PAULO-LIMA-ABRE-1-IE.jpg

"O demônio é alto, louro, simpático, tem olhos azuis e fuma cigarros americanos." Assim falou Otto Lara Resende numa de suas inesquecíveis cartas ao amigo Fernando Sabino, compiladas no ótimo livro “O Rio é Muito Longe”. O sujeito alto, louro e bonito, à direita na foto, está longe de ser um diabo. Pode sim ter aprontado várias. Ele mesmo admite extravagâncias sexuais e libertinagens dignas do cramulhão, diriam os puritanos. Na lista de conquistas que ele admite mencionar estão ninguém menos que Rose di Primo, Vera Fischer aos 18 anos, Liza Minelli, Claudia Cardinale, Maria Callas, Monique Evans (com quem chegou a viver e ter um filho) e a atualmente internada Demi Moore. Mas isso, Otto já sabia muito bem, está longe de ser obra do demo. Fez alguns filmes de cinema, incluindo algumas pornochanchadas com Carlos Imperial e até uma superprodução de Neville de Almeida. Apesar de uma breve passagem pela TV Globo como assistente de produção aos 17 anos e das participações eventuais nos filmes e em bailes de debutantes, não consta que tenha tido um trabalho mais duradouro na vida, mas, se isso fosse diabrura, faltaria vaga no inferno para tantos amantes do ócio, criativo ou não.

Pode ter se valido de outra característica muito associada a pecados, a vaidade, mas, de novo, nada há do “coisa-ruim” nisso. Sua genética privilegiada lhe valeu o título de homem mais bonito do Brasil, numa eleição televisiva no extinto “Programa Flavio Cavalcanti”. Daí vieram convites sem fim, inclusive um dos que mais marcaram sua história e sua imagem pública. Pedrinho Aguinaga, o belo da foto, estrelou um comercial, que marcou os anos 70, para os cigarros Chanceller (https://goo.gl/hoOZr). “O Fino que Satisfaz” era o slogan que tratava de associar sua silhueta esguia e sua origem refinada com o bastonete nicotinoso com pretensões de diplomata.

O slogan pegou e muita gente boa se pôs a puxar a fumaça venenosa imaginando que, num passe de mágica, ficaria magro, louro, bonito e bem na foto, passando, como se diz hoje por aí, a “enfileirar” mulheres lindas e sensuais.

O cigarro não era americano, mas talvez estivesse nele uma definição mais precisa para o tal demônio descrito por Otto Lara. O próprio Pedrinho, hoje com 61 anos, vivendo num apartamento escuro herdado de sua avó em Copacabana, diz que, se tivesse consciência do que se tratava, não teria feito o comercial. De tanto tragar o fino para as filmagens, teve que ser hospitalizado. Nem assim parou de fumar e hoje, já com netos, faz planos para parar de modo a escapar das estatísticas que apontam mais de seis milhões de mortes por causas diretamente ligadas ao fumo anualmente no mundo.

“Parar é fácil… já parei centenas de vezes”, brincou Pedrinho, parafraseando Mark Twain, na interessante entrevista dada ao jornalista Millos Kaiser, que sairá na “Trip” de fevereiro, uma edição da revista inteiramente dedicada à reflexão sobre a força diabólica da indústria tabagista.

Assine nossa newsletter:

Inscreva-se nas nossas newsletters e receba as principais notícias do dia em seu e-mail

Em tempo, Pedrinho Aguinaga é o homem mais alto na foto, com o verdadeiro cigarrinho do diabo entre os dedos. O outro, é uma figura quase tão famosa quanto ele naquele início da hoje distante década de 70 e que atendia pelas iniciais J K, posando ao lado de sua esposa, dona Sarah, e da filha Marcia, visivelmente encantada e sorridente (provavelmente pela chance de estar ao lado do “homem mais bonito do Brasil”).

Mas isso é assunto para outra coluna.

A coluna de Paulo Lima, fundador da editora Trip, é publicada quinzenalmente


Siga a IstoÉ no Google News e receba alertas sobre as principais notícias