Não foi apenas o esverdeado dos dólares que induziu o cineasta americano Steven Spielberg a fazer uma plástica no seu E.T. – o extraterrestre (E.T. – the extra-terrestrial, Estados Unidos, 1982), que tem estréia nacional na sexta-feira 29. Para comemorar o aniversário de 20 anos de um dos filmes mais bem-sucedidos de todos os tempos, com uma arrecadação de US$ 700 milhões, o diretor apelou à vaidade
e ao bom senso. Assim, corrigiu alguns erros tecnológicos hoje em dia primários, mexendo em 140 cenas, inclusive na da perseguição aos garotos, quando estes estão levando a criatura para o seu tão ansiado encontro com os da sua espécie. No original, os policiais carregam armas nas mãos. Agora, elas foram substituídas por artistas digitais empunhando intercomunicadores. Para o sempre politicamente correto Spielberg, o detalhe das armas em parte denegria o que ele considera um de seus melhores trabalhos. Na verdade, as cenas adicionais ou que sofreram
um discreto lifting, não são tão perceptíveis a não ser para quem assistiu ao filme várias vezes. Importa é que, mesmo com efeitos especiais quase jurássicos, comparados ao atual show de tecnologia, a fita não perdeu seu encanto.

Só para lembrar, a história começa em clima de mistério, quando estranhos seres interplanetários de um metro, com cabeça e dedos enormes, descem à Terra. Parecem inofensivos ao estudar a superfície do planeta. Até que um grupo de humanos, atraído pelas luzes da nave espacial, chega ao local. As pequenas criaturas zarpam para o espaço. Apenas uma sobra, sem conseguir disfarçar seu medo explicitamente aceso no centro do peito. Ele, o E. T., acaba escondendo-se na casa de Elliot (Henry Thomas), um garoto de dez anos que vive com a mãe separada Mary (Dee Walace) e os irmãos Michael (Robert Macnaughton) e Gertie (Drew Barrymore), numa pequena cidade dos Estados Unidos. Daí em diante, todo mundo conhece a trama e o que se sucede.

Retocar E.T. foi uma operação tão secreta quanto as suas filmagens. Iniciado o projeto em meados de 2000, dentro da Universal Pictures a equipe só se referia a ele como A boy’s life (“a” vida do garoto). Spielberg não queria que nada vazasse. Começou dando mais qualidade ao negativo. Depois listou as cenas a serem refeitas ou adicionadas. Uma que certamente muita gente notará é o momento no qual o alienígena demonstra estar na maior curtição, coberto de água na banheira, para desespero de Elliot. A cena foi realizada com um boneco hidráulico, que na hora não funcionou, fazendo com que toda a sequência fosse banida na montagem original. Para dar vida ao ser, Spielberg contratou dois anões e o ator Mattew de Merritt, nascido sem as pernas. Consta que o próprio Merritt criou o andar do E.T. bêbado de cerveja. Quanto ao caminhar normal, Spielberg os instruiu dizendo que tinha imaginado uma mistura de Bambi com Charles Chaplin. Um dos anões passou maus momentos quando sua roupa pegou fogo com ele dentro. Spielberg o salvou.
 

Bicicleta – A famosa cena da bicicleta voando com o extraterrestre envolto num cobertor foi inteirinha refeita com uma nova criança. No original, as roupas ficavam imóveis. Agora, elas se mexem ao vento, as árvores idem e os movimentos foram duplicados. Um outro detalhe também ganhou correção. Em determinado momento, quando simula um sorriso, o extraterrestre deixa a boca torta. No recente formato, o pessoal da Industrial Light and Magic, de George Lucas, aperfeiçoou o sorriso. Para chegar ao desenho final do E.T. a equipe de efeitos especiais, comandada por Carlos Rambaldi, gastou cinco mil horas de trabalho. Doze engenheiros operaram os modelos mecânicos. Aqueles olhos tão ternos, que encantaram adultos e crianças, ganharam os cuidados de um especialista em olhos para cegos. Suas feições, segundo Spielberg, misturam as do cientista Albert Einstein com as do escritor Ernest Hemingway e as do poeta Carl Sandburg. Rambaldi diz ter se inspirado num tigre do Himalaia. Vai saber.

Para as crianças de hoje, assistir a E.T. é se envolver com uma fábula arrebatadora, sem nenhum vestígio da violência ou histeria contida nos desenhos animados japoneses ou nos barulhentos filmes de ficção científica. Aos que estão acostumados com o andamento alucinado que se imprimiu às aventuras do momento, o ritmo do filme pode não ser dos mais agitados. Mas a emoção, as noções de amizade e solidariedade, enfatizadas pela ótima trilha sonora de John Williams, compensam a suposta falha na opinião dos adeptos da linguagem videoclipada. O elenco também não faz feio, com direito a uma ponta de um jovem Peter Coyote no papel do médico que tenta reavivar o alienígena quando ele é capturado e quase morre. Henry Thomas, hoje um rapagão, não decolou na carreira. Drew Barrymore, à época com seis anos, tornou-se uma estrela de Hollywood depois de problemas com drogas pesadas. Neste sentido, E.T. soa hoje premonitório. Ao final, quando a adorável criatura se despede dela, lhe cochicha: “Seja boazinha.” Pelo sabido, Drew Barrymore foi bem desobediente.

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