Nos dias de hoje, em que o tempo se tornou um artigo de luxo, esperar por qualquer coisa se transformou numa tortura. Há, no entanto, quem ainda faça da espera um momento de observação – e ela ganha outro sentido quando se observa a natureza. Assim agia e sentia a artista e ilustradora botânica inglesaMargaret Mee (1909-1988) cuja vida foi inteiramente voltada para a documentação e a conservação da flora brasileira – especialmente a da Mata Atlântica e a da Floresta Amazônica. Em seus diários de viagem ela relata passagens em que chegou a ficar duas horas aguardando, no escuro da mata, uma flor desabrochar. Tudo isso para poder esboçar em traços rápidos os detalhes desse fenômeno, pacientemente observado em expedições solitárias. É isso que Margaret Mee narra num trecho de seu diário, agora reproduzido na luxuosa edição do livro Margaret Mee (ArtePadilla, 368 págs., R$ 200). Não faltam, em todo o mundo, publicações a seu respeito. Mas nenhuma delas tem a envergadura desse livro que acaba de chegar às livrarias. “Os botões não se modificavam”, escreveu ela. “Enquanto eu me postava ali, com a orla escura da floresta ao meu redor, sentia-me enfeitiçada. Então a primeira pétala começou a se mexer, depois outra e mais outra, e a flor explodiu para a vida.”

Fosse apenas uma ilustradora aplicada, as aquarelas de Margaret Mee não produziriam efeitos diferentes daqueles que resultam de uma câmara fotográfica. O seu traço exato e o seu apuro estético, no entanto, transformam os registros botânicos em verdadeiras obras de arte. Esse prodígio pode ser conferido nas 240 imagens do livro que agrupa o seu trabalho segundo os temas aos quais ela mais se dedicou: árvores, clúsias, bromélias, helicônias, orquídeas, catasetuns e outras espécies. Se alguns desses nomes soam estranhos, o que dizer então de suas denominações científicas. O mais interessante é que Margaret Mee chegou à botânica por acaso. Antes de escolher as flores como tema, ela trabalhou em Londres no departamento de design de uma fábrica de aviões. A Europa vivia assombrada pela Segunda Guerra, e Margaret, que ficara traumatizada com a ascensão do nazismo, decidiu olhar para a frente aperfeiçoando a sua formação artística.

Ela veio em 1952 para o Brasil, juntamente com o marido, o artista plástico Greville Mee – precisava cuidar de uma irmã doente que morava em São Paulo. O casal decidiu, então, fixar-se na cidade (depois mudaria para o Rio de Janeiro) e ela ficou no Brasil até o final da vida. Em suas escapadas pela periferia paulistana, Margaret encantava-se com a diversidade de plantas da Mata Atlântica que começou a documentar. Quatro anos depois já se embrenhava pelas florestas do País em sua primeira expedição pelo rio Gurupi e por Belém. Ao todo, ela fez 15 viagens para a Amazônia e vasculhou o Sudeste brasileiro. Numa delas, navegando por um rio na Amazônia, viu uma clúsia vinho pendendo do galho. Teve de reproduzi-la em rabiscos rápidos e certeiros enquanto o barco balançava ao sabor da correnteza. Nada que se compare à sua busca pela chamada Flor da Lua, uma espécie que se abre somente à noite e, já no dia seguinte, morre. Margaret sonhava com essa visão desde as primeiras viagens. No dia de seu 79º aniversário, em 22 de maio de 1988, numa expedição ao rio Negro, ela a encontrou. Passados seis meses, Margaret morreu. Suas cinzas foram lançadas no mesmo local.