Xícaras, caixas de fósforo, alfinetes e a primeira carteira de trabalho: objetos foram usados para divulgar a imagem do “pai dos pobres”

O marketing ainda nem engatinhava, mas Getúlio Vargas, que não dava ponto sem nó, usou e abusou da técnica que só seria desenvolvida com profissionalismo no Brasil a partir dos anos 60. Seu ato derradeiro, o suicídio, em 30 de agosto de 1954, foi como uma pincelada final no quadro que montou durante toda a vida para assegurar um grande espaço no imaginário popular. Até os presentes de gosto duvidoso que ganhava com sua imagem foram guardados e doados, ainda em vida, a instituições públicas. O presidente sabia que as imagens o projetariam na história. Com cerca de 300 peças, a exposição Bota o retrato do velho outra vez: retratos do poder e poderes do retrato, que vai até 4 de junho na sede do BNDES, no centro do Rio, exibe essa faceta do caudilho, como parte do programa Getúlio Vargas: 50 anos depois.

Para o museólogo e curador da mostra, Mário Chagas, do Museu da República, será a primeira oportunidade de o público ver tantas imagens do estadista em um mesmo local. “Nada aconteceu ao acaso e por isso a exposição é interessante”, observa. Uma das maiores curiosidades será uma escultura de Getúlio que passou anos esquecida nos porões do Museu da República e acaba de ser restaurada. O presidente media 1,54 m, mas a estátua tem 1,70 m. Xícaras, caixa de fósforo, alfinete de propaganda, um boneco “joão teimoso” e até o rótulo timbrado de um maço de cigarro foram usados na divulgação da imagem do “pai dos pobres”.

A exposição ocupa 100 metros quadrados na entrada do BNDES e é dividida em três módulos: retratos bidimensionais com pinturas e fotos, objetos de campanha e um cenário com a mesa de trabalho e objetos de uso pessoal e de escritório. Nesse último, a idéia foi mostrar a solidão do exercício do poder. Embora toda a ênfase seja para o estadista democrático, a ditadura do Estado Novo é sugerida com a sombra projetada por um busto do ex-presidente. Como observa o curador, Vargas foi um gênio da política e da memória que soube trabalhar como ninguém sua imagem pessoal e a do País. Uma das iniciativas que mais o projetaram para o futuro foi a criação das leis trabalhistas, representadas na mostra pela primeira carteira de trabalho do País. Tinha o número de 0001 e pertencia ao “primeiro trabalhador brasileiro”: o próprio presidente. A data para a inauguração da mostra, 19 de abril, foi escolhida a dedo: é o aniversário de Getúlio.