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APLAUSO CONSTRANGIDO
Vereadores da Câmara de Medianeira, no Paraná,
empossaram Sirlei Brisida na quarta-feira 6

O sistema eleitoral brasileiro já produziu fenômenos pitorescos, como as votações recorde do palhaço Tiririca e do médico Enéas Carneiro. Mas, na semana passada, chegou ao fundo do poço com a posse da manicure Sirlei Brisida no cargo de vereadora na cidade de Medianeira, no Paraná. Sem nenhuma experiência política e tendo recebido apenas um voto na eleição de 2008, que ela não sabe de quem foi porque nem ela mesma votou em si própria, Sirlei só conseguiu a cadeira na Câmara Municipal depois que a Justiça Eleitoral cassou por infidelidade partidária o mandato de Edir Josmar, que trocou o PPS pelo PSDB. Os outros sete suplentes de Josmar, que tiveram entre 90 e 430 votos, também mudaram de partido e perderam a chance de ocupar a vaga. Ao assumir o posto na quarta-feira 6, numa cerimônia de 15 minutos, Sirlei confessou estar apavorada e ainda não sabe como foi parar ali. “Não sei quem votou em mim, só sei que o voto não foi meu”, disse. A nova parlamentar espera contar com o apoio dos colegas e está disposta a investir os seis meses que lhe restam de mandato para melhorar o setor de saúde em sua cidade.

A intenção de Sirlei, que terá um salário de R$ 3,7 mil e direito a um assessor, é boa, embora a legitimidade de seu mandato seja questionável. O caso ilustra uma das muitas aberrações do sistema eleitoral, avalia o cientista político David Fleischer, da UnB. “Dentro das normas do nosso sistema de representação proporcional e de fidelidade partidária, ela pode assumir o mandato. Mesmo que tenha recebido apenas um voto”, explica Fleischer. Ele lembra que quando o médico Enéas foi eleito deputado federal por São Paulo em 2002 com o apoio de 1,5 milhão de eleitores puxou mais quatro deputados, incluindo Vanderlei Assis de Souza, que chegou ao Congresso com ínfimos 275 votos. Tiririca teve 1,3 milhão de votos e ajudou a eleger Vanderlei Siraque (PT-SP), com 93 mil votos, menos que outros dez candidatos não eleitos. Para o professor da UnB, duas mudanças são necessárias: “Proibir coligações em eleições proporcionais e impor uma cláusula de barreiras, de 2% ou 3% dos votos, para eleger alguém”, afirma.

A proposta de reforma política que está no Congresso prevê o fim do sistema proporcional baseado em coeficiente eleitoral, eliminando a figura do “puxador de votos”. Hoje as vagas são distribuídas conforme o número de votos recebidos pela legenda ou coligação. Levando em conta esse resultado, o partido tem direito a um número de eleitos, mesmo que alguns tenham menos votos que outros candidatos. No caso dos vereadores, basta que o candidato tenha algum voto para se tornar automaticamente um possível suplente. No caso de Sirlei, o improvável ocorreu, depois que um racha no PPS fez com que todo um grupo fosse para o PSDB. No País, há uma aberração ainda maior: a dos suplentes de senador, que não têm sequer um voto.