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TENSÃO
Ethiene Franco reza durante a performance de
sua companheira de equipe, Harumy Freitas

As ginastas nacionais são troncudas e pequenas, como as estrangeiras que ficaram com as medalhas em Londres. Têm agilidade, flexibilidade, força e criatividade. Saltam, giram, voam e aterrissam com a competência das campeãs. Mas isso tudo não tem resolvido. Em Campeonatos Mundiais e Pan-Americanos, as meninas já conquistaram pódios que prenunciavam a chegada de uma era vencedora da ginástica artística do País. No entanto, a cada quatro anos a ilusão se desfaz, pois nos palcos olímpicos elas não conseguem mostrar do que são capazes. Invariavelmente, falham justamente na hora em que o mundo todo está olhando, indício de que o corpo está funcionando bem, exceto por um órgão: o cérebro.

Os exemplos de desequilíbrio se acumulam. No sábado 28, Daniele Hypólito viu seu irmão, Diego, sofrer uma queda durante a apresentação no solo. No dia seguinte, na mesma modalidade, ela também caiu. “Eu vim meio tensa para a competição. Procurei me focar, mas a queda dele mexeu comigo”, disse a atleta logo após a desclassificação. A equipe nacional terminou na 12ª e última colocação, ficando fora da zona de oito classificados. Além disso, nenhuma atleta chegou a uma final individual, o que não acontecia desde a Olimpíada de Atlanta, em 1996 (leia quadro).

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Outro problema de cunho psicológico foi o nervosismo da ginasta Harumy Freitas. Foi sua estreia nos Jogos. Ela substituiu Adrian Gomes, cortada por lesão quando a equipe brasileira já fazia aclimatação em solo inglês. Ela admitiu que a tensão por ter entrado no time em cima da hora prejudicou o seu desempenho na trave. E chorou. Mesmo a mais madura atleta da equipe não conseguiu se controlar após a desclassificação naquela que deve ser a sua última Olimpíada. “Muita gente queria que eu não estivesse aqui. Vim, competi e não tive nenhuma queda”, desabafou em tom raivoso Daiane dos Santos, que, aos 29 anos, deve se aposentar no fim do ano.

Segundo os responsáveis pelo acompanhamento das atletas, o resultado em Londres não decorre da falta de cuidado com questões emocionais. “Temos dois psicólogos monitorando o time de ginástica aqui”, diz Berenice Arruda, chefe da equipe de ginástica artística. Ela acrescenta que o Comitê Olímpico Brasileiro (COB) leva em consideração os aspectos psicológicos na preparação. “Se a ginasta está sendo acompanhada por um profissional no seu clube, damos sequência ao trabalho quando a atleta é convocada.” Com a experiência de quem participou da Olimpíada de Atlanta, onde ajudou o Brasil a ganhar um bronze, a ex-jogadora de vôlei Ana Moser defende que a ajuda deve ir além daquilo que os psicólogos podem fazer. Na opinião dela, é preciso que as atletas passem a maior parte do tempo disputando torneios difíceis, com concorrentes do mais alto nível. Diferentemente do judô, esse tipo de competição não é muito comum para as ginastas nacionais.

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Além da pressão da competição, as atletas sofreram com aspectos vindos de fora dos ginásios. Para o ciclo olímpico que se encerra em Londres, a confederação trocou o centro de treinamento montado em Curitiba por outro no Rio de Janeiro. Com a saída do ucraniano Oleg Ostapenko, que ficou à frente da seleção de 2002 a 2008, Georgette Vidor assumiu a coordenadoria técnica da seleção. Para ela, o resultado decorre da falta de uma política de renovação da equipe, e o Brasil pagou o preço por ter concentrado demais o trabalho da ginástica em Curitiba. Diante desse quadro, Georgette afirma não estar decepcionada com o baixo rendimento das atletas brasileiras nos Jogos. “Achava que o grupo poderia ficar com a nona colocação e esperava que a Jade fosse para a final do salto”, diz, referindo-se a Jade Barbosa, cortada por divergências em relação a patrocínio e uniforme.

A saída de Jade se deu faltando um mês para o início dos Jogos, fato criticado pela psicóloga do esporte Katia Rubio, da Universidade de São Paulo (USP). “Eles (dirigentes) não deveriam deixar essas questões para serem aparadas próximo do início da competição.” Na opinião dela, o desempenho desastroso é reflexo da falta de planejamento e não deve ser debitado na conta das atletas. Independentemente de quem seja a culpa, não é o momento de promover uma caça às bruxas. A hora é de planejar para que no Rio, em 2016, as meninas estejam com os músculos e o cérebro no lugar.

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Colaborou Rodrigo Cardos


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