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AMEAÇA
Butaneses observam a geleira Gankar Punsun, no Himalaia

Há algum tempo o Butão é conhecido como o país mais feliz do mundo. Para se ter uma ideia da importância do sentimento para os seus habitantes, o governo local criou um índice oficial batizado de Felicidade Interna Bruta, medido anualmente como os PIBs de outras nações. As mudanças climáticas, porém, estão acabando com a alegria desse pequeno pedaço de terra encravado entre a Índia e a China, bem aos pés da cadeia de montanhas do Himalaia. A elevação das temperaturas está derretendo as geleiras de forma acelerada e instável, ameaçando comprometer a segurança e o abastecimento de água dos butaneses.

Quando a enorme quantidade de gelo do Himalaia derrete além do normal, a água corre com força até romper as barreiras naturais congeladas, que seguram tudo no lugar. O resultado desse choque foi visto em 1994, quando uma torrente de lama vinda das montanhas destruiu vilas inteiras, matou 22 pessoas e afetou pelo menos outras 600. Esse fenômeno é chamado de enchentes-relâmpago de origem glacial (Glof, na sigla em inglês). Atualmente, 24 das mais de 2 mil geleiras do país são consideradas instáveis, tornando concretas as chances de ocorrência desses “tsunamis das montanhas” nos próximos anos.

Mas os butaneses não esperam pela tragédia de braços cruzados. O país é um dos primeiros a fazer da prevenção aos GLOFs uma prioridade nacional. Em 2005, o governo recebeu recursos internacionais para investir na prevenção a novas tragédias como a de 1994. Parte do dinheiro foi usada para reforçar as barreiras naturais do lago glacial Thorthormi. O problema é que o trabalho é difícil, perigoso e de alto custo quando realizado em altitudes que ultrapassam os 5 mil metros.

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RISCO
O templo de Punakha Dzong corre risco constante de alagamento

O ar rarefeito não dá sustentação para helicópteros, impedindo o uso das aeronaves. O esforço maior vem de cerca de 350 voluntários, que caminham até dez dias para chegar a um acampamento-base, cinco quilômetros acima do nível do mar. Estudantes, soldados aposentados e camponeses uniformizados trabalham com água gelada pelos joelhos, usando as poucas ferramentas disponíveis para abrir canais e construir barreiras a fim de reforçar o lago Thorthormi. Todo ano, porém, os esforços são interrompidos com a chegada do inverno.
As geleiras mais perigosas são identificadas com a ajuda de imagens de satélite, mas é impossível dizer quando ou onde uma catástrofe vai acontecer. “Esse recurso nos dá o tamanho da área coberta de gelo e outros tipos de cobertura. Para informações mais detalhadas como volume, dados geotécnicos e hidrológicos, é preciso fazer a coleta em campo, indo diretamente aos locais”, disse à ISTOÉ Pradeep Mool, especialista do International Centre for Integrated Mountain Development, no Nepal.

Autoridades já identificaram algumas zonas de alto risco e proibiram construções nessas áreas. Elas planejam instalar um sistema eletrônico de alerta, com sensores e mensagens enviadas para celulares, para que os moradores possam fugir a tempo e buscar abrigo. O problema, no entanto, vai além. Como só existem graças à água de degelo, os rios podem ser afetados, comprometendo o abastecimento de água e o funcionamento de hidrelétricas, vitais para a economia do país (leia quadro). Mais do que derreter o gelo das montanhas, o aquecimento pode alterar profundamente a essência do, até agora feliz, Butão.

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