Nos anos 60 e 70, Robert Gabriel Mugabe era um líder rebelde respeitado em seu país, a Rodésia (atual Zimbábue), e no exterior. Líder da Zanu (União Nacional Africana do Zimbábue), ele foi o grande herói da luta contra o regime de minoria branca do primeiro-ministro Ian Smith, ao lado de outro chefe guerrilheiro, Joshua Nkomo, do Zapu. Em 1979, depois de uma guerra civil que durou quase dez anos e deixou 30 mil mortos, Mugabe trouxe seus guerrilheiros marxistas à mesa de negociações. O Acordo de Lancaster House, assinado em Londres, deu direito de voto a toda a população da Rodésia e garantiu o direito de propriedade à minoria branca. Em 1980, a Zanu ganhou as eleições, Mugabe tornou-se primeiro-ministro e o país, renomeado Zimbábue, conquistou a independência do Reino Unido. Como estadista, Mugabe foi elogiado pela comunidade internacional por não ceder à tentação de “jogar os brancos ao mar” e buscar uma transição pacífica. Mas o ex-rebelde tomou gosto pelo poder. Em 1987, mudou a Constituição para poder se eleger presidente. Foi reeleito nos pleitos subsequentes, em 1990 e 1996. Na quarta-feira 13, o veterano Mugabe, 78 anos, foi novamente reeleito, desta vez em meio a acusações de fraude eleitoral generalizada e intimidação à oposição.

Pressão sobre eleitores, roubos de cédulas e outros artifícios pouco ortodoxos foram usados para que, no final, saísse vitorioso o partido de Mugabe, o Zanu-PF, que obteve 57% dos votos, contra 42% do Movimento para Mudanças Democráticas (MDC) do candidato de oposição, Morgan Tsvangirai. Observadores internacionais declararam que a eleição foi fraudulenta e o chanceler britânico, Jack Straw, chegou a classificar a vitória de Mugabe como “uma tragédia”.

Com mais seis anos de mandato pela frente, Mugabe é hoje uma pálida sombra de seu passado, um dirigente cuja única coerência está na disposição de se manter no poder a qualquer custo. Na campanha, ele chegou a usar camisas estampadas com sua própria imagem, numa primitiva manifestação de culto à personalidade. “Um rei é um rei. Só é destituído quando morre”, comparou um de seus assessores, esquecendo-se de revoluções que destronaram e executaram monarcas. O presidente, que nos anos 90 adotou um plano de ajuste do FMI e privatizou estatais, hoje vocifera contra o “capitalismo”. O mesmo dirigente que garantiu privilégios econômicos à minoria branca no início de seu governo agora incita os camponeses negros contra fazendeiros brancos e promove uma reforma agrária “na lei ou na marra”. É verdade que apenas 4,5 mil famílias brancas detinham 80% das terras aráveis, enquanto sete milhões de negros tinham que se contentar com o que restava. Mas a manutenção dessa discrepância foi a base da transição pacífica que Mugabe conduziu com tanta habilidade. O fato é que, depois de 22 anos de poder, pouca coisa mudou no Zimbábue. Dois terços da população está abaixo da linha de pobreza, 85% é analfabeta e o índice de desemprego atinge 60%. Mesmo assim, o eterno presidente continua culpando o Reino Unido pelas mazelas do Zimbábue.