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RISCO
Hoje a mulher tem uma vida social intensa. E, em
algumas situações, bebe mais que os homens

Juliana Silva começou a beber aos 16 anos. Solitária, a paulistana encontrou na pinga com refrigerante o alento que buscava. Em menos de um ano, porém, a mesma bebida que parecia lhe trazer conforto se transformou em vício. Juliana virou alcoólatra. Não era incomum que chegasse em casa às quatro horas da manhã sem se lembrar do que tinha feito na noite anterior. Foram oito anos de bebedeira até procurar ajuda. Hoje, com 26 anos, depois de dois anos de tratamento intensivo no Alcoólicos Anônimos, ela se sente curada. “Mas o cuidado com a bebida vai ser para sempre”, afirma. A história de Juliana é um exemplo doloroso do crescimento do alcoolismo entre as mulheres, um drama que cresce sem freio, mas que continua sem receber o cuidado devido no Brasil.

Em levantamento apresentado na última semana, a Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) deu uma dimensão do tamanho do problema e de seu aumento. No estudo, que analisou variações entre 2006 e 2012, ficou comprovada uma elevação de 36% no número de mulheres (particularmente as mais jovens) que praticam o que os especialistas chamam de “binge” – a ingestão de pelo menos quatro doses de álcool em menos de duas horas. Foi um crescimento maior do que o registrado entre os homens que bebem dessa maneira, que ficou em 29,4%. Quando o binge vira hábito, o caminho está aberto para a dependência. “E ainda não temos uma política sequer de controle do alcoolismo para a mulher”, diz Ronaldo Laranjeira, professor de psiquiatria da Unifesp, diretor do levantamento e uma das maiores autoridades no assunto do País. “Hoje, a única ação de desestímulo ao álcool no Brasil é a ‘se beber, não dirija’”, afirma.

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Ignorar o problema ou tratá-lo apenas como um apêndice da grande questão que é o abuso do álcool no Brasil é um engano. Só as especificidades do corpo feminino (leia quadro) já justificariam um protocolo e uma atenção diferentes. “As mulheres têm necessidades e carências muito peculiares”, explica a psicóloga Raquel Barros, fundadora da ONG Lua Nova, uma exceção no panorama brasileiro. A entidade tem financiamento da Secretaria Nacional Antidrogas para prover assistência exclusiva a mulheres. A ajuda se estende a familiares e filhos. A ong atualmente atende oito Estados e planeja expansão para outras capitais e criação de centros de atendimento junto ao Ministério da Saúde. Espera-se que, com a situação exposta pela pesquisa da Unifesp, as carências sejam finalmente suplantadas em larga escala.

Fonte: Ronaldo Laranjeira, professor titular de psiquiatria da Unifesp e diretor do Levantamento Nacional de Álcool e Drogas (2006-2012)