Por muitos anos os ativistas pelos direitos humanos combateram a censura praticada por governos ditatoriais. Hoje, essa briga começa a se voltar para um espaço onde, paradoxalmente, a maior bandeira sempre foi a liberdade de expressão, a Internet. Eles defendem agora a privacidade dos mais de 150 milhões de pessoas de todo o mundo que transitam diariamente pela grande rede de computadores. Desde que a Internet passou a ser um espaço virtual de imenso potencial econômico, a privacidade deixou de ser um direito de seus usuários para se transformar em uma mercadoria valiosa. Sem saber, a grande maioria dos que trafegam na rede tem seus dados pessoais roubados silenciosamente por companhias que vendem esse tipo de informação. Reunidos na semana passada em Washington, na conferência anual da CFP – Computers, Freedom and Privacy (Computadores, Liberdade e Privacidade) esses ativistas reconheceram os dois lados da mesma moeda e pediram aos governos algum tipo de censura na Internet.

"Desde que um governo estabelece que um certo tipo de conteúdo é ilegal, ele precisa ter meios de localizar o autor desse conteúdo", declarou David Sobel, conselheiro da CFP. Segundo ele, os governos serão cada vez mais pressionados a encontrar e punir abusos na Internet. Inclusive as companhias que manipulam ou ganham dinheiro com as informações que trafegam na rede. São as que fazem o que os internautas chamam de datamining (garimpagem de dados). Elas conseguem recuperar toda a movimentação de um usuário pela Internet. Isso porque toda vez que você visita um site, busca informações ou fornece dados sobre suas preferências em troca de um programa gratuito na rede, seus passos ficam registrados lá. Para conhecer um pouco do seu perfil basta ter as ferramentas certas para saber por onde você andou e o que disse sobre si mesmo. Antecipando-se a uma discussão que promete esquentar muito nos próximos meses, alguns fabricantes estão intermediando a solução.

É o caso da Novell, uma das maiores fornecedoras mundiais de equipamentos e software para grandes redes. A companhia está testando o que ela chama de DigitalMe, uma carteira de identidade digital para o usuário da Internet, onde ele próprio define que tipo de informação quer deixar disponível. "O que dá grande controle ao usuário sobre seus dados pessoais ao navegar pelo ciberespaço", defende Richard Cameron, gerente de marketing da Novell no Brasil. O produto ainda não está disponível. A chamada versão beta está sendo testada por grupos financeiros internacionais, como os americanos Citigroup e FirstUSA.

Analistas que estudam a questão acreditam que, cedo ou tarde, será realmente impossível navegar pela Internet sem algum tipo de identidade. Como a tecnologia para isso já existe, o problema agora é definir uma legislação que a ampare. "Nossa identidade é certificada pela República Federativa do Brasil; a da Internet teria que ser bancada por alguém, talvez uma instituição financeira de renome internacional", argumenta Cameron. Outros acham que essa solução terá que necessariamente passar pelos governos. "Tenho a impressão que será preciso um acordo internacional como o que regulamenta a emissão de passaportes", disse o vice-presidente da Compaq mundial, Michael Capellas, durante visita ao Brasil na semana passada. Ele mesmo lembrou uma charge publicada certa vez na revista New Yorker, que mostrava um gato usando um computador e afirmando: "Na Internet ninguém sabe se você é um cachorro."


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