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APOIO PÚBLICO Desde que contou que sofre de transtorno bipolar, Cássia tem sido abordada com freqüência. “Muitos pacientes me param na rua para contar que têm o problema e que, com minhas declarações, enxergaram que não estão sozinhos”

 

Um dos maiores choques sofridos até hoje por Marta Kokron, 40 anos, foi ouvir de algumas pessoas que seria melhor esconder que seu filho Thomas, então um bebê, era portador de fenilcetonúria. Caracterizada pela incapacidade de o corpo metabolizar o aminoácido fenilalanina, a doença pode levar à deficiência mental se não for controlada. Obviamente, ela não deu ouvidos ao que escutou. Ao contrário, tratou de falar claramente sobre o problema não só com o filho como também com familiares, amigos e sociedade em geral. O resultado é que o menino, hoje um belo garoto de nove anos, tornou-se um símbolo de que é possível viver bem, apesar da enfermidade. Thomas aparece, por exemplo, na capa dos folhetos do Instituto Canguru – instituição de apoio aos pacientes de doenças metabólicas e seus familiares –, fazendo um emblemático sinal de positivo com as mãos.

A decisão de Marta de encarar a doença do filho sem medo de expor a si mesma e também a criança seria algo raro até pouco tempo atrás. Felizmente, no entanto, mais pacientes estão assumindo seus dramas e batalhas, inaugurando na medicina um novo tempo em que não é mais preciso ter vergonha de ser doente. Muito do estímulo para essa atitude vem do fato de pessoas famosas terem começado a vir a público falar de suas doenças. O exemplo mais recente desse movimento foram as declarações da atriz Cássia Kiss, 49 anos. No passado vítima de bulimia (o indivíduo come e depois induz o vômito) e portadora de transtorno bipolar (mal cuja característica é a alternância de humor entre euforia e depressão), Cássia assumiu sua condição publicamente há cerca de um mês. “Quando fazemos isso, nos fortalecemos”, acredita. “Não ficamos na posição de ‘coitados’ e podemos conversar tranqüilamente com todos, sem ficar nos escondendo”, conta.

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EXEMPLO DE QUE SE PODE VIVER BEM Marta considera a informação uma boa arma para combater doenças. Por isso, orientou o filho Thomas sobre os cuidados que precisa tomar para controlar a fenilcetonúria. Hoje, sabe que o exemplo do filho é importante. “O Thomas entende que, ao se mostrar, ajuda a provar que dá para viver bem”, diz.

 

Os benefícios dessas atitudes não se limitam à sensação de alívio descrita por Cássia. Hoje a medicina sabe que aceitar a doença – o que implica não escondê- la – faz parte do caminho para vencê- la. Há razões que explicam a constatação. A primeira é que, ao não ter medo de se expor, o indivíduo diminui a carga de stress, fator prejudicial a qualquer tratamento. Afinal, hormônios liberados em estado de tensão impedem o bom funcionamento das células. O segundo motivo é que, ao compartilhar seu sofrimento, o doente acaba ganhando um apoio fundamental: a certeza de que não está sozinho. Isso ocorre porque, à medida que fala do seu problema, é natural que descubra outros passando pela mesma situação. De alguma forma, saber disso dá mais força para continuar e ganhar a guerra, como explica o oncologista Roque Andrade, de Salvador. “A cura ocorre por múltiplos caminhos: a competência médica, uma boa relação médico-paciente, o conhecimento do prognóstico verdadeiro da doença por parte do indivíduo, o apoio da família e dos amigos e o entendimento do doente de que não está só”, diz o médico.

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AJUDA PARA ENTENDER O DOENTE Escrever um livro ajudou a jornalista Marilene Lopes a treinar sua coordenação motora e função cognitiva, debilitadas após o derrame que sofreu em 2002. Mas ela acredita que a obra também auxilia quem está de fora a compreender o que se passa com o paciente. “Isso ajuda a saber lidar melhor com o doente”, acredita.

Além disso, há outros ganhos, como comprovou a jornalista Marilene Lopes, do Rio de Janeiro. Vítima de um acidente vascular cerebral (AVC), ela descreveu sua experiência no livro Antes que seja tarde (Ed.Rocco), publicado há dois anos. Hoje, sabe que o relato está ajudando pacientes, familiares e amigos. “Ouvi histórias de indivíduos que identificaram imediatamente a ocorrência de um AVC em pessoas próximas porque tinham lido o que havia acontecido comigo”, conta.

EXPOSIÇÃO PELA ARTE
Outra tendência que está se tornando comum é a realização de livros e exposições de fotos de pacientes. Um exemplo é o projeto A imagem da esclerose múltipla, patrocinado pelo laboratório Bayer Schering Pharma. Portadores do mundo todo foram fotografados pela americana Joyce Tenneson. Entre eles, os brasileiros Elisabete Stelluto e Percy da Silva (na foto, com a esposa Maria Teresa). As fotos estão em exposição em São Paulo até o dia 16. Outra iniciativa é a exposição De peito aberto, patrocinada pelo laboratório Sanofi Aventis. São mais de 50 painéis fotográficos relatando a história de pacientes de câncer de mama, como a psicóloga Maria Cristina Torres. Ela teve a doença duas vezes. Venceu o tumor e hoje é uma grande corredora. Tanto que exibe orgulhosa algumas das medalhas que já ganhou.

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VITÓRIAS Percy e Elisabete ajudam a divulgar a esclerose múltipla. Maria Cristina venceu o tumor de mama