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Embora não seja católico praticante, o novo advogado-geral da União, Luís Inácio Lucena Adams, manteve o crucifixo de madeira pregado na parede do amplo gabinete, no terceiro andar do prédio da Advocacia-Geral da União (AGU). É uma herança de José Antônio Toffoli. Mas não a única. Também jovem, aos 44 anos, o ministro Adams, a exemplo de seu antecessor, faz juras de fidelidade ao governo Lula. Em entrevista à ISTOÉ, Adams falou sem rodeios e acabou com a dúvida de quem acreditava que ele não mergulharia de cabeça para defender o presidente no ano eleitoral. “A AGU tem um cliente e esse cliente é o governo”, afirmou o ministro, primeiro titular da AGU egresso dos quadros do próprio órgão. Com o foco bem definido, Adams, que é chamado de Lula pelos amigos, diz que o seu xará tem o direito de inaugurar todas as obras que puder pelo País. Quanto às acusações de campanha antecipada, Adams derruba-as com um argumento técnico:
“A lei eleitoral é genérica e de difícil compreensão.”

ISTOÉ – Nos corredores da AGU, comenta-se que o sr. será uma espécie de pit bull do Planalto. Que vai agir rápido e não deixará nenhuma ação contra o governo passar em branco. É isso mesmo?

Luís Inácio Lucena Adams – Temos que ter uma atitude de resolver problemas, e não de postergá-los. Sou servidor público, filho de servidores e uma coisa que eu vejo na máquina pública é a ausência de solução. O Estado tem que se organizar de uma forma transparente e funcional, que não seja prejudicial à própria sociedade.

ISTOÉ – O sr. defendeu as viagens do presidente Lula pelo País, com a ministra Dilma a tiracolo. A campanha eleitoral antecipada não é prejudicial?

Adams – O presidente fez o acompanhamento da obra. Foi um fato administrativo. No caso do rio São Francisco, era até necessário porque a transposição gerou um tal nível de comoção que o Frei (Luiz Flávio Cappi) fez greve de fome. A visita do presidente é uma forma de comunicação com a sociedade até para justificar a razoabilidade da obra.

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ISTOÉ – A divergência entre o sr. e o presidente do STF, Gilmar Mendes, sobre esse assunto mostra que há um conflito de opiniões.

Adams – O conflito é natural. Mas acho que isso faz parte do processo eleitoral. Está em disputa a Presidência do País. Então, vejo que esse processo vai ser de fato disputado, o debate será exacerbado, os eventos serão questionados, até porque tem muitas regras e vedações. A própria lei eleitoral é genérica. Tem uma generalidade de difícil compreensão, que precisa ter um acompanhamento melhor.
É difícil entender a lei eleitoral.

ISTOÉ – O TSE terá condições de fazer valer uma lei genérica? Adams – O TSE é sério, independente e tem aplicado a legislação de maneira muito correta e cuidadosa. De um lado para preservar a isonomia, e de outro para não esterilizar o debate político. Não tenho grandes preocupações. O presidente Lula é um político muito experiente. Ele já participou de vários processos eleitorais e saberá como conduzir esse sem ferir a legislação.

ISTOÉ – Seus antecessores se esforçavam para dizer que a AGU era um órgão de Estado. Qual é, de fato, o papel da AGU?

“No TCU, há casos
em que se privilegia a forma
em detrimento do conteúdo”

Adams – Concebo a AGU como advocacia. E não existe advogado sem cliente. Advogado sem cliente é magistrado. Nosso cliente primeiro é o Estado, mas o Estado existe como uma figura etérea. Então, nosso cliente é o governo concreto eleito.

ISTOÉ – É esse foco que conduz a AGU a entrar de cabeça na disputa entre o presidente Lula e o Tribunal de Contas da União?

Adams – O TCU trabalha com parâmetros padrões em obras especializadas; então é natural que os preços sejam diferentes. Mas até o tribunal entender isso, a obra fica parada dois, três, quatro, cinco meses. Uma obra paralisada por um ano é uma obra que deixa de ser entregue à sociedade. A paralisação gera um custo de várias ordens. Do operário que não trabalhou, mas recebeu.O maquinário que ficou parado. Os insumos que subiram de preço. E esse custo a empresa vem cobrar do Estado, porque evidentemente ela não é responsável por esse custo.

“O presidente é experiente
e saberá conduzir o processo
eleitoral sem ferir a lei”

Luís Inácio Adams, ministro-chefe da AGU

ISTOÉ – O sr. fala como se o TCU resolvesse paralisar as obras por capricho. Mas eles agem, em muitos casos, para evitar o superfaturamento de preços.

Adams – Nem sempre. No TCU, há casos em que se privilegia a forma em detrimento do conteúdo. Essas dinâmicas, esses conflitos que muitas vezes são laterais às obras geram um custo que é pago pela sociedade.


ISTOÉ – O TCU deveria trabalhar mais em sintonia com as realidades locais?

Adams – É isso mesmo. E mais sintonizado com as realidades de gestão. O processo é bastante formalizado para garantir transparência, equilíbrio, mas a formalidade exacerbada tem um efeito contrário. Todo mundo compreende que a fiscalização é necessária. Mas o controle, se exercido excessivamente, amarra a obra.

ISTOÉ – A AGU pode, então, ser o órgão que faltava ao governo para destravar as obras?

Adams – Temos avançado bastante nas conciliações. No ano passado, resolvemos 76 casos que envolveram R$ 3,2 bilhões. É uma novidade crescente. As Câmaras de Compensação da AGU passaram a privilegiar o conteúdo, minimizando a forma. Isso ocorre porque muitas das tensões estão dentro da própria administração pública. É a Aneel que defende a construção de uma hidrelétrica e o Ibama que quer mais estudos ambientais, por exemplo. Nós temos escritórios em todas as agências, procuradorias, ministérios, autarquias, até no TCU. Nós temos que procurar um equilíbrio entre as necessidades de controle, da transparência e do resultado.


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