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O maior escândalo da história recente do Brasil impôs ao governo Luiz Inácio Lula da Silva constrangimentos que vão além da crise política e das implicações jurídicas surgidas a partir das acusações contra ex-ministros, políticos aliados e altos dirigentes do partido do presidente. O mensalão tinha acabado de eclodir. É junho de 2005, e um documento de duas páginas chega ao gabinete do então ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos. O remetente é Peter Collecott, “embaixador de sua Majestade Britânica”. O ofício, ao qual ISTOÉ teve acesso, traz uma mensagem de Londres: o governo britânico estava preocupado com rumores de que o mercado brasileiro de resseguros, do qual participam importantes companhias londrinas, estava metido num lodaçal de corrupção. O representante da rainha Elizabeth II referia-se, pontualmente, aos esquemas de arrecadação montados no Instituto de Resseguros do Brasil (IRB), uma das fontes da dinheirama que os aliados do governo sugavam dos cofres públicos em troca de apoio político no Congresso.

No documento, Collecott relatava que, um ano antes, corretoras com sede em Londres já haviam procurado autoridades britânicas para informar a existência de “distorções” na concorrência do setor de resseguros no Brasil. “Empresas estrangeiras, incluindo algumas sediadas no Reino Unido, teriam realizado negócios com o IRB por meio de corrupção”, cravava. O IRB administra contratos de seguro cujos valores não podem ser arcados pelas seguradoras nacionais. É onde entra o chamado resseguro, uma espécie de seguro do seguro. Só no ano passado, a estatal arrecadou R$ 3,2 bilhões em contratos.

Nos primeiros anos do governo Lula, as negociações passaram a ser controladas por prepostos de políticos, principalmente Roberto Jefferson, do PTB. O escândalo, que se somou ao mesmo enredo do mensalão, segue até hoje sob investigação. Mas ainda há muito a ser conhecido. ISTOÉ apurou que uma das companhias britânicas que pediram ajuda política de Londres para conter o propinoduto que estava armado no IRB foi o grupo Willis Insurance Brokers. Até 2003, quando se instalou o esquema, ele figurava no topo do ranking de negócios da estatal. De repente, outras empresas que não tinham desempenho notável – dentre elas, algumas igualmente britânicas – experimentaram um salto espetacular no volume de contratos.

A reportagem obteve cópia de depoimento prestado à Polícia Federal pelo português Américo Pinto Lopes, representante no Brasil da Willis. Lopes contou ter sido procurado por um lobista chamado Luiz Latini, que dizia ter a receita para aproximá-lo da direção do IRB e, em conseqüência, manter os bons negócios da empresa. Em troca, a corretora só teria que abrir mão de parte de sua comissão nos contratos que fossem fechados. Antes de prosseguir, o representante da corretora disse que pediu autorização a seus superiores, em Londres, para manter o contato com o lobista. Conseguiu. Num dado momento, Latini achou que o português estava desconfiando de sua capacidade de ingerência nas decisões do IRB. Sugeriu-lhe um encontro com um deputado. A reunião foi marcada. E quem aparece? O mensaleiro José Janene, um dos 40 que viraram réus no processo do mensalão. Janene, que havia nomeado o então diretor comercial da estatal, Eduardo Pereira de Lucena, foi curto e grosso: disse a Lopes que, se quisesse “ter um apoio” para fazer uma “parceria com o IRB”, era só acertar os detalhes com seu emissário, Latini. Ali estava a chave para entender por que as corretoras de alguns polpudos contratos de resseguro estavam sendo trocadas ao bel-prazer dos diretores do IRB.

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O representante do governo da rainha Elizabeth II advertiu o Brasil