Cada vez mais, a chantagem se transforma num dos principais instrumentos de ação política no Brasil. Às vésperas do Carnaval, foram os policiais militares que aterrorizaram a população de Salvador, com uma greve insana e irresponsável. Agora, são os caminhoneiros, em São Paulo, que quase deixam a chamada locomotiva do País sem combustível. Tanto lá como aqui, os governantes agiram com senso de responsabilidade.

O governador Jaques Wagner não cedeu à pressão dos chantagistas, e o prefeito Gilberto Kassab seguiu o exemplo. Assim, as greves foram desmoralizadas e derrotadas.

No caso de São Paulo, a lei que proíbe o tráfego de caminhões pesados nas Marginais em horários de pico foi aprovada há mais de um ano. Portanto, todas as transportadoras sabiam que o “Dia D” fatalmente chegaria. Tiveram tempo para se ajustar às mudanças, mas preferiram apostar na crença, arraigada no subconsciente nacional, de que, aqui, leis não pegam. Às vésperas da implantação, incentivaram uma greve de caminhoneiros que provocou o desabastecimento e fez com que alguns postos chegassem a cobrar mais de R$ 5 pela gasolina. Imaginavam que, assim, o prefeito voltaria atrás.

Kassab foi firme, e o sindicato dos caminhoneiros passou a alardear, em campanhas publicitárias, que a gasolina ficará mais cara na capital paulista porque terão que pagar adicional noturno a seus motoristas. Bom, mas e daí? Civilização tem preço. E várias metrópoles do mundo já adotaram políticas de transporte que São Paulo deveria ter incorporado há muitos anos. Os que hoje usam esse tipo de argumento são os mesmos que, no passado, diziam que o fim da escravidão inviabilizaria a economia brasileira. Ou que leis trabalhistas também afetam a competitividade nacional.

Se a recompensa dos paulistanos for uma cidade mais habitável, e também transitável, que se pague mais pela gasolina. São Paulo pode pagar.

No início de sua gestão, Kassab conseguiu ter o maior índice de aprovação de um prefeito na história da capital paulista quando enfrentou interesses poderosos e aprovou a Lei Cidade Limpa, tirando a poluição visual das ruas. Depois, sua popularidade despencou quando a população passou a enxergar um prefeito mais interessado na criação de um novo partido do que na administração da cidade. A retirada dos caminhões é uma chance rara de redenção porque São Paulo merece e deve ser civilizada. E não apenas com a saída dos caminhões, mas também com mais ciclovias. Sim, ao contrário do que muitos alardeiam, São Paulo também pode abrigar ciclistas com segurança, tornando-se uma cidade mais humana e menos selvagem. 

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