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ADOLESCENTES
Participam do programa 44 meninas, com idades entre 12 e
18 anos: o tráfico de drogas é a principal causa de internação

De short azul e camiseta branca, a adolescente Vanessa encaixa peças que vão formando casas, árvores, bonecos, animais. Juntar as partes de um Lego, o popular jogo infantil, parece uma brincadeira, mas é uma tarefa escolar. Na escola, ou fora dela, Vanessa (nome fictício), 16 anos, constrói pequenos cenários para filmes educativos desenvolvidos com ajuda da professora Sandra Caldas, do Departamento Geral de Ações Socioeducativas do Rio de Janeiro (Degase). Trata-se de uma instituição que cuida de “adolescentes com problemas com a lei”, a terminologia que substitui a antiga “menores infratores”, carregada de preconceito. Vanessa e outras 44 meninas, com idades entre 12 e 18 anos, participa do projeto Educação Além dos Muros, que ganhou o primeiro lugar do Prêmio Microsoft Educadores Inovadores 2011, na categoria Contextos Desafiadores. Foi a melhor colocação de um projeto brasileiro em todas as edições da premiação.

Além da condecoração de prestígio (leia quadro), o projeto tem méritos reconhecidos, e copiados, aqui. As alunas do Degase já estão apresentando seus vídeos em outras instituições particulares do Rio, como o Colégio de Aplicação Emmanuel Leantsinis (Cael). A ideia a ser disseminada é muito simples: usar um brinquedo como o Lego para otimizar o aprendizado e estimular a criatividade e o trabalho em equipe. As garotas também têm contato com animação e edição de filme. “Primeiro, eram as assistentes sociais que incentivavam as meninas a vir para cá. Agora, uma vai contando para outra e a sala está sempre cheia”, conta a professora Sandra, há 11 anos no sistema socioeducativo.

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VÍDEO EDUCATIVO
Alunos do Colégio de Aplicação Emmanuel Leantsinis, no Rio,
estão aprendendo com os jovens infratores a fazer animações

Quando experimentou a sensação de migrar da posição de aprendiz para a de quem ensina, Vanessa disse que ficou “com vergonha”, mas muito feliz por passar informações e emoção aos alunos do Cael. “Fomos conversando e elas aprenderam como as pecinhas podiam ser animadas em vídeos”, contou, orgulhosa. Aluna do Cael, Mayara Souza de Oliveira, 17 anos, se disse particularmente tocada com o encontro, que acabou decidindo seu futuro: vai estudar biologia e prestará concurso para ser professora, mas não de uma escola qualquer e, sim, da unidade socioeducativa. “Minha mãe está muito orgulhosa”, disse. A mãe de Vanessa, uma engenheira civil, também deve estar. Internada há 16 meses, a menina agora planeja trabalhar com gestão médica. Vanessa, cujo pai é motorista, ainda não sabe quando vai sair e não gosta de falar sobre o delito que a levou à instituição. Atualmente, está cumprindo medida socioeducativa. “Andei com más companhias. Mas deixei tudo isso para trás”, limitou-se a dizer a menina, que só quer, agora, olhar para a frente.

A maioria dos crimes que levam os adolescentes à internação é o envolvimento com o tráfico de drogas. O projeto é um dos responsáveis pela diminuição na reincidência das internações nos últimos dois anos. De acordo com dados do órgão, quase 90% dos adolescentes que passaram pela instituição deram um rumo diferente, e melhor, em suas vidas após a intervenção. Gisele (nome fictício), 14 anos, internada há pouco mais de duas semanas, conta os dias para voltar para casa, mas sabe que não será mais a mesma. Durante seu tempo na oficina, ela criou o projeto O Que Vou Ser Quando Crescer, cujo cenário é uma fazenda, pois deseja se tornar veterinária. “Desde pequena, tenho essa vontade. Não sei como, mas eu vou ser”, afirmou, confiante. A mãe, que a visita semanalmente, já está procurando cursos semelhantes para que ela possa dar continuidade às atividades aprendidas. 

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