O presidente George W. Bush conseguiu a proeza de desagradar o mundo todo ao mesmo tempo com as restrições à importação de aço pelos Estados Unidos. As novas tarifas adotadas, entre 8% e 30% para dez categorias distintas de aço, entram em vigor no próximo dia 20 e vigoram por três anos. Com a rapidez daqueles mísseis que ele usa para exterminar inimigos, Bush arrancou um coro multinacional de reações raivosas e, segundo escreveu no The New York Times um dos mais célebres economistas americanos, Paul Krugman, “mostrou sua verdadeira face”. União Européia, Japão, Coréia do Sul, Taiwan, Nova Zelândia, entre outros, se unem na gritaria geral contra um dos maiores escorregões diplomáticos de Bush e evocam o acordo da Organização Mundial de Comércio (OMC) sobre medidas de proteção – entre elas, o artigo 8º deste acordo, que estipula a possibilidade de o país discriminado pedir compensação pelo mesmo montante das exportações afetadas.

Bush não quis se desgatar politicamente com seu eleitorado, especialmente aqueles do Meio-Oeste americano, que lhe deram a vitória. Em troca, deu uma demonstração explícita de que seu discurso recorrente pelo livre comércio vale, desde que não atrapalhe a indústria americana – no caso, a ineficiente indústria do aço. “Agora, todos já temos certeza daquilo que alguns suspeitavam: a administração Bush é só retórica quando fala de livre comércio e, provavelmente, do mercado livre em geral”, escreveu Krugman.

Bush também foi impiedosamente criticado durante a reunião anual do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), em Fortaleza. A começar pelo presidente Fernando Henrique Cardoso: “São muito preocupantes os sinais que os Estados Unidos vêm dando. Quando se quer o livre comércio, se reduz o protecionismo.” O senador e pré-candidato a presidente pelo PSDB, José Serra, igualmente bateu na decisão de Bush e pediu retaliação às medidas. “O Brasil vai decidir, por exemplo, qual sistema de televisor digital será implantado. O modelo americano deve ser vetado”, afirmou o presidenciável. O embaixador brasileiro nos EUA, Rubens Barbosa, não fez cerimônia: “O Brasil vai pagar o pato.”

Vai mesmo. A Companhia Siderúrgica Tubarão (CDT), que no ano passado exportou 48% de sua produção de aço semi-acabado para os Estados Unidos, deve ser uma das primeiras vítimas, assim como os planos de expansão da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN). Usiminas e Cosipa também não vão escapar. As restrições americanas, segundo autoridades brasileiras, provocarão uma perda anual de arrecadação de cerca de US$ 100 milhões.

Na visita ao Brasil, encerrada quarta-feira 13, o representante comercial americano Robert Zoellick não economizou arrogância: “As restrições são uma ameaça para quem está se defendendo e uma oportunidade para quem quer lucrar.” O calor de mais de 30 graus deve ter afetado a memória de Zoellick. Semanas atrás – contou Krugman em seu artigo –, ele dizia que “as tarifas não são nada mais do que impostos que atingem a população de renda baixa e moderada”.

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