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“Os países desenvolvidos devem assumir, individualmente ou juntos, o compromisso legal de reduzir as emissões até 2020, partindo dos níveis de 1990. Os esforços das nações desenvolvidas devem ser comparáveis, mensuráveis e precisam levar em conta as circunstâncias nacionais e a responsabilidade histórica.” O texto é um trecho do primeiro documento oficial divulgado pela organização da Conferência Mundial do Clima da ONU (COP15), na manhã da sexta-feira 11. E a cobrança não para por aí: “Os países em desenvolvimento devem adotar ações nacionais de combate ao aquecimento global, viáveis por meio de financiamento, tecnologia e capacidade de criação provida pelas nações desenvolvidas.” Aparentemente, tudo que o bloco liderado pelo Brasil gostaria de ouvir. Ou não.

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A grande questão em torno do texto, concebido para servir de base para as discussões desta semana, é a sua falta de objetividade. Ao dividir as responsabilidades entre o bloco dos países poderosos e as nações em desenvolvimento, ele basicamente diz o que todos querem ouvir. Assinado pelo maltês Michael Zammit Cutajar, líder do painel de discussões sobre as medidas de longo prazo a serem tomadas por todas as nações, o documento ainda comete o pecado da imprecisão. Quando trata da porcentagem de redução na emissão de gases-estufa, ele apresenta números entre colchetes – em aberto, portanto –, que variam entre 25% e 40% para os mais ricos e entre 15% e 30% para os mais pobres. E sugere que as metas estabelecidas pelo Protocolo de Kyoto em 1997 (válidas até 2012) devem continuar a ser a principal referência para o tão aguardado novo acordo internacional.

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Segundo Celso Amorim, ministro das Relações Exteriores, os primeiros diálogos da COP15 foram extremamente conservadores. “Acho que a posição do Brasil motivou outros países que não haviam apresentado números, como China, Índia e Estados Unidos. Depois que apresentamos, eles fizeram o mesmo. Não podemos aceitar que os países ricos se exonerem da responsabilidade. Eles estão pegando carona na proposta americana por oportunismo, já que sabem que os Estados Unidos dificilmente poderão assumir uma meta semelhante à de Kyoto. No mais, é jogo de cena”, disse o ministro em entrevista a emissoras de rádio na quinta-feira 11.

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Não dá para negar que o tom do primeiro documento oficial da conferência é de conciliação. Com as propostas de China, Estados Unidos, Brasil e boa parte dos participantes em mãos, os dirigentes da reunião avaliaram cenários e propostas para tentar estabelecer um ponto de partida para as discussões da última e decisiva semana do encontro. Só resta saber se o clima sonolento das primeiras reuniões da COP15 mudará radicalmente depois da chegada de seus protagonistas à Dinamarca. Várias das fotos feitas entre a segunda-feira 7 e a sexta-feira 11 mostram delegados aos bocejos nos auditórios do complexo Bella Center. Péssimo sinal.

De passagem pela Europa, onde foi receber o Prêmio Nobel da Paz, na Noruega, Barack Obama passou longe de Copenhague. Angela Merkel, Nicolas Sarkozy, Silvio Berlusconi e outros líderes fizeram o mesmo, mas prometem presença nos próximos dias. Já a delegação brasileira deve chegar ao palco das discussões aos poucos. Segundo o Itamaraty, a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, líder do grupo, deveria chegar à COP15 na segunda-feira 14. Dois dias depois, seria a vez do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. De fato, os dias decisivos, a serem acompanhados por bilhões de pessoas, serão os últimos do encontro, que acaba na sexta-feira 18.

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Se os políticos ainda estão em ritmo lento, os ativistas tomaram Copenhague de assalto logo no início da conferência. Relatos dão conta de que o clima na cidade é uma mistura de euforia e protesto. A delegação de Tuvalu, uma pequena ilha-estado localizada no Oceano Pacífico, fez barulho na quinta-feira 10. Uma das vítimas mais visíveis do aquecimento global, Tuvalu é dona de um território com altitude média de apenas um metro, que já está sendo engolido pelas águas graças ao aumento no nível dos oceanos. Um dos membros da Aliança dos Pequenos Países-Ilha Aosis, na sigla em inglês, grupo de 43 nações como as ilhas Cook, Barbados e Fiji, além de países pobres da África, como Serra Leoa, Senegal e Cabo Verde, a delegação de Tuvalu conseguiu suspender as negociações no Bella Center por alguns minutos com seus protestos.

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Nas ruas de Copenhague, militantes de todo tipo de causa ambiental podem ser encontrados facilmente. Manifestações pacíficas e exaltadas, além de intervenções artísticas, ganharam destaque na imprensa internacional ao longo de toda a semana passada. Na sexta-feira 11, o centro da cidade foi tomado por policiais. Eles foram convocados para conter os ânimos dos participantes de uma manifestação marcada para o dia seguinte. Segundo previsões das autoridades, cerca de 80 mil ativistas deveriam participar de uma marcha de seis quilômetros. Eles sairiam do castelo de Christianborg, onde fica o Parlamento dinamarquês, e iriam até a sede da COP15, no centro da cidade. A princípio pacífico, o protesto teria angariado a adesão de grupos de extrema esquerda, aumentando em muito o risco de causar o caos em Copenhague.

Seja como for, todos sabem que, muito provavelmente, o mundo está diante de uma das últimas oportunidades de conter o avanço do aquecimento global. Se o objetivo da ONU for atingido ao final desta semana, poderemos ter a chance de limitar o aumento da temperatura média global em 2ºC até o final deste século. Infelizmente, nem esse número seria suficiente para mudar a situação dos pouco mais de 12 mil habitantes da pequena Tuvalu. Para impedir que as águas cubram seu território, o planeta não poderia ficar sequer 1,5ºC mais quente até o ano 2100. Para eles, de certa forma, o mundo já acabou.