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À primeira vista, as notas parecem saídas de um jogo, um dinheiro de mentira, de pouco ou nenhum valor. Apesar dessa aparência, algumas cédulas criadas para circular em pequenas localidades, as chamadas moedas sociais ou locais, estão sendo levadas muito a sério. Na Inglaterra, o bairro londrino de Brixton adotou no mês passado uma que leva seu nome. É a quarta iniciativa do tipo no país, que conta ainda com os totnes, os lewes e os stroud pounds. Essas moedas têm o mesmo valor do dinheiro vigente, mas, por conta de descontos oferecidos por comerciantes locais, dão a chance de o consumidor ir para casa com a sacola de compras mais cheia. No Brasil, há 47 cédulas paralelas circulando no território nacional. Castanhas, maracanãs, feiticeiros, cocais, bens e outras de nomes criativos convivem com o real em nove Estados. E recebem apoio do governo federal e de órgãos oficiais.

No Conjunto Palmeiras, bairro pobre de Fortaleza, no Ceará, nasceu há dez anos a palma, a primeira moeda social de que se tem notícia no País. O Instituto Palmas conta hoje com um banco comunitário, que tem parceria com o Banco do Brasil, mas começou com R$ 2 mil de doações. Hoje, 93% dos moradores compram produtos do bairro. Essa é a principal preocupação dos defensores da moeda local: fazer com que o dinheiro da comunidade circule o maior tempo possível dentro dela e não caia nas mãos de grandes redes comerciais. "Não queremos ser uma ilha, mas lutamos para empregar a todos", afirma Joaquim Melo, líder comunitário e coordenador do banco Palmas.

Como em outras experiências brasileiras, os salários e os empréstimos bancários na região podem ser concedidos parte em real, parte em palmas. Para a costureira e hoje empresária Darcília Lima e Silva, 55 anos, o crédito foi fundamental para a criação da grife de jeans Palma Fashion. "Não passamos mais dificuldade em casa", diz ela, que tem 15 funcionários da comunidade, entre eles seus três filhos.

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"Quanto menor a escala, mais chances de dar certo", explica o professor da Fundação Getulio Vargas do Rio de Janeiro Francisco Barone. Assim, é mais fácil distribuir a riqueza e coibir a falsificação das notas. "A moeda social não compete com a oficial, porque não há nenhum objetivo de expansão", ressalta Haroldo Mendonça, coordenador-geral de comércio justo e crédito do Ministério do Trabalho e Emprego. A circulação de outra moeda é um fato pitoresco, mas vem sempre acompanhada da implantação de políticas de economia solidária, como a criação de bancos comunitários ou clubes de troca, para sustentar o modelo.

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Economistas internacionais criticaram o marketing em torno do projeto inglês, que fez campanha e ganhou repercussão mundial, apesar de pertencer a um país avançado nas questões de bem-estar social. Para Mendonça, a ação comunitária é uma ferramenta poderosa em qualquer sociedade. "A iniciativa cabe num bairro rico, em países desenvolvidos ou em Bangladesh, que já ganhou um Nobel com economia solidária", defende. Pelo histórico de sucesso, a iniciativa não parece ser apenas para inglês ver.


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