"Se todos os chineses batessem os pés juntos, a terra tremeria.” A frase dita certa vez pelo líder comunista Mao Tsé-tung tinha o intuito de chamar a atenção para o gigantismo e o poder de mobilização dos chineses. Durante os 40 anos que ficou no poder na República Popular da China, até 1976, Mao não conseguiu realizar sua própria profecia. Bastou incorporar elementos do capitalismo para que o maior país comunista do planeta estremecesse a economia mundial: a China é hoje a economia que mais cresce no globo, a uma taxa média anual de 9%, e gira em torno de US$ 1,5 trilhão – podendo subir para quase US$ 5 trilhões se for levado em consideração o poder de compra de sua população. É atrás dessa pujança econômica que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e uma comitiva de 200 empresários brasileiros vão atrás em maio próximo. A viagem está sintonizada com os interesses do governo chinês, que vem pondo em prática a estratégia de atrair investimentos externos. Como se diz em mandarim, o dinheiro de fora é huan ying, ou seja, bem-vindo. “A China é o maior canteiro de obras do mundo”, compara o presidente da Câmara de Comércio e Indústria Brasil-China, Tang Kai Chien, apostando que, ainda nesta década, o PIB chinês deverá superar o americano.

Todo comentário em relação à China envolve cifras superlativas. Não bastasse as taxas de crescimento vertiginosas, o país é o maior mercado consumidor do planeta: são 1,3 bilhão de pessoas ávidas por comprar. Desde produtos tradicionais, como a soja, até aqueles de maior valor agregado, como aviões, o Brasil só tem a lucrar com os renminbi, a moeda chinesa. Ao desembarcar em Pequim entre os dias 23 e 26 de maio, a comitiva brasileira estará criando um marco na história das relações comerciais entre os dois países. Foi em 2000 que o Brasil descobriu o potencial econômico da China e os inúmeros mercados a serem explorados. Só que bem antes disso os ventos capitalistas já tinham despertado o gigante chinês. Deng Xiaoping, sucessor de Mao, iniciou o caminho das reformas econômicas, ao mesmo tempo que propiciava a abertura do país aos investimentos estrangeiros. Era final dos anos 70. Num período de 20 anos, de 1978 a 1998, a renda anual per capita chinesa pulou de US$ 45 para US$ 770.

Cobiçada pelas economias ricas e também pelas emergentes mundo afora, a próxima potência mundial carece de tudo um pouco. Só que para explorar comercialmente aquele país é preciso aprender a conviver num mundo que vive dividido, com um pé no futuro e dois no passado. Além de ter de romper a maior muralha que separa o Brasil da cultura da China: o mandarim, o idioma oficial.

A professora Yuan Aiping, uma chinesa que mora no Brasil há sete anos, anda dispensando alunos. Até seus fins de semana são dedicados ao ensino de mandarim. Tão ou mais difícil de aprender a língua é conviver com a diferença de costumes e dominar uma das tradições mais caras aos chineses, o guanxi, que é o apreço pelo bom relacionamento pessoal. “Os chineses adoram falar de assuntos alheios aos negócios. É a forma que eles encontram para estreitar o relacionamento com o futuro parceiro comercial”, testemunha o diretor comercial de minério de ferro da Vale do Rio Doce, Nelson Silva, ressaltando que assuntos de família e gostos pessoais são bem-vindos à mesa de negócios.

“Como os chineses adoram karaokê, aprendi a cantar Yue Liang Daí Bia Wo De, uma espécie de Carinhoso da música popular chinesa. Todo esse meu esforço foi recompensado. Os chineses ficaram mais confiantes na relação”, lembra o empresário Rodrigo Borosia, da Interglobal. Ele importa látex natural para travesseiros e colchões, desde 2000. Já fez cinco viagens para a China e só depois da terceira é que decidiu estudar mandarim. De tanto viajar para aquele lado do globo terrestre, o empresário já usa com destreza o heizi (pauzinhos) na hora das refeições, come gafanhoto, minhoca, camarão vivo, cobra e cachorro, saboreando-os como iguarias, e até consegue expressar-se em mandarim.

Petrobras, Companhia Vale do Rio Doce, Embraer, Embraco (Empresa Brasileira de Compressores) e Marcopolo são algumas das 1.635 empresas brasileiras que já estão operando na China, além de escritórios de advocacia. Como as previsões indicam que o futuro é mesmo oriental, nada mais lógico que o mandarim venha se impondo no mundo dos negócios. Os comunistas chineses, quem diria, andam ensinando ao mundo globalizado como tirar o melhor proveito do capitalismo.