De tanto empurrarem escândalos para debaixo do tapete, eles vão sendo conhecidos como “os irmãos cara-de-pau”. Esses parlamentares são verdadeiras barreiras para impedir novas CPIs e, assim, blindar os colegas de plenário. Fortalecem-se no momento em que são 200 os deputados e senadores suspeitos de envolvimento na máfia dos sanguessugas e no escândalo do mensalão. Mas até agora nada aconteceu com eles. O mais importante dos “irmãos” é o presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Ele confessou a colegas de partido que, por envolver boa parte do Congresso, tem resistido a criar a comissão que investigaria o superfaturamento na compra de ambulâncias. “Como eu vou botar a minoria para investigar a maioria?”, indagou. “Vou ter de ir enrolando”, admitiu Renan, na terça-feira 30 em seu gabinete. Os deputados Fernando Gabeira (PV-RJ), Raul Jungmann (PPS-PE) e Júlio Delgado (PSB-MG), líderes do grupo pró-CPI, queriam explicações. Primeiro procuraram funcionários da Secretaria Geral da Mesa. Ouviram resposta seca: “A determinação aqui é não levar isso adiante.” O trio foi, então, ao secretário-geral, Raimundo Carreiro. “É ordem do presidente”, disse ele. No jogo de empurra, os deputados foram a Renan. “Eu mandei que isso seguisse em frente”, jurou o senador, que chamou Carreiro no gabinete para passar-lhe um pito. A semana acabou com tudo na mesma.

O corregedor-geral da Câmara, Ciro Nogueira (PP-PI), e o deputado Robson Tuma (PFL-SP), nomeado para cuidar do caso dos sanguessugas, fazem igual força para não apurar nada. Quando pôs a mão no livro-caixa da Planam, a fornecedora das ambulâncias, Tuma viu os nomes de um monte de colegas. “Esses aí vão ter que dar explicação”, reagiu. Mas no dia seguinte sua atitude já era outra. “Está tudo no cofre.” A Câmara acabou por devolver o caso ao Ministério Público. “Eles é que têm os instrumentos para investigar”, argumentou o presidente da Casa, Aldo Rebelo (PCdoB-SP). Jogar tudo no colo do MP, aliás, é prática que tem se repetido. O Congresso abdicou de seu poder de auto-investigação. Os procuradores não estão nada satisfeitos. “Investigação política é uma coisa, processo penal é outra. Não podem misturar as coisas”, desabafou o procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, em conversa com auxiliares. Ele se refere à responsabilidade do Congresso de investigar o envolvimento de seus pares pegos pela Operação Sanguessuga. O mais curioso é que, enquanto operam para abafar, os “caras-de-pau” ainda jogam para a platéia. Na terça-feira 30, de olho nos jornais do dia seguinte, Renan cobrou pressa do procurador.

A última bomba jogada no colo do MP é a lista dos novos mensaleiros, que, por pouco, não foi para o buraco do esquecimento. Trata-se de um rol inédito de parlamentares suspeitos de terem recebido dinheiro do valerioduto. O documento, preparado pela finada CPI dos Correios, estava adormecido nas mãos do presidente e do relator da comissão, respectivamente o senador Delcídio Amaral (PT-MS) e o deputado Osmar Serraglio (PMDB-PR). Pressionados, eles hesitavam em dar seguimento à investigação. Engavetaram a lista por 54 dias. Só saiu do esconderijo porque o procurador-geral cobrou, por ofício. Na segunda-feira 29, sem alarde, o relatório foi encaminhado, em envelope lacrado. “Demoramos porque o Serraglio estava sofrendo pressão”, defende-se Delcídio. “O Delcídio estava num chove-não-molha”, devolve Serraglio. O sistema de autoproteção vai além de sanguessugas e mensaleiros. A senadora Ideli Salvatti (PT-SC), com ajuda do senador Sibá Machado (PT-AC), tentou impedir que a CPI dos Bingos avançasse sobre as relações entre petistas e bingueiros em São Paulo e Santa Catarina. Um dos alvos da CPI era a Rede 13, ONG ligada a Ideli que chegou a ser gerenciada por Lurian Cordeiro, filha do presidente Lula.


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