chamada.jpg

02.jpg

Por mais que milagres aconteçam neste fim de semana, com vitórias nas provas finais da Olimpíada, a delegação brasileira deixa os Jogos de Londres sob uma constatação: o Brasil está atrasado em sua preparação esportiva para a Rio-2016. O esperado crescimento do número de medalhas não veio e, à exceção de algumas surpresas, o País continua a depender das modalidades de sempre – judô, vôlei, vôlei de praia. Pior ainda: alguns esportes que pareciam caminhar para uma ascensão sem volta deixaram impressão negativa em Londres. A natação caiu de rendimento e não trouxe um título sequer. Depois do ouro de Maurren Maggi em Pequim, o atletismo ensaiou uma retomada, mas ela não aconteceu. Apesar das conquistas brilhantes de jovens como Sarah Menezes, no judô, e Arthur Zanetti, na ginástica, foi a velha geração que trouxe mais medalhas, como os quase quarentões Robert Scheidt, da vela, e Emanuel, do vôlei de praia, além dos veteranos do vôlei. Uma após outra, os torcedores brasileiros viram grandes esperanças fracassar. Campeã mundial do salto com vara, Fabiana Murer novamente decepcionou em uma Olimpíada. Diego Hypólito caiu mais uma vez. A julgar pelos resultados de Londres, é possível virar o jogo em apenas quatro anos?

Para o Comitê Olímpico Brasileiro, sim. “Já começamos a formar atletas de ponta em modalidades que trazem muitas medalhas, como boxe e ginástica, e nunca estivemos tão bem posicionados em competições de base”, diz Marcus Vinícius Freire, superintendente-executivo do COB. “Uma nova geração vai explodir em 2016.” Para o americano Steve Roush, ex-diretor de alto rendimento do Comitê Olímpico de seu país e contratado pelo COB para prestar consultoria ao esporte de alto nível brasileiro, o fundamental é acelerar intercâmbios internacionais e trazer gente capacitada de fora. “O handebol do Brasil fez isso e é um exemplo de rápida evolução”, diz Roush. Seu raciocínio é reforçado por resultados. O boxe brasileiro é liderado por um cubano (leia quadro), o basquete masculino por um argentino, o levantamento de peso por um romeno. Todas essas modalidades deram um imenso salto de qualidade nos últimos anos.

01.jpg
VICE
Aos 39 anos, Emanuel (à esq.) se despediu dos Jogos Olímpicos
com uma medalha de prata no vôlei de praia com o parceiro Allison

Apesar dos pequenos avanços, o Brasil falhou em diversos aspectos. Até a tarde da sexta-feira 10, o País não estava entre os 20 primeiros colocados no quadro de medalhas. Se não avançar muitos postos em relação à 23ª colocação obtida em Pequim, terá quebrado uma regra. Os países-sede de uma Olimpíada começam a evoluir nas edições anteriores dos Jogos. O Reino Unido foi 10º em Atenas-2004 e 4º em Pequim-2008. Agora, em casa, quebrou seu recorde de medalhas e aparece na 3ª colocação. O Brasil, ao contrário, corre até o risco de regredir em Londres. Em Pequim-2008, o País chegou a 41 finais e a meta era superar essa marca. Às vésperas do encerramento da Olimpíada, os atletas brasileiros tinham alcançado apenas 33 finais. Significa, portanto, que não estamos produzindo talentos suficientes para um projeto de vitórias no futuro.

Assine nossa newsletter:

Inscreva-se nas nossas newsletters e receba as principais notícias do dia em seu e-mail

04.jpg

Para a Rio-2016, o objetivo do COB é ficar entre os dez primeiros colocados no quadro de medalhas. Essa meta provavelmente só será alcançada se o País faturar no mínimo oito ouros. De onde eles virão? O exemplo britânico mostra como, no esporte, resultados não aparecem por acaso. Leva tempo e planejamento. “Para o Rio, em 2016, começamos o nosso trabalho há dois anos e temos 120 pessoas envolvidas nisso”, diz Chelsea Warr, chefe do programa de desenvolvimento de atletas da UK Sports, órgão estatal que centraliza o investimento no esporte de elite. A chuva de medalhas dos britânicos é fruto de um processo meticuloso. “Identificamos talentos acompanhando competições de base”, diz Chelsea. “Ali, enxergamos quem tem potencial e elaboramos um perfil do atleta. É isso que vai definir o que fazer e de que maneira.”

07.jpg

Vai dar tempo de o Brasil fazer algo parecido? “Para esportes como remo, canoagem e ciclismo, conseguimos produzir campeões em quatro anos”, diz a britânica. Ela cita o exemplo da remadora Helen Grover, que começou no programa “Gigantes do Esporte” apenas em 2008 e, mesmo assim, faturou o ouro em Londres. “Mas a maioria dos esportes exige um ciclo mais longo, de oito a dez anos.” A China, que rivaliza com os Estados Unidos pelo posto de maior potência do esporte mundial, também é um exemplo a ser seguido. Em 1998, portanto uma década antes de sediar os Jogos, os chineses instituíram o maior programa de popularização esportivo da história. Mais de 200 mil jovens foram selecionados para treinar, em período integral, em 1,8 mil centros esportivos espalhados pelo país. Desse contingente saíram os campeões olímpicos de Pequim e de Londres.

08.jpg

No Brasil, projetos amplos como esses estão muito longe de ser realidade e os talentos quase sempre são casos isolados e não resultado de uma política institucional. Para o ex-judoca Flávio Canto, criador do Instituto Reação, projeto que ensina judô a crianças carentes no Rio, um dos problemas é o desleixo com que praticamente todas as modalidades, à exceção do futebol, são tratadas no processo de educação. “O calcanhar de Aquiles do Brasil é o esporte na escola, que é muito fraco”, diz o judoca. “Quando melhorarmos isso, teremos uma geração melhor.” Uma das grandes decepções brasileiras na Olimpíada, o atletismo, que já produziu nomes como Joaquim Cruz e Adhemar Ferreira da Silva, vai lançar, no ano que vem, um projeto de introdução ao atletismo em 30 mil escolas públicas do Brasil, para crianças de 6 a 10 anos. “No nosso caso, o problema é que os talentos chegam tarde demais”, diz Martinho Nobre dos Santos, chefe da delegação do atletismo em Londres. “Primeiro o garoto tenta jogar futebol e, se não der certo, talvez ele encontre uma janela no atletismo. No Brasil, nunca o atletismo é a primeira opção.” É hora de começar a ser, ou corremos o risco de dar vexame em 2016.

03.jpg

05.jpg

06.jpg

Fotos: Franck Fife, William West, Carl de Souza; Timothy A. Clary/AFP Photo, Andrew Yates, Christian Petersen e Jjack Guez/AFP Photo, Darron Cummings/AP Photo; Ivo Gonzalez / Agência O Globo


Siga a IstoÉ no Google News e receba alertas sobre as principais notícias