Estado daquele que, pela ausência de um objeto ou por um obstáculo externo ou interno, é privado da satisfação dum desejo ou duma necessidade. A fria e precisa definição do Aurélio para o verbete frustração não poderia ser mais apropriada para a situação de Romário. Excluído da lista definitiva de Luís Felipe Scolari, o baixinho perdeu a chance de disputar aquela que seria a sua última Copa do Mundo. Os 835 gols marcados na carreira, a pressão da imprensa, os apelos de milhões de torcedores pelos quatro cantos do País e o choro semanas antes da derradeira convocação não foram capazes de sensibilizar o durão Scolari. A Romário resta a frustração, um sentimento corriqueiro e recorrente que somos obrigados a encarar centenas de vezes na vida.

Quando o assunto é frustração, a pergunta não é se ela vai acontecer, e sim quando. O indesejável porém inevitável sentimento está relacionado a tudo o que nos propomos a fazer. Se é assim, o jeito é preparar-se desde cedo para encará-lo sem traumas e… frustrações. “Na infância, a tendência dos pais é superproteger os filhos. Esse comportamento pode causar problemas no futuro. É necessário ensiná-los a lidar com as decepções. É um pouco complicado, pois nessa idade eles não estão preparados para encarar tais situações. Ficam inconformados, reagem de forma agressiva e muitas vezes violenta. Mas o que não pode acontecer é o pai se desesperar e ceder à pressão”, ensina Nairo de Souza Vargas, 60 anos, psiquiatra do Hospital das Clínicas de São Paulo. Mas é preciso critério na administração da frustração infanto-juvenil. Doses acentuadas de desilusão podem causar danos irreparáveis à personalidade da criança. “O excesso de frustração pode provocar distorções. A pessoa arrisca ficar insegura, com uma imagem muito negativa de si própria. É aquela que na primeira decepção se acha uma porcaria, um fracasso”,
alerta o psiquiatra.

Por alguns meses esses sentimentos afligiram a estudante paulistana Juliana Abbud Ferreira, 18 anos. O motivo de tamanho desespero foi a reprovação nos vestibulares de medicina da USP, da Escola Paulista de Medicina, da Unesp e da Unicamp. Foi a segunda tentativa da moça. Em 2001, ela também tentou e não conseguiu. Mas nem o fato de se tratar de uma das provas mais difíceis e concorridas do País serviu de consolo. A frustração foi maior do que o bom senso. “Fiquei chateada comigo mesma, queria me isolar do mundo. Foi horrível. Quando ficava sabendo dos resultados, me trancava no quarto, não atendia a telefonemas”, diz Juliana. O baixo-astral chegou ao limite em janeiro. Ela desistiu de viajar para Caraívas, no sul da Bahia, por julgar que não merecia acompanhar as amigas no passeio. Para tentar esquecer o trauma, arrumou um emprego de garçonete em um bar na Vila Olímpia, badalado bairro da zona sul de São Paulo. “Queria me sentir útil”, diz. Foram as próprias amigas que a ajudaram a vencer a frustração. Depois de uma série de conversas, elas conseguiram fazer Juliana dar um chute na melancolia. “Minhas amigas disseram que eu estava sendo muito covarde. Elas tinham razão. Mas não adianta fugir. Eu vou ter que enfrentar. Hoje, as coisas estão melhores. Voltei a estudar. Estou confiante”, conta a estudante. Entre uma reprovação e outra, Juliana ficou de cama, acometida por
uma forte gripe.

Juliana pode até não saber, mas uma das manifestações que acompanham a frustração deve ter sido a responsável pelo seu repouso forçado. “Um indivíduo frustrado pode apresentar um quadro de irritabilidade, retraimento e desorganização psicológica. Esta última pode causar uma série de sintomas clínicos. Os mais comuns são perda de sono e apetite, cansaço, falta de disposição e dores inespecíficas”, diz o psiquiatra Ricardo Moreno, 45 anos, coordenador do grupo de doenças afetivas do Hospital das Clínicas de São Paulo. Curiosamente, horas depois de saber que estava fora da Copa, Romário sentiu dores nas costas. O problema motivou a ausência do craque no treino da terça-feira 7 e o consequente cancelamento de uma entrevista coletiva marcada para aquele dia no Vasco-Barra, local de treinamento do time.

Na quinta-feira 9, o atacante finalmente falou sobre a frustração de não estar entre os 23 jogadores que irão à Coréia. “Decepção é decepção. Eu tinha muita esperança, mas acabei ficando de fora” disse o baixinho. Mestre na capacidade de destilar ironias, o jogador não iria perder a chance de dar uma alfinetada em Felipão e seus desafetos. “Isso vai doer na consciência de algumas pessoas. Estou chateado. Mas, como tudo na vida, isso vai passar. Não adianta ficar chorando ou me lamentando. A vida segue e eu ainda tenho muitos gols para fazer”, emendou. O baixinho está certo. Afinal, como diz o psiquiatra Nairo de Souza: “Só não se frustra quem não tenta, quem não investe em alguma coisa.” E isso Romário tem feito há mais de 15 anos. Quem não se lembra da
Copa de 94?