PAI DA PÁTRIA Cosimo ganhou esse título pela grande influência política e cultural que exercia em Florença

 
 

O discreto Giovanni di Bicci de’ Medici nasceu numa família modesta em Florença, muito cedo ficou órfão de pai e com uma pequena herança, compartilhada com cinco irmãos, fundou a poderosa e famosa dinastia Medici – família de banqueiros que viveu o seu apogeu e queda durante o século XV, na cidade italiana banhada pelo rio Arno. Pouco afeito à política, Giovanni passava os dias ensimesmado, conferindo os seus livros-caixa e preocupado com lucros e mais lucros – chegou a ter mais de 20 bancos espalhados pela Europa. A trajetória dessa família, de seu poder econômico e de sua influência na promoção da arte é contada pelo escritor britânico Tim Parks no livro O banco Medici (Record, 280 págs., R$ 40), que acaba de ser lançado no Brasil.

Giovanni Medici já possuía uma respeitável fortuna em 1410 e era uma personalidade influente. Foi nesse momento de sua vida, raro momento de desvio de atenção de seus negócios, que ele se voltou ao cenário internacional. O motivo era importante e havia rentáveis favores a colher: o mundo vivia a expectativa do retorno do papado à Roma, depois do Grande Cisma, ocorrido na Igreja Católica, e Medici apostou que o novo papa seria um italiano, o que de fato se consumou. Em troca de seu apoio, as instituições religiosas de Roma e outras autoridades da Igreja passaram a fazer vista grossa para a usura (assim era chamado o empréstimo feito mediante cobrança de juros) e também passaram a utilizar os seus bancos. Uma troca de interesses perfeitamente bem casados. Religião, investimentos e arte estiveram assim intimamente interligados ao longo do século no qual perdurou o império bancário dos Medicis. A linhagem de banqueiros, em pouco tempo tornou- se uma dinastia real.

Cosimo, o filho de Giovanni, assumiu o comando das operações após a aposentadoria do pai e seguiram-se anos gloriosos. O sucessor ficou conhecido na Itália como o Pater patriae, o pai de sua pátria, pela sua influência política e artística em Florença. Cosimo era amigo de filósofos, pintores e arquitetos e se fazia rodear de mulheres. Sempre há risco quando se combina muitos negócios com muito prazer, mas o seu temperamento hedonista não o distraiu do objetivo principal de sua vida: ganhar mais dinheiro. Cosimo foi um dos mais importantes artífices da expansão e do enriquecimento do banco e da família nessa segunda fase de seu império financeiro.

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O papel de mecenas cultural da família Medici fez de Florença o berço do Renascimento italiano, com artistas geniais como Leonardo da Vinci, Michelangelo Buonarroti, Dante Alighieri, Filippo Brunelleschi e Nicolau Maquiavel. O gosto pelas artes seria ainda mais valorizado pelo neto de Cosimo, Lorenzo, poeta e dono de um particular senso estético e cultural – ele foi um dos principais operadores de uma complexa rede de atividades culturais promovidas pelo banco. Para agradar à Igreja, Lorenzo financiou a restauração do mosteiro de São Marcos. Em troca, recebeu uma bula papal que o absolveu de seus pecados. Também pagou por San Lorenzo, a igreja da família Medici, e construiu o maior palácio particular da cidade. A essa altura, porém, as sucessivas guerras que assolavam a Europa e o crescimento do movimento contra a nobreza prejudicavam os negócios dos Medicis, identificados com esses interesses. “O florescimento do humanismo e a proliferação dos bancos estiveram associados ao declínio da teocracia e do mundo medieval”, escreve Tim Parks. E assim, numa histórica ironia, o império financeiro da dinastia Medici, que financiou o Renascimento, faliu no momento em que esse movimento cultural vivia o seu auge.

Os cinco Medicis

MECENATO Botticelli era um dos contratados dos Medicis

A adoração dos magos (à esq.) é obra do pintor italiano Sandro Botticelli (1445-1510), o qual dedicou boa parte da carreira às grandes famílias florentinas, especialmente à família Medici. Nesta tela, estão representados os principais integrantes da família Medici, entre eles:

Giovanni di Bicci de’ Medici (1360-1429) – Fundador do primeiro banco Medici, em Florença, em 1397. Abriu filiais em Roma, Nápoles e Veneza. Discreto, aconselhou os filhos em seu leito de morte: “Fiquem longe dos olhos do público.”

Cosimo de’ Medici (1389-1464), Pater patriae (o pai de sua pátria) – Era amigo de filósofos, pintores e arquitetos e aumentou os lucros do banco. Financiou a restauração do mosteiro de São Marcos em troca de uma bula papal que o absolveu de seus pecados

Piero di Cosimo de’ Medici, Il Gottoso (1416-1469) – Ficou assim conhecido por sofrer de gota, uma forma hereditária de artrite que afetou muitos homens da família Medici. Presidiu os negócios por cinco anos e os entregou ao filho mais velho, Lorenzo

Lorenzo de’ Medici, o Magnífico (1449-1492) – Assumiu o banco com 20 anos de idade, era um grande político e também bom poeta, mas sem experiência em finanças. Contribuiu para a derrocada da instituição, que iria ocorrer cinco anos após a sua morte

Piero de’ Medici, o Fátuo (1472-1504) – Era craque no futebol florentino e pouco interessado nos negócios. Fugiu de Florença pouco antes de a cidade ser invadida pelas tropas francesas, em 1494. A fortuna que restara de sua família foi confiscada e ele morreu dez anos depois

 



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