Prestes a investir US$ 3,7 bilhões na construção da usina Angra 3, o governo brasileiro foi surpreendido por um contratempo que certamente servirá de munição aos críticos da retomada do programa nuclear. Divulgado apenas na terça-feira 26, 11 dias após ter ocorrido, um acidente radioativo em Angra 2 resultou na contaminação de quatro funcionários e expôs o despreparo de quem lida com elementos altamente perigosos. Um deles, encarregado de lixar uma peça na saleta de descontaminação, deixou de tomar providências básicas, como ligar o sistema de refrigeração e fechar a porta. Assim, permitiu que poeira contaminada escapasse e atingisse cinco outros trabalhadores que estavam no nível 1 do Edifício Auxiliar de Angra 2. Três tiveram que ir para o Centro de Radiações Ionizantes, setor destinado à limpeza, antes de serem liberados.

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SEGREDO NA USINA Caso veio à tona somente 11 dias depois de ocorrido

"Fiquei sabendo por terceiros da gravidade do fato", disse à ISTOÉ o prefeito de Angra dos Reis, Tuca Jordão (PMDB). Autoridades, especialistas e ativistas pedem maior transparência da Eletronuclear, a empresa responsável pelo empreendimento.

"Não foi um acidente grave", confirma o físico Luiz Pinguelli Rosa, diretor da Coppe (Programa de Pós-Graduação em Engenharia da UFRJ). "O problema maior foi a demora na divulgação e a forma sumária como foi descrito." Ao prefeito de Angra, o curtíssimo comunicado da Eletronuclear informava sobre um Evento Não Usual (ENU) em Angra 2, "em função de alarme no detector de radiações da chaminé". Não havia nenhuma menção à contaminação de pessoas. "Só soube disso depois, por outras fontes", diz Jordão. O mais extraordinário é a forma mambembe como a informação completa veio à tona: "Um ator que tem casa aqui (em Angra) soube que um dos vizinhos tinha sido contaminado e nos avisou", conta Maria José Castro, coordenadora da ONG Sociedade Angrense de Proteção Ecológica, sem revelar o nome do informante. Imediatamente, a entidade comprovou a gravidade.

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O Greenpeace também criticou a conduta adotada para notificar o acidente. "Tudo o que é ligado à energia nuclear parece permanecer envolto em segredo", disse Marcelo Furtado, um dos diretores da ONG internacional. Por fim, o episódio pode atrapalhar o cronograma de Angra 3. A Prefeitura de Angra ainda precisa dar a licença para o início da construção da usina 3 e o prefeito Tuca Jordão avisa que não deve abrir mão de uma alta contrapartida ambiental. "Peço algo em torno de R$ 340 milhões e eles oferecem R$ 60 milhões em seis anos", diz. O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) já deu a licença de instalação, mas listou 44 exigências ligadas à segurança e outros cuidados. Se a Eletronuclear superar todos os obstáculos, Angra 3 entrará em operação em 2014. De preferência, com funcionários bem treinados.