Quando as turbulências ameaçam um avião, o piloto deve adotar uma solução de emergência. É a este recurso, utilizado em situações de perigo iminente, que a Fundação Rubem Berta (FRB), que controla a Varig há 57 anos, acaba de recorrer. A decisão histórica de abrir mão do controle da companhia por meio de um processo de reestruturação societária e através do lançamento de novas ações no mercado de capitais, foi aprovada em assembléia. A medida, referendada por 97% dos membros do colégio deliberativo da FRB, é uma tentativa desesperada para atrair novos sócios com capital, tirar a empresa do vermelho e reduzir uma dívida de US$ 900 milhões.

Os mais velhos são saudosos dos tempos em que a Varig era considerada uma das mais eficientes companhias de aviação do mundo. Um dos poucos motivos de orgulho dos brasileiros no Exterior, a companhia se debate em dificuldades financeiras há pelo menos dez anos por erros administrativos. A culpa não é de Bin Laden. Os atentados de 11 de setembro nos Estados Unidos pioraram uma situação financeira que já era muito delicada, com a queda da demanda para os Estados Unidos reduzida em mais de 30%, mas não provocaram a crise. “A Varig vem dando sinais de insolvência há dez anos”, diz um analista do mercado de aviação de Brasília, que pediu para não ser identificado. “O modelo de administração levou a uma progressiva degradação da empresa, que não registra lucro desde 1991”, diz o analista, lembrando que a Varig já chegou a ter 300 funcionários por aeronave, uma verdadeira aberração.

Se tudo der certo, a fundação terá que abrir mão do controle ou dividi-lo com os novos sócios, segundo admitiu a ISTOÉ o diretor de controladoria e relações com os investidores, Manoel Guedes. “Pelo que está sendo desenhado, o controle da companhia será compartilhado com o novo sócio, mesmo porque ninguém vai colocar dinheiro se não participar das decisões da empresa”, diz Carlos Eduardo Albano, analista do Unibanco.

Sem outra alternativa, depois de ver fechadas todas as possibilidades de receber um aporte financeiro do governo – prática comum no setor aéreo no passado –, a empresa teve que buscar dinheiro no mercado. A dívida atual da Varig chega a US$ 900 milhões. Em dezembro era maior, cerca de US$ 1,2 bilhão. Foi reduzida graças a uma operação contábil no final do ano passado envolvendo a devolução para a Boeing de quatro aviões MD-11, recurso utilizado para tapar buracos de dívidas das duas companhias. A Varig também vem cortando custos via redução de seu quadro de funcionários. Para este ano já anunciou que irá fazer mais demissões, atingindo cerca de dois mil empregados. No ano passado foram demitidos outros 700. A meta final é reduzir o número de funcionários de 17 mil para 12 mil e os custos em US$ 200 milhões.

A transição para a nova Varig deverá durar de quatro a seis meses, período em que os planos serão apresentados à Comissão de Valores Mobiliários (CVM), à Bolsa de Valores e aos investidores, incluindo o BNDES. Investidores estrangeiros também poderão adquirir ações da empresa, mas para estes há um limite de 20% do controle, estabelecido pelo Código Brasileiro de Aeronáutica (CBA). Quem não gostou dos planos da companhia foi a Associação dos Pilotos da Varig, que reúne 1,6 mil profissionais. Flávio Souza, presidente, disse que a entidade não questiona a venda das ações, mas a falta de transparência no processo. “Só ficamos sabendo do que estava para acontecer uma semana antes da assembléia.”

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