Sob o olhar atento de dois altos oficiais do Exército e com o Alcorão – livro sagrado do Islã – estendido sobre sua cabeça, a popular líder oposicionista Megawati Sukarnoputri prestou juramento no Parlamento na quinta-feira 21 como vice-presidente da Indonésia. Favorita até o dia anterior para ocupar a Presidência, Megawati foi surpreendentemente derrotada por outro dirigente da oposição, o líder islâmico moderado Abdurrahman Wahid, eleito presidente pela Assembléia Consultiva do Povo, uma espécie de colégio eleitoral, por uma diferença de 60 votos (373 a 313). Apesar disso, foi a eleição mais democrática já ocorrida na Indonésia. Em seu discurso de posse, a vice conclamou à unidade nacional para superar a herança de três décadas de ditadura do general Suharto. Prometeu também trabalhar ao lado do novo presidente: “A vitória do meu irmão Adburrahman Wahid é também minha vitória e felicidade. Eu estou plenamente convencida de que esta vitória é a vitória conjunta do povo deste país”, proclamou Megawati, que é filha do falecido presidente Sukarno, o pai-fundador da Indonésia independente, afastado do poder pelos militares em 1968.

Nos dias que precederam as eleições presidenciais, um furacão político deixou a Indonésia de ponta-cabeça. Na semana passada, depois de reconhecer a independência do Timor Leste, o Parlamento indonésio rejeitou a prestação de contas do presidente B. J. Habibie, sucessor de Suharto, minando sua candidatura à reeleição. Na segunda-feira 18, o general Wiranto, o todo-poderoso comandante das Forças Armadas, declinou da indicação a vice na chapa de Habibie. Em seguida, o partido do governo, o Golkar, retirou seu apoio ao presidente e indicou um candidato próprio, Akbar Tanjung. Na última hora, o Golkar acabou apoiando Wahid. Depois da eleição de Wahid, Wiranto e Akbar Tanjung desistiram de concorrer à vice-presidência, o que abriu caminho para que o novo presidente indicasse Megawati como vice. A eleição de Wahid e Megawati, os dois mais expressivos líderes da oposição à ditadura militar, foi o verdadeiro fim do regime de Suharto, 17 meses depois de sua queda.

Num primeiro momento, a derrota de Megawati deixou atônitos seus partidários, que esperavam vê-la na Presidência desde que o Partido Democrático da Indonésia – Luta (PDI-L) teve o maior número de votos – 34% – nas eleições parlamentares de junho. Na quarta-feira 20, dezenas de milhares de manifestantes tomaram as ruas de Jacarta. Três explosões deixaram dois mortos e 20 feridos.

Apesar de ficar com o prêmio de consolação, Megawati terá poderes bem mais amplos do que o que seria de se esperar de um cargo meramente cerimonial. Afinal, seu partido, o PDI-L, conquistou um terço das 500 cadeiras do Parlamento nas eleições de junho último. Além disso, o presidente Wahid, 59 anos, apesar de ser uma espertíssima raposa política, tem a saúde muito debilitada. Praticamente cego, ele também já sofreu dois ataques cardíacos em anos recentes e poucos acreditam que ele consiga cumprir todo o mandato de cinco anos. Caso seja impedido, Megawati assumirá seu lugar. O novo governo tem pela frente o desafio de enfrentar a mais grave crise econômica vivida pelo país, além de redefinição do papel dos militares, onipresentes na política indonésia desde a independência, em 1949.


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