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FICHA SUJA
Silvio Berlusconi, ex-premiê italiano, já foi
condenado por corrupção e evasão fiscal

Silvio Berlusconi se diz um homem arrependido. Foi durante uma entrevista recente ao Canale 5, uma de suas redes de tevê, que o ex-primeiro-ministro da Itália justificou as farras que promovia. A razão, diz ele, era a “solidão” decorrente de um processo de divórcio, da morte de sua mãe e do distanciamento dos filhos. Conhecidas mundialmente como “bunga bunga”, as festas eram orgias frequentadas por prostitutas e dançarinas eróticas, algumas menores de idade, em sua mansão em Milão. Quando, no fim de 2010, Karima El Mahroug, chamada de Ruby, admitiu que, aos 17 anos, havia participado de um desses encontros, o escândalo tomou proporções que culminaram no afastamento de Berlusconi do poder um ano depois. Agora, o empresário bilionário quer mostrar que mudou. Divorciado de sua segunda mulher, ele está noivo da impecavelmente bronzeada Francesca Pascale, apresentadora de tevê de 27 anos, e tenta pela quarta vez o cargo de chanceler do país. Com a economia no sexto trimestre consecutivo de recessão, certamente será preciso mais do que uma vida privada sóbria para convencer os italianos a eleger o conservador em fevereiro.

No período em que o tecnocrata Mario Monti substituiu Berlusconi no poder, de novembro de 2011 a dezembro de 2012, a Itália passou por um ajuste econômico, com reformas no mercado de trabalho (que facilitaram as demissões) e nas pensões (aumento da idade mínima para aposentadoria), e uma combinação de alta de impostos e corte de gastos. “As reformas estruturais lideradas por Monti foram bem menos abrangentes do que se pensa”, disse à ISTOÉ Roberto Artoni, professor de finanças públicas da Universidade de Bocconi, em Milão. “A situação econômica é muito ruim e parece estar piorando, afetando não só trabalhadores de meio período, mas todos os trabalhadores, principalmente os de meia-idade.” O país sofre hoje com a segunda maior proporção de dívida soberana em relação ao Produto Interno Bruto (PIB) da Europa, atrás apenas da Grécia. As perspectivas dos analistas para 2013 apontam para contração do PIB e avanço do desemprego. Apesar disso, Monti, que se viu obrigado a renunciar após a perda do apoio do partido de Berlusconi, também quer tentar de novo.

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RECESSÃO
Homem recolhe restos de comida em rua de Roma: apesar da
austeridade, as projeções apontam para mais desemprego

Para Berlusconi, um novo mandato de Monti seria um pesadelo para a Itália. Em sua campanha, o homem da “bunga bunga” criticou as políticas econômicas alinhadas à Alemanha, propôs cortar impostos e sugeriu o aumento do crédito para que o setor privado retome os investimentos. O mercado, porém, rejeita a volta do magnata das comunicações. Assim que ele anunciou que concorreria nas próximas eleições, os indicadores de confiança recuaram. O temor não é por acaso. Em outubro do ano passado, Berlusconi foi condenado a quatro anos de prisão por fraude e evasão fiscal. Antes, ele já havia sido condenado três vezes por corrupção, mas acabou absolvido em instâncias superiores. À sentença mais recente ainda cabem recursos. Sobre a acusação de pagar para fazer sexo com menores de idade, a pena pode chegar a 15 anos de cadeia. O processo, porém, foi adiado em dezembro e pode terminar só depois das eleições, no que seria uma manobra política: Ruby, a principal testemunha de acusação, faltou à sessão.

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Apesar dos esforços da campanha de Berlusconi e da generosa cobertura que tem recebido das emissoras de seu grupo de comunicação, as pesquisas de opinião mostram seu partido de centro-direita, chamado de Povo da Liberdade, atrás nas intenções de voto do esquerdista Partido Democrático, liderado por Pier Luigi Bersani. A imprensa italiana tem especulado que a coalizão de centro-esquerda teria uma maioria segura na Câmara, mas precisará se aliar à coalizão centrista de Mario Monti no Senado para ter o controle do Parlamento. Depois de muito hesitar, Monti, que é senador vitalício, publicou na internet uma carta aberta em busca de apoio para um segundo mandato e formou uma aliança. “Na minha opinião, Silvio Berlusconi não tem chances de retornar ao poder nesse cenário”, afirma Artoni, da Universidade de Bocconi. “Ele só pode torcer para que um Parlamento sem maioria clara surja das próximas eleições. Neste caso, poderia ter algum poder.” Uma boa votação, mesmo que insuficiente para obter maioria, pode lhe dar capital político para se tornar o principal porta-voz da oposição e influenciar o Legislativo. Num complicado horizonte de processos judiciais, Berlusconi tem na política sua principal cartada para uma vida em liberdade.

Fotos: Olivier Polet; Max Rossi/reuters