Estratégia, preparo, muita garra e dezenas de tubos de pomada contra assadura e vaselina. Essas foram as armas usadas pelas quatro brasileiras da Clight Salomon Atenah, única equipe feminina a disputar a quinta edição da Terra Incógnita, corrida de aventura e resistência com três dias e quatro noites de duração, realizada na Croácia de 25 a 30 de maio. Com 25 equipes vindas de várias partes do mundo, a prova apresentou percursos de natação, remo, trekking, montain bike e rapel, entre outras atividades de corda. Sílvia Guimarães, a Shubi, 28 anos, Eleonora Audrá, a Nora, 26, Marcella Toldi, 20, e Cristina de Carvalho, 35, assimilaram completamente o slogan da competição, que diz que o limite só existe na cabeça das pessoas, e conquistaram o quarto lugar. Um resultado fantástico, já que elas competiam com equipes muito experientes, todas formadas por três homens e uma mulher. “Os homens têm mais força nos membros superiores e quase 60% da prova foi feita com remo, o que exigiu muito de nós. Mas surpreendemos a todos com o nosso desempenho”, orgulha-se Cristina, que é também a treinadora da equipe. “Foi um quarto lugar que lavou a alma”, diz Nora.

A rota de 380 quilômetros entre os rios Zadar e Omis, no litoral da Croácia, foi feita pela verde-amarela Atenah em 94 horas e 53 minutos, quatro horas e cinco minutos depois da equipe vencedora, Osiguranje Zagreb, ouro da casa. Além da colocação festejada, calos, dores musculares e a superação de fome, frio e sono foram os troféus que as meninas trouxeram para casa. Mas para os competidores de aventura nada é melhor do que testar, e comprovar, na pele a própria capacidade de superação, de persistência e de resistência física e psicológica. Essas são
suas metas. “O esporte de aventura não exige apenas treinamento físico, é um exercício de estratégia, logística, técnica e trabalho em equipe. É também gratificante. As provas são feitas em locais maravilhosos e há o acolhimento da população local, algo muito valioso nos momentos de extremo cansaço”, conta a capitã Shubi. Da equipe, a menos experiente em provas internacionais de longa duração é Marcella, que ainda se recuperava de uma fratura na clavícula. “Logo na largada, tivemos que enfrentar 35 quilômetros de remo. Não foi fácil. Nesse momento tive todo o apoio da equipe. Na verdade, foi uma dificuldade que tivemos que administrar durante todo o tempo”, relembra.

Diferencial – A prova começou dura. A modalidade era remo, mas em mar aberto e durante a noite. O que exigiu, além de força e resistência, boa noção de navegação. Depois, seguiram-se quilômetros e quilômetros de trekking em terrenos pedregosos, natação em águas geladas, transposição de colinas, canyons, cavernas, cachoeiras e corredeiras de rio. E, o pior, pelo menos cinco quilômetros carregando o caiaque entre um ponto e outro da competição. O feito das meninas não foi gratuito. Numa sintonia e num entrosamento de fazer inveja a qualquer outro grupo, elas não perdiam tempo discutindo o que fazer. “Numa prova como essa, as decisões têm que ser rápidas. Nesse ponto, a experiência e o respeito contam muito. Aproveitamos cada segundo para cumprir o nosso objetivo”, afirma Cristina. E esse foi o diferencial da equipe. Cristina cita algumas das atitudes estratégicas que deram a elas vantagens na competição. “Durante a prova há as dark zones, que são momentos – 30 ou 40 minutos – destinados ao descanso à noite, mas, como era frio e tínhamos apenas um cobertor térmico para não pesar na mochila, dormíamos mal. Então, fazíamos pausas durante o dia, sob o sol. Ganhávamos energia renovada. Os outros competidores não acreditavam. Também não tirávamos a roupa de borracha ao sair de uma prova na água. Íamos direto para a outra etapa, a roupa secava sozinha e não tínhamos que levá-las pesando na mochila. Tudo isso, claro, com o corpo besuntado de Hipoglós e vaselina para evitar as assaduras”, diz ela.

Nora lembra que o cuidado com os ferimentos é essencial. “Um calo quando aparece tem que ser tratado de imediato. Se uma dor é persistente a ponto de incomodar, temos de parar e cuidar, para que ela não se torne um impedimento e nos tire da prova”, ensina. A competição era mais de resistência que de força física e, segundo as meninas, nesse quesito as mulheres saem ganhando. “Toleramos mais o desconforto. No começo deste tipo de prova, parecemos mais fracas, mas chegamos mais inteiras no final. É uma constatação também dos atletas masculinos”, garante Cristina. Viva a diferença!