Tecnofagias – 3ª Mostra 3M de Arte Digital/ Instituto Tomie Ohtake, SP/ até 16/9

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REALIDADE CONSTRUÍDA
"Ceasa", de Vasconcellos, é montagem de alta precisão

No princípio, havia a fotografia em branco e preto, a máquina jukebox, o cinema novo, as bombas de fabricação caseira. Hoje
proliferam projeções controladas por computadores, manipulações digitais, vídeos no YouTube, a militarização da vida cotidiana.

Mas, entre esses dois tempos tecnológicos, entre o low e o hi-tech, despontam as tecnofagias. De acordo com a 3ª Mostra 3M de Arte Digital, a tecnofagia acontece quando a ciência de ponta encontra a ciência de garagem, ou quando o virtual se depara com o real.

A tecnofagia acontece quando o fotógrafo Cássio Vasconcellos realiza uma série de imagens aéreas de caminhões de verduras do Ceasa paulista e produz uma fotomontagem de precisão que quer alcançar uma nova realidade fantástica. É também quando a videoartista Lea van Steen arquiva sua coleção de vídeos caseiros em uma daquelas antigas máquinas de músicas que ficavam em lanchonetes e inventa um sistema de projeção que transforma o banal em extraordinário. Ou quando o artista Arthur Omar compila a sua série antológica “Antropologia da Face Gloriosa” (1973-1997) e reedita o trabalho em versão digital. “Com a pele cromática aplicada à imagem original em preto e branco, este é mais um capítulo do desenvolvimento exploratório da face”, explica Arthur Omar.

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FOTO PRIMITIVA
"Extremo Horizonte", de Maués, é panorâmica feita sobre bicicleta

Tecnofagias também são geradas na revisitação da fotografia primitiva, por Dirceu Maués, que acoplou uma câmera pinhole artesanal ao guidão de uma bicicleta. O movimento do pedal aciona o giro da bobina e o registro da paisagem em uma espécie de fotografia fílmica. Estética que se faz presente nas entranhas expostas da escultura móvel eletrônica de Rafael Marchetti, feita de canos conduítes de plástico e cabos de aço que se agitam como velas de barcos, sensíveis à movimentação do público. O termo se refere ainda aos processos ao mesmo tempo rudes e sofisticados. Como a máquina trituradora de e-lixo, de Lucas Bambozzi, que atua entre as mídias vivas e as mortas, movida a estímulos do campo eletromagnético produzido pelo uso de celulares dos visitantes da exposição.

“Tomei Glauber Rocha como o grande modelo tecnofágico dessa exposição”, afirma a curadora e midiartista Giselle Beiguelman, editora-chefe da revista “seLecT”. “Glauber e sua iluminação zenital do sertão. Aquela é uma estética que não conjuga com a ideia de um Brasil precário e não nega a cultura de massa contemporânea”, completa ela. Tecnofogia é Glauber, é carnaval, praia e é vida digital.