PAULOLIMA-ABRE-IE.jpg
O pequeno Getúlio Vargas, do alto de seus 1,60 m, era personagem recorrente nas páginas de
“O Cruzeiro”

A intrigante imagem de Getúlio Vargas que ilustra a coluna foi extraída de uma das mais impactantes obras já produzidas sobre a fotografia e, em especial, o fotojornalismo no Brasil.

“As Origens do Fotojornalismo no Brasil: um Olhar sobre ‘O Cruzeiro’ (1940-1960)”, um livro-catálogo da exposição de mesmo nome em cartaz no Instituto Moreira Salles de São Paulo, até 31 de março, é obrigatório para quem tiver o mais remoto interesse em entender um pouco mais claramente o que era este país no século passado. E por que é o que é neste.

“O Cruzeiro” foi lançada em 1928 pela empresa do lendário Assis Chateaubriand, os Diários Associados.

A revista de variedades que circulava semanal e nacionalmente é tida até hoje como um dos maiores fenômenos de comunicação de massa da história do Brasil. Uma das mais poderosas armas para conquistar essa posição, só passou a ser utilizada em 1940,em boa medida pela influência do sucesso de publicações estrangeiras como “Life” e “Match” (depois “Paris Match”) entre outras: o fotojornalismo.
O time escalado pela publicação corresponde a uma verdadeira academia de notáveis, o tronco da robusta árvore genealógica da nossa fotorreportagem, que ramifica hoje em todos os cantos do País. Jean Manzon, José Medeiros, Peter Scheier, Henri Ballot, Pierre Verger, Marcel Gautherot, Luciano Carneiro, Salomão Scliar, Indalécio Wanderley, Ed Keffel, Roberto Maia, Mário de Moraes, Eugênio Silva, Carlos Moskovics, Flávio Damm e Luiz Carlos Barreto eram as estrelas que riscavam o mapa atrás de registros belos, originais e vendedores para alimentar o império de Chatô e a curiosidade de uma nação que começava a se conhecer.

As imagens reunidas no livro mostram de festas luxuosas e desfiles de moda à descoberta de tribos indígenas isoladas no Brasil central. Vão das inevitáveis obras de Brasília a flagrantes das praias cariocas nos anos 40 e retratos de artistas, atletas e políticos daquele miolo de século. Dificílimo destacar apenas uma delas capaz de resumir a história da revista, do fotojornalismo e até mesmo do livro e da exposição em tela. A escolha do close de Vargas se explica não só pela qualidade quase exagerada da fotografia, mas pelo papel que o retratado exerceu na história da publicação, que oscilava entre o de grande facilitador de seu financiamento, beneficiário político, desafeto e vítima de suas páginas, conforme os humores e os negócios do momento.

Se nossos milhares de milionários e dúzias de bilionários não se animam a emular os gestos de Warren Buffett e de Bill Gates, que segundo consta doaram a parte majoritária de suas fortunas para entidades que tratarão de fazer a riqueza acumulada voltar a circular e se espalhar por aí, bem que podiam ao menos seguir o exemplo do banqueiro e ex-embaixador Walther Moreira Salles, que, em 1992, ainda em vida, fundou a entidade que carrega o nome de sua família com recursos e bens próprios e garantiu através dela e deles a perpetuação de uma das mais notáveis iniciativas do setor cultural brasileiro, responsável por resgatar, armazenar, catalogar, publicar e compartilhar nada menos que 100 mil músicas, 550 mil fotografias, 2.700 peças de artes visuais e ainda acervos pessoais de figuras do peso de Paulo Mendes Campos, Carlos Drummond de Andrade e Otto Lara Resende. Uma espécie de bunker na batalha pela preservação e pela democratização da cultura no Brasil.

Foto: Jean Manzon/CEPAR Consultoria