É cristalina a ideia de que a economia move a política – e, por tabela, leva a reboque os políticos que a patrocinam. Ao longo da história vem sendo assim em várias partes do mundo. A economia do Plano Real deu dois mandatos ao presidente Fernando Henrique. A estabilidade econômica garantiu outros oito anos presidenciais a Lula. O déficit zero premiou o americano Bill Clinton com a reeleição nos EUA. E, agora, na Argentina de crescimento econômico padrão milagre, Cristina Kirchner arrancou uma vitória avassaladora nas urnas. Conseguiu quase quatro vezes mais votos que o seu adversário direto, o socialista Hermes Binner. Converteu-se na mais popular mandatária daquele país desde Perón. Vai mandar no Congresso Nacional com uma maioria folgada, superior, proporcionalmente, à bancada de Dilma Rousseff no Brasil. No limite do exagero, analistas passaram a falar em uma onda de “cristinismo”, movimento político que se alastraria com a mesma força do peronismo de outrora. Cristina Kirchner está de fato no auge. Apoia-se num colchão de reservas de quase US$ 50 bilhões – uma enormidade para a Argentina. Vem praticando superávits comerciais na casa dos bilhões. Adotou uma política de incremento da atividade industrial e de garantia do emprego com bons resultados. Sacramentou um novo modelo desenvolvimentista, com inflação e juros em baixa. E, para completar, investe pesado no social. Vai, pelo que propagandeiam seus assessores, de vento em popa.

Depois do calote da dívida externa, da anarquia social e da quase asfixia da produção, a era Kirchner vem colecionando feitos capazes de mitificar sua condutora. O problema é que muitos dos números da gestão Cristina são, para dizer o mínimo, de natureza duvidosa. Sujeitos a questionamentos de instituições respeitáveis que resistem em endossar os anúncios oficiais. Dizem que o buraco é mais embaixo. Traçam cenários de contas públicas se deteriorando. Apontam que a fuga de capitais já superou o nível de US$ 67 bilhões nos quatro anos do mandato passado. Põem um enorme ponto de interrogação sobre o testamento de Cristina e os desdobramentos futuros. Nada que abale o prestígio da escolhida. Pelo menos junto aos eleitores. A sensação de melhora dos indicadores parece ter cativado a imensa maioria, que revalidou seu passe. E a profecia econômica voltou a se cumprir.