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O relógio marcava 20h55 da terça-feira 9 quando o funcionário público Wilson Rosa, 62 anos, caminhava na praia de Copacabana, no Rio de Janeiro, e percebeu que não daria tempo de chegar em casa para ver Carminha, a personagem da atriz Adriana Esteves, ser humilhada em “Avenida Brasil”, a novela das oito da Rede Globo. Angustiado por perder um momento-chave da trama que coleciona picos de audiência, sugeriu à esposa, a dona de casa Célia Regina Barcellos, 58 anos, para assistirem ao capítulo num quiosque da orla com televisão. Não estavam sozinhos. Cerca de 60 pessoas, a maioria homens, compartilharam com o casal a derrocada da vilã mais sedutora dos últimos anos. Nos últimos sete meses, a obra de João Emanuel Carneiro mobilizou não só Wilson Rosa, mas todo o Brasil. O capítulo da segunda-feira 8, quando Carminha foi desmascarada, bateu o recorde de audiência do ano na tevê brasileira, superando a final da Copa Libertadores (leia quadro). O sucesso da trama também deu visibilidade a um grupo novo de noveleiros – homens entusiasmados com os rumos da turma do lixão, que nunca antes haviam acompanhado uma novela.

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SILÊNCIO!
homens assistem ao capítulo de “Avenida Brasil” num quiosque na orla de Copacabana
 

“Considero que há um ‘antes’ e um ‘depois’ de ‘Avenida Brasil’ na história da tevê”, afirma Ricardo Waddington, diretor de núcleo da trama. Para ele, a boa história quebrou a conhecida resistência masculina aos folhetins. “Igual a filme que, quando é bom, agrada a homens e mulheres.” Os irmãos cariocas Eduardo e Miguel Martinez, 21 e 26 anos respectivamente, não se importam com o preconceito, que dizem existir, contra “machos que vêem novela”. “Brincam comigo porque assisto, mas digo que existem dois tipos de homem: os que assumem gostar dessa novela e os que não têm coragem de assumir”, diz Eduardo.

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NA ACADEMIA
eles veem a novela enquanto treinam

E o que fisgou a plateia masculina? A construção da trama, carregada de mentira, traição, violência e vingança, presentes em roteiros de ação que tanto atraem os homens, estão fortemente presentes em “Avenida Brasil”, e ajudam a explicar o sucesso. De quebra, os personagens reproduzem tipos bem brasileiros. “O empreendedorismo, o sonho de ser jogador de futebol e a ascensão social são realidades levadas para a telinha”, afirma Claudino Mayer, especialista em teledramaturgia pela Universidade de São Paulo. Ambientes mostrados na novela, como a sinuca e o campo de futebol do bairro fictício Divino, são considerados iscas masculinas. “Mas a pelada é só desculpa. O homem se vê mesmo em personagens como o Leleco (Marcos Caruso)”, diz Mayer.

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Intérprete do locutor Darkson, rival de Leleco pelo amor da bela Tessália (Débora Nascimento), o ator José Loreto conta que o futebol com os amigos ultimamente tem acabado mais cedo – para ver a novela, sim, mas de um jeito masculino. “Jogamos, assistimos ao capítulo e depois vamos beber cerveja”, explica. Para o psicanalista e professor Sócrates Nolasco, o brasileiro considera que sua identidade sexual é
ameaçada ao assistir a uma novela. “Mas, ao ver na trama um machão, um tipo que joga futebol, ele percebe que não há ‘risco’ e sepermite ver também.”

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Nilson Xavier, autor do “Almanaque das Telenovelas Brasileiras”, diz que é inegável que a carga forte de violência e suspense atiça o público masculino. Mas o sucesso de “Avenida Brasil” é uma soma de qualidades. Uma direção impecável, com ritmo de cinema; um elenco fabuloso, com personagens vivos, que mudam bastante, “como na vida real”; uma estrutura narrativa de seriado americano, apoiada em ganchos finais. E a vilã Carminha, uma unanimidade que independe de gênero: todos elogiam a interpretação milimétrica e excepcional de Adriana Esteves, que tem gravado dia e noite e emagreceu muito nesta reta final. Tanto que as roupas de Carminha estão sendo apertadas no corpo de Adriana antes das gravações. Mas na sexta-feira 19 tudo acaba. O último capítulo vai mostrar o desfecho de Carminha, Nina (Débora Fallabela), Tufão (Murilo Benício) e companhia. Tem que ser muito macho para aguentar tantas emoções.
Colaborou João Loes

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Fotos: Masao Goto Filho /ag. IstoÉ


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