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A mãe dos irmãos Nelson (à esq.) e de Milton Duarte teve
um caso extra-conjugal de seis anos com Hans Stern

Em agosto de 2005, dois anos antes de morrer, Hans Stern, o fundador da joalheria H.Stern, lavrou um testamento público no cartório do 5º Ofício de Notas, no Rio de Janeiro. O judeu que aos 17 anos chegou ao Brasil de mãos vazias, fugindo da Alemanha nazista no fim da década de 30, deixou metade de tudo para a mulher Ruth, com quem casou em 1958, e o restante para seus quatro filhos legítimos e a filha de uma relação anterior ao casamento, Maria Lídia, que vive há 30 anos na Suíça e cuja paternidade foi devidamente reconhecida. O visionário Hans, um empreendedor de enorme faro para negócios que fez fortuna ao apostar no valor das gemas brasileiras quando as pedras nacionais eram consideradas semipreciosas, ficou conhecido como um sujeito de modos simples, avesso a badalações e que gostava de dizer frases como “a família em primeiro lugar, negócios em segundo”. Na semana passada, essa imagem de discrição sofreu um revés. Revelou-se que o recatado Hans era também pai de dois filhos fora do casamento – e agora os novos herdeiros querem invalidar o testamento que os ignorou.

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Os irmãos cariocas Nelson, 52 anos, e Milton Resende Duarte, 54, são filhos de Adeiza Resende, uma senhora de 78 anos que atualmente mora nos Estados Unidos com o sexto marido. Adeiza manteve um caso amoroso com Hans na década de 40, quando ela era casada e ele, solteiro. Em 2007, logo depois de Hans morrer, ela decidiu contar para os filhos quem era o verdadeiro pai deles. A partir daí, iniciou-se uma busca pela comprovação da paternidade, que viria por meio de um teste de DNA. Agora, o dentista Milton e seu irmão Nelson (incapacitado por uma deficiência mental) querem o direito à fortuna. Desde 2010, a família Stern sabia que os irmãos Resende Duarte são filhos do velho Hans, mas o caso só veio a público agora. “O Roberto (filho legítimo mais velho de Stern) já tinha conhecido o Milton e os dois decidiram realizar um exame informal, que revelou que eles eram irmãos”, diz uma pessoa que acompanha o caso desde o início. Na ocasião, Roberto teria oferecido um apartamento no Leblon (metro quadrado mais valorizado do Rio de Janeiro) e uma pensão de dez salários mínimos. “Até então, ninguém falava em dinheiro. Os irmãos queriam apenas o reconhecimento de paternidade e a alteração do registro de nascimento. Queriam usar o sobrenome Stern”, conta o conhecido da família.

Agora, as intenções são outras. O processo dos irmãos corre em segredo na 2ª Vara da Família do Rio, mas sabe-se que eles reivindicam o reconhecimento da paternidade para, a partir daí, ingressarem com ações judiciais que lhes garantam o direito ao espólio de Hans e à sociedade na H.Stern. Por causa do processo na Justiça, o inventário de Hans não teve andamento. O argumento principal dos advogados dos Stern diz que a paternidade afetiva se sobrepõe à biológica. Durante toda a vida, os irmãos Duarte tiveram um pai que, inclusive, deixou herança para os dois. Isso invalidaria o direito deles à partilha dos bens de Hans? “Trata-se de uma criação doutrinária bastante inteligente dos advogados, mas não existe nenhuma decisão a respeito nos tribunais brasileiros”, diz o advogado Luiz Rocha Miranda, especialista em Direito de Família.

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Se vencerem a batalha judicial, os irmãos vão fisgar parte de um patrimônio estimado em centenas de milhões de dólares. Fundada em 1945, a H.Stern possui quase 300 lojas e um quadro de três mil funcionários. Além de consolidar sua marca no Brasil, Hans teve o mérito de ser um dos primeiros empresários radicados no País a expandir seus negócios para o mercado internacional. Atualmente, a H.Stern está presente em 32 países – e sua fama chegou a um público de alta sofisticação. Na década de 1980, a atriz francesa Catherine Deneuve assinou uma coleção exclusiva da grife e, mais recentemente, na entrega do Oscar de 2004, a deslumbrante Angelina Jolie ostentou uma peça H.Stern avaliada em US$ 10 milhões. A empresa fez tanto sucesso que Hans chegou a ser protagonista de uma reportagem da revista americana “Time”, que o classificou como o “rei dos diamantes.” É essa a herança preciosa que os irmãos Duarte – ou será Stern? – querem conquistar. 

Fotos: Alexandre Brum/Ag. O Dia; MARCOS RAMOS/AG. O GLOBO