Este homem ao lado é um assassino cruel. Ele é o promotor de Justiça Igor Ferreira da Silva, 39 anos, que com dois tiros certeiros acabou com a vida de sua mulher, Patrícia Longo, grávida de sete meses. Nesta semana completam-se oito anos que o crime aconteceu, e o matador – condenado a 16 anos de prisão – ainda está livre. Pior. ISTOÉ conversou com pessoas próximas do promotor, colegas de profissão, policiais e vizinhos que informam que Igor alterna sua vida entre a capital paulista, as brisas do litoral catarinense, local onde surfa, as montanhas do Paraná – onde pratica seu esporte preferido, que é voar de asa-delta – ou o Paraguai, possivelmente endereço de uma fazenda da família.

Foi justamente no país vizinho que Igor quase foi preso, há três anos, pela Interpol. Todos os entrevistados concordaram em falar sobre o crime do promotor, desde
que não fossem identificados. “A família de Igor é perigosa, não podemos denunciá-los”, conta um vizinho que diz ter visto o promotor, por três vezes, na
casa de seus familiares, na zona leste paulistana. Os amigos do tiro ao alvo –
outra paixão do criminoso – acreditam que ele esteja mesmo em São Paulo.
Já um delegado amigo de Igor tenta defender o indefensável: “Ele cometeu
essa besteira por ciúme”, argumentou.

Ex-delegado da Polícia Civil, irmão e filho de advogados, Igor é um homem inteligente, rico e de boa conversa. E, principalmente, sabedor das artimanhas que criminosos como ele utilizam para se esconder atrás de disfarces e de outra identidade. O bárbaro crime aconteceu em 1998, em uma estrada a 60 quilômetros da capital paulista, quando Patrícia foi baleada na cabeça enquanto dormia dentro da picape do marido, a caminho de casa. Igor foi acusado por homicídio qualificado – não teria dado chance de defesa à vítima – e por aborto, já que a criança morreu. Passado todo esse tempo ele continua foragido e a polícia, que nem sequer tem uma imagem atualizada dele, torce para que alguém o denuncie.

A pedido de ISTOÉ, Isnard Martins, um dos maiores especialistas em retrato falado do Brasil, usou um processo de envelhecimento craniométrico de Igor e simulou a possibilidade de inúmeros disfarces. As imagens foram feitas pelo software, Fotocrim, desenvolvido por Isnard, que é professor da PUC do Rio de Janeiro. Programas semelhantes ao do pesquisador são utilizados pelo serviço de inteligência da polícia de Israel, do Japão e dos EUA para busca de terroristas e criminosos em geral. A Secretaria de Segurança de São Paulo (SSP) utiliza um programa italiano semelhante, mas ineficaz porque trabalha com uma biotipia européia. “Não falamos sobre o assunto”, disse laconicamente a assessoria de imprensa da SSP.

Oficialmente, Igor fugiu. Mas seus pares da Justiça não utilizam o mesmo verbo para se referir ao caso. Beneficiado pela lei por ser promotor, Igor foi julgado pelo órgão especial do Tribunal de Justiça de São Paulo. Por conta desse privilégio e da credulidade dos 25 juízes mais antigos do tribunal – que confiaram em que ele se entregaria após a condenação –, Igor pôde assistir à leitura de sua sentença sentado em um banco muito diferente dos freqüentados pelos réus: o de uma igreja longe do tribunal, porém bem próxima da casa de seus pais na zona leste. Detalhe: não havia policiamento nas proximidades da igreja onde todos sabiam que Igor estava. Ao tomar conhecimento de que passaria 16 anos na cadeia, Igor desapareceu.

No ano passado, os restos mortais de Patrícia foram transferidos do cemitério da cidade de Atibaia, local do crime e onde o casal vivia, para o município de Arujá, onde mora a mãe da vítima. Outro mistério que ronda o caso, mesmo com todas as provas levadas ao tribunal, é o comportamento dos pais de Patrícia. Eles não acreditam que o genro seja o autor dos disparos que ceifaram a vida da filha.

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A única testemunha do crime, o vigia do condomínio, sumiu e Igor continua foragido. O assassino alegou em sua defesa que o casal teria sido vítima de um assalto e que o ladrão teria levado Patrícia, e o deixado para trás, e a executado. Durante o processo, a defesa pediu que fosse feito um exame de DNA na criança para provar que o casal vivia às mil maravilhas e, assim, garantir a tese do assalto. A estratégia não deu certo. Os exames demonstraram que o filho que Patrícia esperava não era do promotor. Esse fato e o de o suposto ladrão não ter roubado nada do casal derrubaram a tese do assalto. Segundo o pensador inglês John Stuart Mill (1806-1873), homens como Igor, que violentam e matam mulheres, são o resquício (já no fim do século XIX) da era primata, “uma espécie que resiste ao avanço da civilização”. É duro constatar, mas eles ainda existem. E como.


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