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Férias é tempo de ficar com a família, certo? Certo. Mas é tempo também de diversão e, para as crianças, podem se transformar em treino de autonomia. Os acampamentos educativos, que durante o ano recebem alunos de vários colégios, têm nas férias o momento ideal de mostrar sua missão: desenvolver a curiosidade, a responsabilidade, a independência e a socialização dos pequenos. E há até os que oferecem imersão em inglês. Nesses locais, entre muitos desafios, os pequenos arrumam as camas e cuidam das próprias coisas. Alguns pais, no entanto, sentem-se incomodados com a idéia de perder de vista os pimpolhos por alguns dias. Será que meu filho está pronto para ficar sem mim? E eu para ficar sem ele? Será mesmo seguro?, perguntam-se eles. A melhor forma de avaliar isso, segundo especialistas, é observar os próprios hábitos de convivência e ter certeza de que a criança deseja essa experiência. “Dormir na casa da avó, de uma tia ou de um amiguinho é uma forma de preparo para pais e filhos. Isso vale para qualquer idade. Se uma criança de nove anos nunca se separou dos pais, provavelmente vai sentir mais. O desligamento deve ser gradativo para ser prazeroso”, orienta a psicopedagoga Raquel Caruso, do Centro de Aprendizagem e Desenvolvimento, que atende a cerca de 30 escolas em São Paulo.

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Depois da análise doméstica, é preciso conhecer, se possível pessoalmente, o local e munir-se de informações sobre os profissionais e a programação. Com tudo avaliado, acampamento escolhido, é hora de relaxar. Essa não é, no entanto, uma tarefa fácil para os pais de primeira viagem, ou melhor, na primeira viagem dos filhos. Saber como estão e falar com eles é o ponto nevrálgico de todo acampamento. A orientação dada pelos organizadores é que os pais evitem o contato. Primeiro porque as crianças estão em atividade e uma chamada só iria atrapalhar. Segundo, porque a ligação pode detonar as saudades e fazer uma criança bem entrosada perder o ritmo. A maioria dos acampamentos bem-estruturados tem como recurso jornais online, com fotos e notícias sobre as crianças. Mas, às vezes, nada disso é suficiente. E muitos pais não resistem. Foi o que aconteceu com a economista Heloísa Távora Pinho, mãe de Henrique, dez anos, e Beatriz, sete, em julho. Ela estava segura de ter escolhido bem, mas ligava diariamente. “Sempre viajo, mas eles ficam em seu próprio ambiente, com a avó. O coração apertou”, conta ela. Beatriz chorou na despedida, mas se adaptou.“Foi ótimo. Eles voltaram mais soltos, cheio de brincadeiras novas, fotografias e muitos amigos”, conta a economista.

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Boa medida – Na avaliação prévia, alguns aspectos são essenciais. O tempo de funcionamento e o fato de a empresa trabalhar o ano todo, por exemplo, são bons indicadores da experiência da equipe. As crianças ficam sob orientação de monitores e eles não devem ser contratados apenas para a temporada. A maioria dos acampamentos recebe crianças a partir de cinco anos. E quanto menor a idade, maior deve ser o número de monitores. Segundo a Associação Brasileira dos Acampamentos Educacionais (Abae), uma boa medida é um monitor para cada quatro crianças de cinco a seis anos, um para cada seis de sete a dez anos e um para cada oito de dez a 12 anos. Depois dessa idade, um para cada dez. “É preciso que os monitores sejam bem capacitados, de preferência de nível universitário. Não se prepara uma boa equipe em quinze dias”, explica Manoel Souza Leite, do Sítio Carroção, que opera desde 1970 em Tatuí (SP). A pedagoga e psicanalista Edméa de Melo, do Rancho Santa Mônica, no Rio de Janeiro (RJ), lembra que os pais também se preocupam com drogas e possíveis namoros.“As crianças devem ser separadas por sexo e faixa etária. Exigimos dos monitores a máxima atenção nessas questões”, diz Edméa.

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Os itens de conforto também devem ser checados. Os acampamentos de férias são na verdade acantonamentos. Ou seja, as crianças não ficam em barracas de camping, e sim agrupadas em quartos com seus monitores. Esses espaços devem ser bem arejados, com um banheiro para no máximo quatro pessoas. Se a criança for pequena, o indicado são camas baixas, e não beliches. Um cardápio cuidadoso evitará incômodos de saúde. Verificar se as instalações são próprias também ajuda. “Locais arrendados podem ter manutenção falha. A presença do dono é fundamental para coordenar todos os detalhes”, opina Maria Pia Rabello, do Acampamento Peraltas, de Brotas (SP).

A mesma filosofia segue Afonso Vívolo, presidente da Abae e dono do Acampamento Nosso Recanto, em Sapucaí Mirim (MG). Além da presença constante dos proprietários, é imprescindível que haja médicos e enfermeiros durante a temporada. Também se deve checar a existência de seguro saúde e quais os hospitais próximos.“A entrevista pessoal é importante para tirar essas dúvidas e para que conheçamos o perfil do acampante e de seus pais”, enfatiza Vívolo. Ele afirma que no Brasil a cultura de acampamentos para crianças ainda está se formando. “Não é como nos Estados Unidos, em que cerca de oito milhões de jovens passam as férias em acampamentos”, explica ele. Proprietário do Fazenda Park, em Natal (RGN), Edson Teixeira diz que lá é ainda mais difícil os pais desgrudarem dos filhos. “Como ficamos a apenas dez quilômetros da capital, as mães aparecem na hora do almoço para ver os filhos. Tem até criança que vem com celular”, conta ele.

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A dona-de-casa carioca Maria Angélica Miranda levou seus três filhos a uma colônia de férias, no ano passado, e pôde observar bem essa dificuldade dos pais brasileiros. “Muitas mães choram, ficam agarrando os filhos. E aí as crianças choram também, fazem drama”, conta ela. Como Maria Angélica tinha ótimas referências do local, ela não hesitou em deixá-los ir. O passeio foi tão divertido que Lucas, 11 anos, Rodrigo, 6, e Gabriel, 5, já estão prontos para a nova temporada. “Os filhos refletem o comportamento dos pais. Me portei de maneira natural e eles ficaram numa boa. Um deles até esqueceu de me dar tchau”, lembra ela. Maria Angélica está certa. Se houver hesitação das crianças ou dos pais, o melhor é esperar mais um pouco. A experiência deve ser positiva e desejada para deixar boas lembranças.