegou o projeto de lei, pediu informações, o tribunal nos solicitou informações, forneci informações. Eu não saía do Congresso, desesperado com os fornecedores, aquela coisa. Tinha uma programação, pô. O Giovanni Queiroz não queria aprovar porque Rondônia seria beneficiada e o candidato dele em Rondônia, do PDT, estava indo muito bem na tal eleição que ia ter. Se o tal projeto de lei fosse aprovado, o Odacyr Soares seria beneficiado de alguma maneira pelo dinheiro que ia para o tribunal de Rondônia. Bem, o Valdeck viu aquela polêmica e rachou o projeto de lei, liberou (a Justiça Eleitoral aprovou) e renunciou à relatoria da Justiça do Trabalho. Aí o projeto voltou para a comissão, da parte da Justiça do Trabalho. Foi nomeado um outro relator, o Odacyr Soares. Foram mandados todos os subsídios para a assessoria do Senado. A assessoria do Senado fez um dossiê desta altura aqui e passou para o senador Odacyr Soares, que foi para a comissão e defendeu o PL e aprovou, em meio a uma briga no plenário de dedo na cara do Giovanni Queiroz.

ISTOÉ – O que aconteceu?
Monteiro de Barros
– Durante dois meses e meio aquela coisa ia para a sessão, dava briga e o Giovanni Queiroz com o Odacyr Soares não aprovavam. Aí o senador Odacyr Soares pegou e deu 10% do projeto de lei (que também é uma prerrogativa do relator) para o fundo partidário. Sabe o que dá isso? Dava 2,5 milhões. Chega na hora de apresentar o projeto de lei, o Odacyr Soares apresenta, o PDT do Giovanni Queiroz levanta-se contra. Cadê o PT para ficar contra? Tinha saído da sessão. E aprovou. Só o PDT foi contra. Aí o sujeito do PT diz: “Porra, eu estava no café. Não vi.” Não viu por quê? Não vem com essa conversa pra cima de mim. Não foi lá porque recebeu 10% para o fundo partidário, todos os partidos receberam o dinheiro e acertou o caixa deles todos.

ISTOÉ – Mas no tribunal da Paraíba o sr. não fez corretagem?
Monteiro de Barros – Nunca nem ouvi falar disso da Paraíba, nunca nem estive lá. Talvez eu conheça um ou dois paraibanos na minha vida. Nas minhas obras deve ter bastante paraibano.

ISTOÉ – O sr. conhece Almir Pazzianotto?
Monteiro de Barros
– Conheci-o na época em que foi secretário de Estado aqui em São Paulo. Sei que ele era contra a centralização das Juntas em um determinado momento e sei que a briga do ACM em cima de nós e da Justiça do Trabalho foi por causa dele, porque ele foi falar alguma malcriação pro ACM publicamente. E o ACM achou que ele era padrinho do empreendimento de São Paulo. Isso foi um mês antes de ele vir visitar o nosso prédio. E quem trouxe o ACM para visitar o nosso prédio foi o Di Gênio, que vocês deviam perguntar. Porque o ACM pergunta tanto quem viaja no avião de quem, como, quem paga o que pra quem. E o Di Gênio paga tudo pro ACM e ele não sai do avião dele, não sai do avião dele.

ISTOÉ – O sr. tem um avião que está no nome do Cabrera. Para quem já deu carona?
Monteiro de Barros
– Eu fui quem menos andou nesse avião (risos).

ISTOÉ – Mas o sr. levou políticos nesse avião.
Monteiro de Barros
– Eu emprestei muito e é uma coisa absolutamente normal. O governador Mário Covas viajou comigo várias vezes.

ISTOÉ – O Delfim Netto também.
Monteiro de Barros
– O Delfim Netto não viajou comigo. Eu lhe emprestei várias vezes.

ISTOÉ – O Romeu Tuma?
Monteiro de Barros
– Não.

ISTOÉ – Ele já voou nesse avião.
Monteiro de Barros – Tem uns caras que são organizados no Brasil, que sabem fazer as coisas. O Delfim é um deles. É um privilégio você ser amigo dele. O meu pai é amigo do Delfim desde a faculdade. Ele vai para Brasília e volta toda semana e incomoda um amigo que tem avião a cada dois meses, se não me engano (risos). Desses caras que vivem ali enchendo o saco dele.

ISTOÉ – A Marta Suplicy está alegando o seguinte: que um dos motivos por que ela ajudou na liberação foi um pedido do Delfim a ela.
Monteiro de Barros
– Pode até ser. Mas é normal a bancada dar o dinheiro. É uma obra que tem que acabar. O que o Delfim falou na Comissão de Orçamento? Um dos melhores investimentos que se tem para fazer com o pouco dinheiro disponível é acabar a obra de São Paulo.

ISTOÉ – O Robson Tuma é seu amigo?
Monteiro de Barros
– Não. Eu conheço ele.

ISTOÉ – O dono do hangar, lá em Brasília, o Mioto, falou que presenciou vários políticos saindo daquele avião: Romeu Tuma, Robson Tuma, Delfim, Hélio Rosas.
Monteiro de Barros
– No acordo que fiz com o Cabrera por várias vezes eu fiz fretamento do avião para gerar dinheiro para se pagar. Então o hangar do Mioto mesmo arrumou vôo. Vai ver que o Tuminha voou com ele pagando ou alguém pagando lá para ele. É normal isso, não é feio. Eu não cedi para ele, cedi para o Delfim, para o Montoro. O Hélio Rosas voou comigo. O Delfim talvez tenha levado o Tuma, porque todo mundo sabe que o Delfim decola às terças às sete horas da manhã e volta na quinta entre duas e seis horas da tarde. O pessoal que vai de São Paulo para lá e volta é normal ligar para ele: “Ô ministro, tudo bem? Tem lugar, tem boca pra mim hoje?” – “Tem” e tal. Pá. Comigo o Tuma não foi. O Tuminha também não.

ISTOÉ – E o Andrea Matarazzo?
Monteiro de Barros
– Não, nunca. Por exemplo, duas vezes me pediram, do Mioto: “Vai ter convenção do PFL em Tocantins, eu estou arrumando seis aviões. Pô, me ajuda a emprestar.” – “Tudo bem. Mando emprestar. Entrega lá.” Eu não sei quem foi nele. E sei que na comitiva que foi para Tocantins, no comício, foi o Sarney, o ACM, todo mundo em seis aeronaves. Eu não sei quem foi em qual; nem eles sabem. Um dia, por exemplo, fui avisado pela TAM, a TAM me falou. A Marginal encheu de água em São Paulo e o Antônio Carlos Magalhães ia embarcar para a Europa ou para algum lugar, os Estados Unidos, e não tinha como acessar o aeroporto. Ele foi a Congonhas e a TAM mandou ele para lá, para Cumbica. Só que não tinha avião lá. Eles ligaram para o hangar, da pista, desesperados: “Tem um avião aí? Alguém tem um avião? Pega e manda pra cá agora.” Fizeram o vôo. Pegaram o ACM lá e levaram ele. Me avisaram dois dias depois: “Olha, foi preciso usar ele aqui para fazer esse trajeto, para levar o homem.” Nem esse filho da puta sabe. Voou no avião e não me pagou também? São essas coisas. A TAM falou: “Eu pago as despesas e tal.”

ISTOÉ – Quais outras autoridades voaram nesse avião?
Monteiro de Barros
– O Luiz Carlos Santos era candidato. Fretaram o avião e ele pagou, mas chegou para embarcar e se recusou: “Esta bosta, esse avião pequeno? Eu quero um avião grande, com comissária e tal.” Aí eu soube da história. O Lula viajou algumas vezes e alguém pagou também. E Chitãozinho e Xororó, Sandy & Júnior, essa putada toda usou muito, mas pagando.

ISTOÉ – O sr. ajudou a pagar ou pagou o frete de diretores de fundo de pensão?
Monteiro de Barros
– Eu apresentei para a Associação Brasileira dos Fundos de Pensão o projeto que eu ia levar para a Europa, que era o Edifício São Luís, com o Romeu Chap Chap. Pela primeira vez na história do Brasil uma empresa estrangeira ia apresentar um empreendimento no Exterior. Eu convidei alguns fundos, algumas pessoas para irem àquela feira em que nós estávamos expondo. Mas não com passagem. Lá eu fiz um evento, um jantar. Eles se organizaram. Você conhece essa gente? Sindicato é doido pra ir em qualquer lugar, se convidam… São doidos para passear. Foram mais fundos privados: o da Sadia, Eucatex, Duratex, esses que têm uma visão empresarial mesmo.

ISTOÉ – De estatais não tinha nenhum?
Monteiro de Barros
– Não lembro. Foi uma meia dúzia deles.

ISTOÉ – Se o processo de construção do prédio do TRT-SP se desenvolveu como o sr. conta, qual a explicação para o desfecho da história?
Monteiro de Barros
– Nós estávamos na hora certa, no lugar certo, no momento certo, tudo certo pra ferrar. O presidente Fernando Henrique fez um acordo com o Fundo Monetário Internacional, que falou para ele o seguinte: “Eu não posso investir em país que não tenha um Judiciário eficiente porque a taxa de juros deste país fica muito elevada.” Se o investidor põe US$ 10 milhões e você me hipoteca a sua fábrica, se você não me paga, quero tomar sua fábrica em dois meses. Se eu tiver que ficar 20 anos para tomar sua fábrica, o custo do meu dinheiro por causa do risco é tão grande que não vou ver vantagem. Então o FMI quer um Judiciário eficiente. O Fernando Henrique explicou para o FMI que o Judiciário é outro poder, não tem como ingerir. Pelo que me consta, o senador Antônio Carlos disse: “Deixa comigo. Vou fazer a CPI do Judiciário.” Porra, a Constituição impede que se faça CPI do Judiciário, é proibido, um poder não pode fazer CPI do outro. Então aí eles mudaram, foram ajustando e criaram a CPI de eventuais irregularidades no outro poder. Aí o que acontece? Os governadores pularam na hora: nos Tribunais de Justiça estaduais não vai ter CPI porque a Assembléia Legislativa pode fazer. Já tirou 80% do Poder Judiciário da brincadeira deles. Sobraram as justiças federais. A Justiça Federal tem a militar, a eleitoral, a trabalhista, a cível e a criminal. Na eleitoral, o que ele fez? Zero. Na militar, diminui dez ministros e ainda só saem quando acabar o mandato, de 50 veio para 40, uma bobagem. A cível julga ele e a criminal também. Sobrou a do trabalho. Ele fez aquele puta barulho, tinha que pegar alguma. A do trabalho, 50% é de São Paulo. Porra, o presidente do Congresso fez esse puta alarido, então vamos mexer nessa. O Di Gênio paga para ele aqui em São Paulo. Vocês sabem que havia uma briga aqui no prédio de São Paulo. Ele estava almoçando no Massimo e o Di Gênio falou: “Vamos pra lá, vamos pra lá.” Quando ele viu o tamanho, de lá pegou o celular e falou: “Liga para o Estadão agora e manda vir um repórter aqui.” Foi lá pro meio: “Tira uma fotografia. O elefante cinza aqui, esse puta absurdo.” Eu estava na hora certa, no lugar certo. Podia estar quebrando o pau com o tribunal. Dali pra frente acabou, não tem mais conversa. Aí pintou o genro, a Nicéia da vida do dr. Nicolau.

ISTOÉ – As filhas dele…
Monteiro de Barros
– Ali o problema foi que ele queria fazer um ménage. Eles não têm filhos. Ele é casado sem filhos há dez anos e queria fazer troca de casal. Ela não queria e dizia que queria separar. Ele gostava muito do cara. No dia que ela falou isso, puta vida. O dr. Nicolau é campeão brasileiro de tiro ao alvo. Este dedo dele aqui é o dobro desse. Então ele foi pra cima do cara, já viu o que sobrou.

ISTOÉ – Qual seria o valor atualizado do prédio?
Monteiro de Barros
– A Fipe chegou em R$ 189 milhões. O valor do meu preço de venda. Superfaturamento não existe em preço. Ou o preço era alto na época? O TCU avaliou, não era alto. Também não houve desvio. O que é preço é recebimento meu. O que eu fiz com o dinheiro desde que entreguei o prédio é problema meu. Agora, se o juiz é rico, é outra coisa.

ISTOÉ – Dizem que o juiz Nicolau ganhava dinheiro assim: um sindicato queria 12% de aumento, numa folha anual de R$ 4 bilhões, por exemplo. Cada 1% a menos era uma economia de R$ 400 milhões para os patrões. 10% disso dá uma comissão de R$ 40 milhões…
Monteiro de Barros
– Eu não sei nada disso.

ISTOÉ – Segundo a CPI, o sr. transferiu esse dinheiro para a Incal. Foi um total de 46 milhões. É isso?
Monteiro de Barros
– Não sei precisar. Mas nós fizemos bastante negócios. Compramos uma fazenda de 55 mil hectares do BCN.

ISTOÉ – As pessoas dizem que o Luiz Estevão era meio dono da Incal.
Monteiro de Barros
– As pessoas dizem muitas coisas. O Delfim, quando dizem que é veado, fala: “Espalha que é bom, me ajuda” (ri). Eu adoraria que ele fosse dono porque era ele que ia ter que estar aqui e ele ia estar com essa pauta de processo criminal.

ISTOÉ – O sr. é ladrão?
Monteiro de Barros
– Não. Eu ganhei dinheiro na minha vida. O que eu fiz com meu dinheiro é problema meu. Eu fiz muita coisa boa e fiz muita cagada. Eu jamais compraria o que comprei naquela época, que foi terra. É o negócio que mais caiu. O que eu paguei para a Codeara e para o BCN para me venderem essas fazendas, eu compro hoje por um terço.

ISTOÉ – Naquele bilhete seu para o Luiz Estevão parece que o sr. tem uma relação…
Monteiro de Barros
– Como é o meu bilhete? “Por favor, vê se você pode me emprestar, eu preciso, estou desesperado.” Se fosse dele, eu ia pedir?

ISTOÉ – Outra coisa que parece ali é que o sr. é um homem pobre.
Monteiro de Barros
– Mas eu estou há dois anos com as minhas contas bloqueadas, não tenho talão de cheque, cartão de crédito. Eu demiti 2.200 funcionários, meu amigo. Tive as minhas fazendas todas invadidas por conta da televisão que diz que tudo que tenho é com dinheiro roubado. Eu tenho 16 advogados. Sabe quanto custa pagar essa máquina para brigar um ano e meio, dois anos? Quebra qualquer cara.

ISTOÉ – Onde o sr. arranja dinheiro?
Monteiro de Barros
– Meu pai vendeu uma fazenda há três meses para me ajudar. Por metade do preço. Então estamos vivendo desse jeito. Eu tenho alguns créditos para receber e as empresas também não querem pagar, porque ninguém quer ter contato comigo. Tem 16 fiscais da Receita Federal o dia inteiro na minha empresa querendo ver as coisas e batendo na porta de cada cara pra quem eu dei cheque nos últimos seis anos. Então tenho lepra.

ISTOÉ – A Receita está acusando o sr. de ter mandado para fora R$ 3 milhões de maneira fraudulenta?
Monteiro de Barros
– Não. É só ler o processo, é só ler. O que aconteceu? Eu fiz um pagamento para uma empresa chamada International Real Estate Company. Tem uma carta, pus tudo no processo.

ISTOÉ – É o do Panamá?
Monteiro de Barros
– É.

ISTOÉ – E o do Paraguai?
Monteiro de Barros
– Não sei. Você sabe que no mercado financeiro tem umas empresas que são cordão sanitário na região. Aquela Split é uma delas. Então muitas vezes você paga uma empresa e ela manda para a Split direto e você vai para a Split.

ISTOÉ – Como é cordão sanitário?
Monteiro de Barros
– Nesse negócio que o Cacciola fez aí, com quem ficaram os títulos? Você acha que o Bradesco vai comprar por um preço e vender por outro? Não. Ele põe um cara no meio: “Vai lá, compra pra mim essa porra e traz.” O dirty work tem alguém que faz no mercado.

ISTOÉ – Trabalho sujo.
Monteiro de Barros – Quando alguém paga um fornecedor, paga uma parte do terreno por fora, um valor qualquer, esse cara põe o cheque onde for. Infelizmente é assim. Se faz um rastreamento desse nível, vai pegar.

ISTOÉ – O sr. deu algum dinheiro para o juiz Nicolau?
Monteiro de Barros – Não, nenhum centavo. E não tinha nem por que, porque ele só me fodeu. Apesar disso, no último dia 26, um avião da Polícia Federal aterrissou na minha fazenda em Porto Alegre do Norte, no Mato Grosso. Desceram seis agentes, invadiram a sede com fotos do juiz Nicolau para saber se ele estava lá.

ISTOÉ – Eduardo Jorge nunca o ajudou em nada?
Monteiro de Barros – Nunca, nada, nada. Infelizmente, nunca tive a oportunidade nem o privilégio.

ISTOÉ – Nem na Previ, na construção do edifício São Luiz?
Monteiro de Barros – Pelo contrário.

ISTOÉ – Como é que foi essa história?
Monteiro de Barros – A Previ deve receber umas 200 ofertas de imóveis por mês. O meu empreendimento é o único com 100% de infra-estrutura para os padrões internacionais, ou seja, tem da fibra ótica ao metrô. E tem dois mil metros quadrados de laje por andar. Os andares da Previ estão alugados para a Telefônica hoje, tem 25 mil linhas telefônicas.

ISTOÉ – Há algum problema específico com a mídia?
Monteiro de Barros – O meu avô paterno, o sr. Antonio Monteiro de Barros, era um homem ilibadíssimo e era chamado no Estadão a flor do lodo. As famílias têm divergências há décadas. Vovô era ademarista e o Adhemar fechou o jornal na época do Getúlio.

ISTOÉ – E com o ministro Malan, o sr. teve contato?
Monteiro de Barros – Não. Para não dizer que não tive, eu cumprimentei ele umas três vezes, andando a pé de manhã em Brasília.

ISTOÉ – O Itagiba Souza de Toledo, ex-diretor-geral do TRT-SP, é um técnico capaz?
Monteiro de Barros – Todo o problema que surgiu no caso do TCU foi por causa desse senhor Itagiba. Ele é um sujeito que não dá para acreditar o que é desbocado. Mas não é desbocado por mal, é relaxado no modo de falar. Só para descrever quem é o Itagiba, conto esta passagem. O pessoal do TCU estava no TRT às dez horas da noite, tinha um prazo para acabar a auditoria e trabalhavam numa mesa grande, pedindo coisas para o Itagiba. Chegou uma hora em que o Itagiba entrou na sala e falou assim: “Puta que pariu, vocês me enchem o saco. Por que não pedem tudo de uma vez quando tem funcionário aí, porra? Eu vou ficar atrás de documento? Não vou é porra nenhuma, vão pra a puta que pariu.” Os caras fecharam o relatório, foram embora e mandaram uma pica para o tribunal desse tamanho, que nunca mais reverteu e acabou na demissão do Itagiba.

ISTOÉ – O sr. tem boa relação com o Andrea Matarazzo?
Monteiro de Barros – A gente se conhece a vida inteira. Ele foi muito gentil comigo, me mandou um bilhete dizendo que sentia muito o que estava ocorrendo. Foi uma manifestação de afeto pessoal e eu nunca tive constrangimento de telefonar para ele.

ISTOÉ – O governo está com medo de o Nicolau falar?
Monteiro de Barros – Eu acho que ele vai dizer que realmente bancou o Plano Real. Já pensou que o Eduardo Jorge ficou a noite inteira no telefone assim: “O senhor tem que desmanchar a greve de ônibus em São Paulo, o senhor tem que fazer com que a greve no porto de Santos dê reajuste zero, o tribunal tem que julgar a greve ilegal para entrar a polícia e desmontar.” E aí? No dia seguinte ele diz: “Agora você me ajuda”. Ele vai fazer o quê? É normal na vida. Eu vi eles terem reunião aqui e ele disse: “É uma questão de a gente segurar o País ou não. Se a gente quiser, quebra o País outra vez.” Por que o Antônio Carlos quer tirar o poder normativo da Justiça do Trabalho? Para tirar isso, mexer na indexação. Então existe um problema de perversidade do sistema muito grave e que é normal. Então não é de assustar porque ligaram. Era o canal do Planalto em São Paulo para entrar.

ISTOÉ – Qual é a fonte dessa gana do Giovanni Queiroz?
Monteiro de Barros – É o Odacyr Soares, é a história do tribunal lá. O que eu soube foi que a construtora que fazia o tribunal também construia a faculdade de Odacyr. Quando ia a verba para o tribunal, avançava a faculdade (risos). Eu falei: “Senador, racha o PL. Deixa São Paulo passar.” Ele falou: “Governo do PT não passa o meu.” Aí o Giovanni ficou louco porque dei uma força lá. Então sobrou no meu de tudo que é lado.

ISTOÉ – Qual é a fonte dessa gana do Giovanni Queiroz?
Monteiro de Barros
– É o Odacyr Soares, é a história do tribunal lá. O que eu soube foi que a construtora que fazia o tribunal também construia a faculdade de Odacyr. Quando ia a verba para o tribunal, avançava a faculdade (risos). Eu falei: “Senador, racha o PL. Deixa São Paulo passar.” Ele falou: “Governo do PT não passa o meu.” Aí o Giovanni ficou louco porque dei uma força lá. Então sobrou no meu de tudo que é lado.
 

ISTOÉ – E a gana do Di Gênio é por amizade?
Monteiro de Barros – Ele inclusive perdeu a mulher para o Luís Estevão. O Luís tem ódio dele e ele ódio do Luís. O cara não pode ver ninguém, caralho. Você lembra quando o Mário Garnero se ferrou? Foi problema de mulher. Ele pegou uma mulher do Dornelles, 20 anos antes. O Dornelles era apaixonado e quis foder o outro. É uma merda.

ISTOÉ – O sr. investigou o deputado Giovanni Queiroz?
Monteiro de Barros – Eu mandei investigar a vida dele, vi que ele era prefeito de uma cidade na época da revolução e que se licenciava da prefeitura para fazer contrabando para o lado de lá e voltava com droga ou ouro. Foi preso por contrabando, quando era prefeito e o assunto foi parar com o general Golbery, que o chamou e disse: “Muda de partido e eu libero.” Ele mudou de partido, veio para a situação e foi liberado.

ISTOÉ – O sr. conheceu o PC?
Monteiro de Barros – Não, nunca. Não, minto, uma vez no George V, em Paris, antes da posse do Collor. Eu estava tomando um chá no hall do George V e desceu um cara com uma boina dessas de Campos do Jordão, de tricô, uma coisa que não dá nem pra cumprimentar o filho da puta, de vergonha (risos). Ele era um brasileiro. Eu olhei e me disseram: “Esse que é o PC.” – “Você tá louco?” Aquela coisa de Campos do Jordão, de tricô.

ISTOÉ – O caso do prédio do Naya…
Monteiro de Barros – Eu vou te contar qual foi o problema do prédio do Sérgio Naya. Ele aprovou uma planta de dois prédios idênticos contíguos e mandou executar um e o outro depois. O que o cara fez? Na execução pôs a caixa d’água inteira. Os dois prédios estão aqui, a caixa d’água estava no projeto no centro dos dois. Como esse aqui foi feito muito depois daquele, a caixa ficou só nesse e aquela porra veio abaixo. E uma caixa d’água com zilhões de litros em cima de um prédio de 60 apartamentos é um peso monumental. Foi erro na execução. A maior cagada é mexerem num projeto quando se está executando.

ISTOÉ – Como se comportaram as pessoas diante do que lhe aconteceu?
Monteiro de Barros
– Precisava de uma testemunha de caráter. E peço ao Romeu Chap Chap para ser minha testemunha de caráter, porque eu estava preso, e ele: “Eu não sabia que eu tinha me associado com uma puta.” Ele é cagão e eu não gosto de cagão… Ele estava fodido, sem empresa, sem nada e foi lá, ganhou uma puta grana e não pode ser testemunha de caráter? Ah, vai tomar no cu. Em compensação há mais de dez depoimentos positivos, como o do dr. Eugênio Staub, um puta cara, que me ligou e disse: “O que você quer? Eu faço questão de lhe mandar uma carta para o juiz dando noção do seu caráter.”

ISTOÉ – O sr. se diz alvo de uma caça às bruxas.
Monteiro de Barros – Nós fomos execrados publicamente de uma maneira nunca vista. É um processo que há um ano e meio não sai da mídia. Coisas públicas, absolutamente legítimas, verdadeiras e claras, são apresentadas como se fossem uma novidade, como se tivessem descoberto a pólvora ontem. A escritura do prédio, lavrada em 1992, foi exibida pela imprensa como um troféu, quando é um documento absolutamente normal. Há uma série de equívocos na apresentação desse processo pela mídia, que gera uma monstruosa dúvida e uma profunda desinformação. Porque na verdade envolve os Três Poderes e nenhum deles assume claramente uma explicação. E dentro do Poder Judiciário envolve as instâncias de São Paulo e de Brasília. Brasília não se sente responsável – porque realmente não o é – e São Paulo tem uma divisão interna, a Justiça do Trabalho mais ou menos se aliou com o Ministério Público para tomar uma série de posições, como que dizendo: “Olha, a turma que está aqui hoje no tribunal não tem nada a ver com essa história do prédio; então o que vocês precisarem a gente ajuda.” Coisa que põe a União nos dois pólos do assunto, ela contra ela mesma. Então ficou uma série de mal-entendidos nisso.

ISTOÉ – Que mal-entendidos?
Monteiro de Barros – Temos uma empresa que trabalha no mercado imobiliário há 25 anos. Eu tenho 44 anos. Comecei a trabalhar com 18 anos, há mais de 20 anos, puxa vida. Fui diretor do nosso sindicato; sou vice-presidente da Federação do Comércio do Estado de São Paulo há várias gestões; havia sido eleito presidente da maior entidade internacional do mercado imobiliário que é a Fiabce. Renunciei antes de tomar posse em função desse problema. A Fiabce é uma entidade internacional do setor imobiliário, com assento na ONU. A gente tem um histórico no mercado. Entre comercialização, incorporação e construção já fizemos mais de 1,5 milhão de metros quadrados de área construída.

ISTOÉ – Os seus amigos como se comportaram nesse processo?
Monteiro de Barros
– Quando estive preso na Polícia Federal fui visitado por dezenas e dezenas de pessoas que, com todo o constrangimento da situação, foram, se dispuseram a ir lá. E quem não foi mandou carta, se manifestou.

ISTOÉ – O sr. guarda mágoas?
Monteiro de Barros
– Mágoa não, eu tenho um profundo desrespeito pelo presidente atual do tribunal, o juiz Floriano, porque acho que ele é um irresponsável com o dinheiro público, com a Nação, com a classe e com a instituição que ele preside. Durante mais de 15 anos, o tribunal pleiteou isso junto às instituições do governo, porque a centralização, por viabilizar a profissão dos advogados trabalhistas, que correm de um prédio para o outro, dava a condição mínima das partes terem audiência. Ele tomou o ato unilateral de rescindir intempestiva e covardemente, no dia seguinte, em que o presidente do Senado, Antônio Carlos Magalhães, esteve no prédio. No entanto, ele já estava no cargo há seis meses e tinha constituído uma comissão para apurar o assunto. E durante esse período ele não aceitou me receber nem uma vez, nem uma vez – o que é um ato de prevaricação dele. Ele tem a obrigação de receber o contratante, de saber qual é o problema. Ele foi além: quando rescindiu o contrato, permitiu que não se fizessem uma fiscalização e uma auditoria exatas para apurar os bens e o patrimônio que nós entregamos a eles, uma condição para verificar o que realmente estávamos entregando, até que ponto o empreendimento estava feito.

Os argumentos do empresário

Em 500 páginas de documentos, relatos e explicações, o empresário Fábio Monteiro de Barros Filho sustenta que a construção do prédio do Tribunal Regional do Trabalho (TRT), em São Paulo, ocorreu de forma regular e que foram feitos pelo menos 75% da obra, de acordo com avaliação do escritório de engenharia L.A. Falcão Bauer. Esse índice chegaria a 84%, caso sejam incluídos os materiais e equipamentos existentes nos almoxarifados próprios e nos depósitos dos fornecedores, ainda de acordo com a avaliação do escritório. Com 1.598 vagas de garagem em quatro subsolos e projetado para a circulação diária de até 15 mil pessoas, o prédio centralizará as sedes de todas as juntas da Justiça do Trabalho de São Paulo.

Um dos documentos da defesa de Monteiro de Barros é um parecer emitido pelo Tribunal de Contas da União (TCU), depois de uma auditoria sobre o processo de licitação vencido pela Incal. Realizada poucos meses depois de a Incal vencer a licitação para a construção do edifício, a auditoria ocorreu ainda em 1992. O preço foi considerado “aproximadamente de acordo com o custo médio dos edifícios da mostra”, afirma o parecer. Durante a auditoria, juristas teriam afirmado, também em pareceres, que o processo de licitação fora legal e que a escolha da Incal como vencedora era correta. Monteiro de Barros cita como autores desses pareceres os advogados e professores de Direito Miguel Reale, José Afonso da Silva, Toshio Mukai e Ives Gandra da Silva Martins. Alguns anos depois, em maio de 1996, o parecer foi levado à avaliação do plenário do TCU, o qual deliberou pela continuidade das obras.

O empresário afirma que o contrato assinado com o TRT tornou-se “excessivamente oneroso” para a construtora depois de algum tempo. A razão disso, diz ele, estaria principalmente no fato de o TRT atrasar os pagamentos, mas também pelas alterações que o contrato sofreu ao longo do tempo, incluindo aí a criação de “impostos e contribuições” e alterações na forma de reajuste do contrato. O atraso do pagamento explicaria o fato de o cronograma de construção não ter sido cumprido pela Incal, afirma o dono da construtora, negando assim que a obra tenha sido abandonada.

O próprio valor do montante recebido pela Incal é questionado por Monteiro de Barros. O valor apresentado pelo Ministério Público Federal, incluindo os pagamentos feitos até outubro de 1998, de R$ 206 milhões, estaria errado. Um ofício do Tribunal Superior do Trabalho, feito a pedido do TRT de São Paulo, apurou que o valor, até aquela data, era de R$ 159 milhões. O empresário diz ainda que a construtora teria “plenas condições” de entregar a obra conforme o contrato firmado. Isso não teria acontecido, diz ele, apenas por um motivo: a interrupção dos pagamentos devidos à Incal, determinada por uma liminar judicial. Monteiro de Barros acusa o presidente do TRT de São Paulo, juiz Floriano Vaz da Silva, de ter rescindido o contrato com a Incal de modo “arbitrário e unilateral”, o que teria acontecido, diz ele, “em seguida à visita ao prédio do senador Antônio Carlos Magalhães”.