Assista a trechos de longas com e sem o “milagre” dos efeitos:

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MAR REVOLTO
Cena de "As Aventuras de Pi" (acima) e a parafernália usada para simular uma
tempestade no oceano: a empresa Rhythm & Hues, responsável pelo efeito, fechou as portas

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É difícil não sair do cinema maravilhado com o visual do filme “As Aventuras de Pi”, especialmente sabendo que grande parte desse fascínio se deve ao uso criativo dos efeitos especiais. Essa é uma das razões de o longa-metragem ganhador de quatro Oscar já ter faturado US$ 600 milhões ao redor do mundo. No entanto, a empresa Rhythm & Hues, que criou tempestades oceânicas, seres fantásticos e o inacreditável tigre digital que divide o barco com um garoto, acaba de pedir concordata na Justiça. Antes dela, outras três empresas hollywoodianas encerraram suas atividades ou foram vendidas para outros países. No momento em que as conquistas da computação gráfica se firmam como um dos recursos mais usados na indústria do cinema, esse segmento da grande fábrica de entretenimento entra em crise.

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É a falência dos magos dos efeitos especiais.
A explicação para esse cenário tem razões precisas. A primeira delas é que criar paisagens imaginárias ou seres inexistentes por meio de ferramentas gráficas demanda horas e horas diante de um computador, sem falar das somas investidas em pesquisa e experimentação. Ou seja: é uma atividade cara. Ela está inflacionando o orçamento de blockbusters, o que implica estratégia de marketing mais agressiva. Isso, por sua vez, encarece mais ainda a produção, numa espiral de gastos. Como a maioria das empresas digitais é independente – apenas prestam serviços para as majors –, a solução encontrada por Hollywood foi tentar barrar tais custos incentivando a concorrência entre elas. Outra saída foi obrigá-las a abrir filiais em países onde a produção de filmes recebe subsídios estatais – o Canadá, por exemplo, oferece incentivos para obras filmadas na cidade de Vancouver. Endividadas, as empresas não conseguem manter os compromissos.

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TREM FANTASMA
A estação parisiense de "A Invenção de Hugo Cabret" (abaixo) foi criada com uso
do fundo verde. Crédito para a empresa Matte World Digital, que faliu em agosto de 2012

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Efeitos especiais existem há tempo no cinema, mas o seu aperfeiçoamento e uso frequente, a ponto de determinar o sucesso de uma produção, é bem mais recente. Eles não são utilizados apenas em filmes de ação: mesmo biografias como “Lincoln” ou dramas de guerra como “A Hora mais Escura” valem-se de truques. Em muitas cenas, o ex-presidente americano vivido por Daniel Day-Lewis atua diante de uma parede verde, mais tarde preenchida com cenários. Na sequência da invasão da residência de Osama Bin Laden no filme de Kathryn Bigelow, veem-se os famosos helicópteros Black Hawk. Mas eles não foram usados nas filmagens, são digitalizados. A importância dos efeitos na atração de público tem um termômetro infalível, a relação dos filmes mais vistos no mundo: os 20 primeiros usam e abusam desses recursos e não teriam sido possíveis sem essa “grande magia”. É o caso de “Avatar”, o mais assistido da história, com renda de US$ 2,7 bilhões. Seu diretor, James Cameron, só conseguiu levar o projeto adiante depois da existência da técnica “motion capture”, quando se grava um movimento por meio de pontos luminosos no corpo de um ator e, com isso, se criam personagens virtuais – caso dos seres azuis do planeta Pandora. Surpreendentemente, é o próprio Cameron quem diz: “Trabalhar com efeitos especiais é um péssimo negócio.”

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Cameron é calejado no assunto: ele era um dos sócios da Digital Domain, que declarou falência após um calote de US$ 35 milhões. E aqui não se fala de uma grife qualquer: a DDMG tinha três Oscar, dados aos filmes “Titanic”, “O Curioso Caso de Benjamin Button” e “Amor Além da Vida”. Ela foi comprada por um consórcio envolvendo estúdios da China e da Índia. A globalização do cinema é justamente a outra ponta da crise enfrentada pelos magos hollywoodianos. Para atrair produções, países asiáticos e do Leste Europeu oferecem facilidades para as produtoras americanas e, na ambição de conquistar mercados e know-how, juntam no pacote a mão de obra mais barata. Foi diante desse cenário que a crise do setor mostrou a sua cara na mais recente entrega do Oscar: enquanto o vencedor do prêmio, por “As Aventuras de Pi”, tinha o discurso interrompido pela trilha sonora de “Tubarão”, fora do teatro cerca de 500 técnicos de efeitos especiais protestavam contra as demissões, salários atrasados e falências de suas firmas. Esse mau momento não é percebido nos filmes, que continuam visualmente impecáveis. Mas, ao que tudo indica, no futuro os blockbusters hollywoodianos poderão não vir mais com o carimbo “made in USA”.


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