A brilhante trajetória de Central do Brasil, que acumulou 41 prêmios ao redor do mundo, colocou como nunca o cinema brasileiro em destaque no cenário internacional. Resta saber, agora, se a nova safra de filmes terá a mesma sorte, mantendo em pé o prestígio de crítica e público. Apesar da crise que se anuncia no setor, só para este ano estão previstas 35 estréias. As grandes esperanças, claro, são as produções de grande orçamento. Uma das maiores apostas tupiniquins é em Orfeu, de Cacá Diegues, que estréia dia 23. Além da bela trilha sonora assinada por Caetano Veloso, o filme tem outros atrativos. Baseado na lendária peça de Vinicius de Moraes, Orfeu da Conceição, o enredo de R$ 7 milhões leva para as favelas cariocas o mito grego de Orfeu – interpretado por Toni Garrido, vocalista do grupo Cidade Negra –, que desce aos infernos para salvar sua amada Eurídice (Patrícia França). A história de amor e morte se passa durante os quatro dias de Carnaval, num cenário de violência e tráfico de drogas. Realidade bem diferente do Rio de Janeiro dos anos 50, quando o francês Marcel Camus adaptou para as telas de forma ingênua e folclórica o mesmo texto no filme Orfeu do Carnaval.

Tentar concorrer ao Oscar não está fora dos planos dos produtores, mas a participação de Orfeu em Cannes ou em qualquer outro festival foi descartada pela Warner Brothers, que distribui o filme. Os executivos da distribuidora americana acreditam que a obra de Camus – apesar de passadas quatro décadas – ainda está muito viva na lembrança das pessoas e a polêmica gerada no Exterior poderia ser ruim para a carreira do filme de Cacá no Brasil. Conquistar o mercado interno, aliás, é a grande preocupação de cineastas, distribuidores e produtores locais. José Carlos Avellar, diretor-presidente da Riofilme, acha que este objetivo é mais importante que o reconhecimento estrangeiro. "O filme que vai nos representar bem lá fora é o que nos representa bem aqui", afirma ele. Da mesma opinião é o cineasta Sérgio Rezende, que lança no segundo semestre Mauá, o imperador e o rei, estrelado por Paulo Betti.

Biografia – O diretor tem fé que Mauá, orçado em R$ 6 milhões, seguirá a trilha aberta por Guerra de Canudos, seu trabalho anterior, que atraiu 700 mil pessoas aos cinemas. Para tanto, evitou o que chama de "registro escolar" da biografia de Irineu Evangelista de Souza, o Visconde de Mauá (1813-89), construtor da primeira ferrovia nacional e maior fortuna do Império. "A história dele tem uma grande atualidade no que diz respeito aos conflitos da privatização, à ética nos negócios e à associação ao capital estrangeiro." Seguindo o filão do filme de época, só que sob a clave da comédia, O xangô de Baker street, de Miguel Faria Jr. – baseado no best seller de Jô Soares, que vendeu 420 mil exemplares no Brasil –, já desencadeia expectativas. Segundo o produtor Bruno Stroppiana, foram gastos R$ 10 milhões para contar a fictícia viagem ao Rio de Janeiro, em 1886, do detetive Sherlock Holmes – papel do ator português Joaquim de Almeida –, personagem criado pelo escocês Conan Doyle. Para solucionar o misterioso roubo de um violino Stradivarus, Holmes veio ao Brasil acompanhado do inseparável amigo John H. Watson (Anthony O’Donnel).

Igualmente baseado num romance de sucesso de Chico Buarque, o Estorvo de Ruy Guerra confirma a variedade de temas do cinema brasileiro atual. Mais intimista, segue a trajetória de um personagem sem nome, vivido pelo ator cubano Jorge Perugorría, que não se dá bem com ninguém e julga estar sendo perseguido. "Procurei ficar muito próximo do livro", afirma o diretor. "Como o próprio romance não situa lugares e os personagens não têm nomes, me senti à vontade para misturar cidades e idiomas."

Paixão – Em situação diversa, Luiz Carlos Barreto, produtor de Senhorita Simpson, do filho Bruno Barreto, fala da necessidade de os diretores brasileiros fazerem filmes sobre o País, com a maior autenticidade possível. "Quanto mais brasileiros eles forem, mais internacionais serão", diz o Barreto pai, que inclui neste balaio Senhorita Simpson, comédia romântica passada no Rio de Janeiro, que narra a paixão da americana Mary Ann (Amy Irving, a ex de Steven Spielberg e atual mulher de Bruno Barreto) pelo advogado Pedro Paulo (Antonio Fagundes), seu aluno. Com distribuição no Brasil e nos Estados Unidos – onde ganhará o título de Bossa nova –, o filme, que custou R$ 7 milhões, é um dos que têm chances de galgar carreira no Exterior. Mas depois de amargar duas derrotas no Oscar como produtor de O quatrilho e O que é isso, companheiro?, Barretão não pretende pisar de novo naquele tapete vermelho do Dorothy Chandler Pavilion. "Não temos projetos de festivais, nem estamos pensando no Oscar. Nosso primeiro objetivo é o mercado." Acredite se quiser.