Publicamente o presidente não quer briga com o governador de Minas Gerais, Itamar Franco. Mas já trabalha para que ele chegue isolado à reunião dos governadores de todo o País, programada para março. Já na terça-feira 19, dia seguinte à reunião em Minas, o governador de Mato Grosso do Sul, Zeca do PT, foi recebido em Brasília. No mesmo dia, Fernando Henrique abriu as portas do Palácio para o socialista Ronaldo Lessa, de Alagoas. Na quinta-feira foi a vez do governador Jorge Viana (PT). A estratégia é atender a cada Estado isoladamente e, ao mesmo tempo, demonstrar sua irritação com a moratória mineira. "O Itamar tomou uma atitude precipitada. Por que ele não me ligou?", queixa-se FHC nessas conversas. Ele explicou aos governadores que enquanto durar o terremoto econômico, não pode falar em renegociação. Mas, como ninguém é de ferro, o presidente sinalizou com uma alternativa para os governos estaduais encalacrados: socorrer os que estiverem dispostos a privatizar suas estatais com a reabertura da linha de financiamento do BNDES. Aí, mais uma vez, o governador mineiro ficará de fora, pois declarou que não continuará o programa de privatizações de seu antecessor.

O encontro com a comissão de governadores formada em Belo Horizonte – Anthony Garotinho, do Rio de Janeiro, Olívio Dutra, do Rio Grande do Sul, e Lessa – já foi descartado pelos assessores do presidente. Como FHC não sabe dizer não, para Jorge Viana admitiu a possibilidade do encontro. O presidente teme a repercussão no mercado de um entendimento com os adversários. "Se der um sorriso posso comprometer os títulos brasileiros", disse FHC. Ele agradeceu a posição comedida dos governadores, em especial os do PT, que se recusaram a anunciar a moratória conjunta. Até mesmo Garotinho tem sido elogiado pelo presidente. Em Minas, o carioca fez um dos discursos mais duros contra o governo federal, mas vez por outra troca telefonemas com o presidente em tom conciliatório. Traduzido para o futebol, Garotinho, flamenguista roxo, conseguiu usar uma camisa meio rubro-negra, meio Fluminense, no clássico Fla-Flu, na reabertura do Maracanã.

Se FHC acenou com os créditos do BNDES, o ministro da Fazenda, Pedro Malan, engrossou. Distribuiu uma nota onde informava que adotou as seguintes providências: prevenir os organismos internacionais sobre o risco de inadimplência de Minas e do Rio Grande do Sul, que entraram na Justiça contra a União; suspender o envio ao Senado de projetos para os dois Estados com negociação já concluída; e negar a aprovação de novos projetos que estavam na Comissão de Financiamentos Externos. Uma retaliação de quase US$ 1 bilhão.

 

A vez dos prefeitos Enquanto o presidente acenava com uma alternativa camuflada para os governadores, foi a vez de os prefeitos começarem a reclamar. O rombo no cofre das prefeituras é de quase R$ 20 bilhões. Mais da metade, R$ 11 bilhões, refere-se às dívidas da cidade de São Paulo, sendo R$ 7,6 bilhões em títulos públicos, corrigidos por juros de mercado. "O que nos causa mais preocupação é a mudança nas taxas de juros, que aumentou as despesas mensais do município em R$ 4 milhões", afirma o prefeito Celso Pitta (PPB), que sonha baixar os juros para 6%. Na tentativa de realizar o desejo, Pitta acaba de juntar-se aos 14 municípios mais industrializados do Estado, formando um grupo auto-intitulado de G-15. Na mira do grupo está a proposta de reforma tributária do governo federal, especialmente as mudanças nas regras de cobrança do ICMS. "A política atual do governo é repassar encargos e retirar receitas das prefeituras", reclama o prefeito Gilson Menezes (PSB), de Diadema, onde o G-15 se reuniu na última quarta-feira. Desde maio do ano passado, quando os prefeitos manifestaram-se em massa em Brasília, a mesma queixa vem sendo repetida nos mais diversos pontos do País. "O que os municípios estão reivindicando não é tanto a renegociação das dívidas, mas a demarcação explícita de qual é a nossa competência e quais são os tributos a que temos direito", diz Raul Pont (PT), prefeito de Porto Alegre, que integra a Frente Nacional dos Prefeitos (FNP). Como os governadores de oposição, os prefeitos também agendam uma ida a Brasília. Só que, mais uma vez, em tom de manifestação.