“Acada dia resta um pouco menos de mim mesma.” A frase de Ingrid Betancourt resume o perverso cotidiano da ex-senadora, refém há mais de seis anos das Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia). Escrita em outubro de 2007, a mensagem tornou-se ainda mais dramática na semana passada, quando a guerrilha rechaçou como “não procedente” a mobilização internacional pela libertação de Ingrid. O retrato desolador de Ingrid no cativeiro faz parte do livro Cartas à mãe – direto do inferno, publicado no Brasil pela editora Agir, cujo texto principal é uma longa mensagem enviada à sua mãe, Yolanda Pulecio. Em 12 páginas manuscritas, Ingrid descreveu sua vida como prisioneira das Farc. A disposição inicial para enfrentar a adversidade, que a levou a improvisar aparelhos para fazer ginástica e a nadar em rios, havia cedido lugar ao desânimo. “Estou fraca, friorenta, pareço um gato diante da água”, diz.

Por conta da debilidade física, ela precisou queimar quatro cadernos com seus escritos, pois eles se tornaram um fardo muito pesado nos deslocamentos pela selva. Mesmo assim, ainda comemora o aniversário da mãe e dos filhos. No começo, fazia um bolo e cantava Happy birthday. De três anos para cá, não obteve mais permissão para a comemoração particular. “Eu não ligo”, diz. “Se eles chegam com um pão seco ou a rotineira ração de arroz e feijão, imagino que é um bolo e festejo seu aniversário no meu coração.” Ingrid também deixa claro como as mensagens dos familiares, transmitidas por programas de rádio, injetam ânimo entre os prisioneiros da guerrilha. Diante desse quadro, a família da ex-senadora, que não recebia nenhum sinal de vida dela desde 1993, decidiu publicar a carta, como parte da mobilização a favor da libertação dos reféns das Farc. Uma outra carta à mãe – que justifica o título no plural – foi publicada junto com a de Ingrid. É dirigida a ela, como “carta de reencontro”, escrita por seus filhos, Melánie, 22 anos, e Lorenzo, três anos mais novo.