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A repórter Ariane Abdallah já é uma especialista em diversidade. Da esposa do vice-presidente da República a uma candidata a estrela pop, sua maneira doce e desarmada de se aproximar de fontes e personagens faz com que elas se sintam confortáveis e seguras para revelar o que de fato sentem e, muitas vezes, até abrir segredos bem guardados sobre suas histórias e trajetórias. Ariane seguiu para Belém três semanas atrás, para entender o fenômeno Gaby Amarantos. Descobriu uma mulher divertida e segura, cercada de talento por todos os lados. Veja aqui parte do seu relato, que sairá dentro de alguns dias na revista “TPM”:

“Em um mesmo dia, Gaby Amarantos vai da periferia de Belém, onde nasceu, a um dos restaurantes mais sofisticados da cidade. E sem mudar o figurino: vestido tomara que caia rosa, óculos escuros Prada e bolsa com estampa da Mulher Maravilha. ‘Musa do tecnobrega’, atraiu ouvidos desacostumados ao sotaque paraense ao ser chamada de ‘Beyoncé brasileira’, num dos principais festivais do Recife, o Rec-Beat, ao improvisar uma versão em português de ‘Single Ladies’, da cantora americana, em 2010.

De lá para cá, Gaby fez show no Studio SP, dividiu o palco com a Orquestra Imperial e se apresentou no Video Music Brasil 2011, da MTV, exibindo seus 72 quilos e 1,65 m de altura em um maiô cheio de neon, LED e alto-falantes na altura dos seios.

O mundo do meu quintal
Além disso, seu clipe da música ‘Xirley Xarque’, que conta a história de uma garota da periferia que vira popstar, é ‘um dos melhores de todos os tempos’, segundo o antropólogo e crítico de música Hermano Vianna. Em janeiro, ela lança seu primeiro disco solo, Treme, com música assinada pelas amigas Thalma de Freitas e Iara Rennó, participação de Fernanda Takai e elogios de especialistas como o jornalista Nelson Motta.

Filha de ribeirinhos e descendente de escravos e de portugueses, Gaby ralou muito antes de ter seu talento reconhecido. Quinze anos atrás, quando começou cantando na igreja do bairro, nem imaginava tal sucesso. Por causa das roupas curtas e do excesso de animação, teve que deixar o coro um ano depois. Passou a se apresentar em bares, até que, em 2002, fundou a banda TecnoShow e deu início aos shows nas aparelhagens.

Se você nunca ouviu falar em aparelhagem, imagine um baile funk com algumas diferenças: em vez de ser no morro carioca, acontece na periferia de Belém. No lugar de proibidão, o som é tecnobrega: mistura da música popular que tem sua origem em cantores como Reginaldo Rossi e Roberto Carlos, com a batida de DJs com seus pickups, teclados e amplificadores. E não é só no Brasil que o nome dela começa a ser reconhecido. Sua versão para ‘Águas de Março’, lançada na Europa por meio do álbum ‘L.O.V.E. Banana’, do DJ João Brasil, rendeu a ela um perfil no portal americano The Huffington Post, em novembro. Ainda neste ano, ela cantou Clara Nunes para a câmera do cineasta francês Vincent Moon, que também registrou artistas como Ney Matogrosso e Tom Zé na etapa brasileira de seu concerto itinerante ‘Temporary’. Para esse trabalho, Gaby improvisou um palco em frente à sua casa, e o público era formado pelos vizinhos de periferia.

Mesmo hoje com a ascensão que vem experimentando (faz cerca de 12 shows mensais e cobra entre R$ 25 mil e R$ 50 mil), diz não ter planos de sair da casa onde mora no Jurunas com a família.
Uma história real da menina da periferia que virou popstar – mas se recusa a tirar os pés do chão.” 

A coluna de Paulo Lima, fundador da editora Trip, é publicada quinzenalmente