Acho curioso o argumento pelo qual a mulher ganha menos que o homem na mesma função porque trabalha menos ao longo da vida. Afinal, ela procria. Passa meses em casa cuidando da cria. A tese é, em geral, defendida por homens.

E a lógica masculina costuma ser uma via de mão única. Ora, partindo desse raciocínio, bastaria que a mulher cedesse os direitos sobre seu útero ao empregador! Aposto que algum executivo já pensou nisso – e achou uma boa ideia –, apenas não teve coragem de implementá-la. Sabe como é, dizem eles, essas feministas fazem um barulho danado…

Sei que temos, nós mulheres, alguma responsabilidade sobre esse estado de coisas. Defendemos ardorosamente a igualdade de gêneros por tempo demais. Graças ao bom-senso, essa época ficou para trás e até Camille Paglia já mudou de opinião. Somos, homens e mulheres, muito diferentes. E as corporações foram feitas por eles, para que eles trabalhassem nelas. Empresas são masculinas. A gestão empresarial é masculina.

Talvez por isso seja mais fácil para os CEOs pensar em controlar os úteros infiltrados ali do que mudar métodos gerenciais. Ou simplesmente não fazer nada e elas que se conformem com salários mais baixos.

Outra iniciativa, até louvável, é a lei aprovada no Senado brasileiro que obrigaria empregadores a pagar salários iguais para homens e mulheres na mesma função. Pena que seja inócua. Em 1963, John Kennedy assinou o Equal Pay Act, proibindo as diferenças salariais entre gêneros nos Estados Unidos. Hoje, quase 50 anos depois, as mulheres americanas ganham em média 81 centavos para cada dólar recebido por um homem na mesma função. Além de injusto é ilegal. E ilegalidades costumam dar cadeia nas democracias desenvolvidas. Mas não tenho notícia de um dono de empresa que tenha ido parar atrás das grades por pagar menos às mulheres.

Do ponto de vista feminino a coisa toda é muito mais simples. Ganhamos menos que os homens por vários motivos, todos associados à cultura empresarial. Não tomamos uísque no happy hour da firma.

Não estamos no futebol das quartas-feiras à noite. Não participamos dos torneios de golfe dos fins de semana. Portanto, não fazemos networking, que é o saudável papinho que resolve tantos problemas além das reuniões. Não temos, na empresa, a ajuda de uma diretora
para acompanhamento de carreira. Não temos exemplo. Não fazemos autopromoção. Em geral achamos a prática cabotina. E temos sim uma infinidade de funções paralelas ao nosso trabalho na empresa. Inclusive a função de mãe.

Não nos comportamos como homens porque não somos homens. E não devemos ser, pelo bem da diversidade criativa. Empresas que por suas práticas gerenciais empurram mulheres ambiciosas à masculinização só colaboram para que nos tornemos umas chatas. Para alcançar postos de direção e bons salários somos condenadas a viver eternamente cansadas, representando um papel que não nos cabe e alimentando uma frustração permanente com nosso reflexo no espelho. Ou, se desistimos da carreira e vamos para casa cuidar da família, viramos umas párias sociais, as fracassadas, as mulherzinhas. Empresas, não briguem com nossos úteros. O melhor de nós está
na feminilidade. O melhor do mundo está nas diferenças. Tenham coragem de mudar. Para que as mulheres que trabalham aí não precisem fazer isso. 

Ana Paula Padrão é jornalista e apresentadora