O prefeito do Rio de Janeiro defende o dirigente da Fifa que criticou os preparativos para a Copa e garante que não vai ter atraso nas obras para a Olimpíada de 2016

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PAES:
“Se é ruim com o Valcke, será pior sem ele”

Nos próximos cinco anos, poucos cargos da República terão tanta visibilidade quanto o de prefeito do Rio de Janeiro, cidade-sede dos Jogos Olímpicos de 2016. Por isso mesmo, o atual dono da cadeira, Eduardo Paes, favorito para se reeleger no pleito que será disputado em outubro, tem se esforçado para demonstrar que, ao contrário do que acontece na organização da Copa do Mundo, tudo vai bem na promoção da Olimpíada carioca. Nesta entrevista, Paes defende Jérôme Valcke, o desbocado dirigente da Fifa que disse que o Brasil precisa de um “chute no traseiro” para acelerar os preparativos para a Copa (“Valcke é o sujeito mais equilibrado da Fifa”, diz Paes) e assegura que a Olimpíada de 2016 vai provocar uma grande transformação na cidade. “Vamos construir um Rio muito melhor.”

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"Dentro da Fifa, o Valcke é o sujeito mais sereno que
conheço. O Brasil precisa aceitar as desculpas dele"

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"A cidade de Barcelona, maior exemplo a ser seguido, se serviu
dos Jogos de 1992. O Rio quer fazer o mesmo em 2016"

ISTOÉ

Na semana passada, o Senado cancelou audiência com Jérôme Valcke, aquele dirigente da Fifa que disse que o Brasil merecia um “chute no traseiro” para acelerar os preparativos para a Copa. Na organização da Olimpíada, o sr. tem algum Valcke na sua vida?
 

Eduardo Paes

Não tenho. Ele só passou por um momento de infelicidade. Dentro da Fifa, o Valcke é o sujeito mais técnico, mais equilibrado, mais gentil e mais sereno que conheço. O Brasil precisa aceitar as desculpas dele. Ele organizou várias Copas do Mundo, fez todas muito bem. Vamos tocar a vida. Acredite se quiser: se é ruim com o Valcke, será pior sem ele.  

ISTOÉ

O sr. foi chamado para discutir a Copa do Mundo?
 

Eduardo Paes

Sim, em diversas ocasiões. O comitê organizador local, o centro de mídia, a sede da Fifa, a final da Copa, muita coisa vai ficar no Rio. Isso tudo faz com que eu esteja permanentemente discutindo. Por isso conheço bem o Valcke. A Copa está precisando de um choque de inspiração. Está na hora de a gente só pensar em somar. É o momento de integrar, de trabalhar junto, de ter menos conflito. Se não for assim, vamos enfrentar muitas dificuldades.
 

ISTOÉ

Como tem sido a interlocução com o Comitê Olímpico Internacional? Mais fácil do que com os representantes da Fifa?
 

Eduardo Paes

Muito fácil. O COI é absolutamente profissional. Você raramente encontra o presidente da entidade. O que existe é uma comissão de acompanhamento técnico que vem ao Rio a cada três meses para fiscalizar; e uma outra, de alto nível, que vem uma vez por ano. Claro, muitas vezes o debate é duro, as brigas são boas. O importante é que nenhuma decisão é tomada sem que o Rio ouça o COI e sem que o COI ouça o Rio. Quando há algum tipo de desentendimento, o que é normal nessas situações, ele termina dentro da sala. A gente sai de lá com a situação resolvida.
 

ISTOÉ

O Carlos Arthur Nuzman, presidente do Comitê Olímpico Brasileiro, está há muitos anos no poder. O sr. acha que essa longevidade é positiva para o Brasil?
 

Eduardo Paes

A governança do esporte brasileiro precisa ser cada vez mais aberta e democrática. Mas o que posso dizer do Nuzman é que ele é um sujeito muito competente, um superprofissional. Não podemos esquecer que o Nuzman tem méritos enormes, inclusive o de ter liderado todos nós na conquista da Olimpíada para o Rio. Se não fosse o Nuzman, os Jogos de 2016 não seriam no Rio de Janeiro.
 

ISTOÉ

Para trazer a Olimpíada para o Rio, o papel do Nuzman foi mais importante que o do ex-presidente Lula?
 

Eduardo Paes

O nosso pastor, aquele que conduziu a todos, foi o Nuzman. Mas é óbvio que ter os três níveis de governo entrosados, pedindo voto, foi importante. A força internacional que o Lula tinha naquele momento foi fundamental. Nos três dias antes da votação, eu, o Lula e o governador Sérgio Cabral ficamos trancados dentro de um quarto de hotel recebendo eleitores. Vi príncipes árabes e a monarquia europeia deslumbrados com o presidente.
 

ISTOÉ

Com a presidenta Dilma, mudou alguma coisa na interlocução entre o governo federal e a prefeitura nas discussões sobre a Olimpíada? 

Eduardo Paes

A Dilma já tinha participado muito da conquista da Olimpíada. Na visita que o comitê de avaliação fez para levar aos eleitores do COI as impressões iniciais do Rio, a Dilma era ministra da Casa Civil. Ela teve um papel fundamental, oferecendo todas as garantias necessárias.
 

ISTOÉ

O sr. bate muito na tecla do legado, mas nem sempre ele é positivo na história da Olimpíada. Depois dos Jogos de Atenas, em 2004, a cidade não melhorou. Há quem diga que o legado foi negativo, com dívidas impagáveis.
 

Eduardo Paes

Isso depende principalmente do objetivo da Olimpíada. Vou citar um mandamento fantástico do prefeito de Barcelona em 1992, Pasqual Maragall. Ele me disse que existem dois tipos de Jogos Olímpicos: os que se servem das cidades e as cidades que se servem dos Jogos. Barcelona se serviu dos Jogos e o Rio quer fazer o mesmo. Tudo que a prefeitura aprova ou deixa de aprovar leva em consideração o legado para a cidade ao final da Olimpíada. O Maragall tem me ajudado muito, tem sido um interlocutor constante. Barcelona mudou sua infraestrutura, sua imagem, sua cultura. Quero ser o Pasqual Maragall do Rio.
 

ISTOÉ

Antes da Olimpíada, Barcelona era uma cidade dividida entre ricos e pobres, algo parecido com o que acontece hoje em dia no Rio.
 

Eduardo Paes

Sim, Barcelona era uma cidade dividida, mas, impulsionada pelos Jogos Olímpicos, ela enriqueceu e essa separação acabou. No caso do Rio, quero construir uma cidade menos partida. Nossas obras de infraestrutura vão causar maior impacto nas regiões que mais precisam de mudanças. Se você for olhar, vai descobrir que a prefeitura não tem obra relevante na zona sul da cidade. Para a Olimpíada, todas elas estão nas áreas pobres da cidade.
 

ISTOÉ

Em Barcelona, os Jogos mudaram até a relação da população com a cidade.  

Eduardo Paes

Espero que os Jogos do Rio provoquem uma mudança cultural também. O carioca é apaixonado pela sua cidade, mas ele a trata muito mal. As pessoas jogam lixo nas ruas, não existe cuidado com o equipamento público. A Olimpíada precisa ser usada para se fazer algo que, sem ela, seria impossível. Hoje, para acelerar os processos, eu digo que tudo é para a Olimpíada. Se precisar resolver um problema qualquer, de bueiro, por exemplo, eu digo que é para os Jogos de 2016. Assim as coisas andam mais rápido.  

ISTOÉ

O sr. fala muito de Barcelona e nem sequer cita Londres, sede da Olimpíada de 2012. Por quê? 

Eduardo Paes

Londres é uma cidade diferente do Rio, está vários estágios acima de nós. Mesmo assim, tem uma experiência interessante para apresentar: a única área degradada da cidade foi recuperada para a Olimpíada. Esse é o ponto: recuperar o que está degradado, transformar o que está ruim.  

ISTOÉ

Londres se orgulha de ter entregue quase todas as obras com antecedência e de oferecer os equipamentos olímpicos mais avançados da história. O sr. não acha que é um bom exemplo a ser seguido?
 

Eduardo Paes

Todas as obras do Rio serão entregues no prazo e certamente muitas com antecedência. Quanto aos equipamentos, o prefeito do Rio não tem que perder um minuto de seu tempo pensando se a pista dos 100 metros livre será feita com determinado piso. O papel do prefeito, faço questão de reforçar, é a questão do legado: catalisar todos os investimentos e fazer com que provoquem transformações duradouras na cidade.
 

ISTOÉ

Neste momento, qual é o tamanho da conta da Olimpíada?
 

Eduardo Paes

Não dá para saber. Só falo dos projetos executivos que já estão fechados. É um risco falar em conta agora. Muitos projetos ainda não têm orçamentos prontos.
 

ISTOÉ

Já que não existe essa conta, não há risco de faltar dinheiro?
 
Eduardo Paes

Risco zero. As grandes equações estão fechadas. A urbanização do Parque Olímpico e mais alguns equipamentos vão custar R$ 1 bilhão. A urbanização da Vila de Atletas, R$ 150 milhões. Nesses dois casos, já licitei e o orçamento foi fechado. Nos outros casos, não vou chutar.
 

ISTOÉ

A falta de segurança afeta a imagem da cidade. Essa questão pode atrapalhar os Jogos do Rio?
 

Eduardo Paes

Nunca tive essa preocupação, mesmo porque a segurança no Rio melhorou muito. Comprovadamente, o Rio realiza grandes eventos com muita segurança.  

ISTOÉ

O que já mudou no Rio desde que a cidade foi escolhida como sede dos Jogos Olímpicos?
 

Eduardo Paes

Esse processo está trazendo para a cidade uma coisa que está no DNA do COI: o planejamento. Temos uma data, um prazo para tudo ficar pronto. Isso faz toda a diferença. Muda a cultura da administração, o espírito das pessoas. O Rio assumiu compromissos com a infraestrutura da cidade. Tudo aquilo que é grande para a Olimpíada do Rio, como rede de transporte, revitalização da zona portuária, Parque Olímpico, tudo isso já está em obras.
 

ISTOÉ

A área de transporte é a mais carente da cidade e, por enquanto, não se veem grandes transformações.
 

Eduardo Paes

Já começamos a construir diversos corredores de BRT (Bus Rapid Transit, os corredores expressos de ônibus). O primeiro será entregue em maio. Isso é uma transformação. Hoje, 18% da população usa o sistema de transporte de alta capacidade do Rio. Em 2015, esse índice vai subir para 63%.
 

ISTOÉ

A área de transporte é a mais carente da cidade e, por enquanto, não se veem grandes transformações.
 

Eduardo Paes

Já começamos a construir diversos corredores de BRT (Bus Rapid Transit, os corredores expressos de ônibus). O primeiro será entregue em maio. Isso é uma transformação. Hoje, 18% da população usa o sistema de transporte de alta capacidade do Rio. Em 2015, esse índice vai subir para 63%.
 

ISTOÉ

O campeão olímpico Torben Grael disse que está preocupado com as provas do iatismo. Ele teme a poluição da Baía de Guanabara.
 

Eduardo Paes

Temos muito investimento em saneamento. Há um trabalho forte de despoluição da Baía, ela está numa situação muito melhor. O que preocupa mais é a infraestrutura da Marina, em razão principalmente das limitações para edificar.  

ISTOÉ

Em 2016, o sr. se imagina em que cadeira do Executivo?
 

Eduardo Paes

Quero ser prefeito. Afinal, o prefeito é o grande anfitrião da festa.